Os amigos são aqueles membros da família que estão unidos a nós por um laço alternativo, embora indispensável à consanguinidade: o afectivo. Os teus amigos são o reflexo da tua antipatia, empatia e simpatia. Os teus amigos são um produto humano rentável e espectacular da tua afeição. A amizade, bem como outros estados interpessoais da vida, é útil se for verdadeira e se integrar em si qualidades que fortifiquem os laços para o benefício oportuno das partes.
Por Fernando Kawendimba
Psicólogo e escritor
A amizade vale a pena se for construtiva, se for positiva. Ela catapulta-nos para outros níveis de desenvolvimento intrapessoal, pois é também uma panelona de experiências que impulsiona a nossa aprendizagem. A amizade confunde-se com fraternidade à medida que une uma pessoa à outra através de pontes de caridade sem restrições a peso, idade e outros acidentes. Aliás, quanto mais bem construída for a caridade, mais bem conservada estará essa ponte que possibilita o diálogo, a confiança, o altruísmo, a cordialidade, a renúncia de si pelo outro em casos de necessidade para o efeito. A amizade impõe-se na vida de todos os potenciais inimigos.
Qualquer etapa de desenvolvimento que atravessas é propícia para o cultivo de relações com os teus pares, com pessoas que se identifiquem contigo, que partilhem contigo os mesmos interesses. Tu vais procurando decidir sobre quase tudo na tua vida: profissões, pessoas, artes, teorias, roupas, perfumes, flores… predilectos. Atendendo às tuas inclinações, aos teus gostos, vais-te identificando com determinadas coisas. Esse exercício não é tão simples quanto gostarias que fosse, pois medos, incertezas, dúvidas… reticências intrometem-se no teu acto de escolher. É nessas horas que tens de optar pelo certo, pelo edificante, pautar as tuas perspectivas pela excelência. A amizade é recomendável a todos, bem como a capacidade selectiva desta, tendo como critérios valores de ordem ideal. Aliás, normalmente és muito parecido com os amigos que atrais.
Os teus amigos são muitos ou poucos? Estão enumerados em grau de importância? Tens os melhores, os bons, os maus e os piores amigos? Tens inimigos? Muitas pessoas sentem-se bem por terem muitos amigos; outras preferem manter laços de amizade com um grupo mais restrito e minuciosamente escolhido. Gentileza produz gentileza, simpatia gera simpatia. É normal, uma vez que a simpatia é um dos fundamentais alicerces desse tipo de relação humana.
Frequentemente, acontece que alguém mais simpático, mais bem-humorado, mais bem aparentado, mais influente, com mais valor económico, atraia mais pessoas para o seu ciclo de interpessoalidade, candidatando-se a uma vaga no seu ciclo de “amizade”. Responde às questões acima, mas, acima de tudo, reflecte sobre elas. Infalivelmente, muitos amigos não são o sinónimo de qualidade. Tem amigos o suficiente para poderes manter uma relação afectiva contínua e estável. Tem amigos com os quais possas te relacionar com regularidade. Tem amigos ao nível das tuas capacidades de interacção e assistência emocional, privilegiadamente.
Sabes que nas redes sociais podes ter centenas de amigos, mas se calhar, manténs contacto frequente com poucas dezenas. Portanto, não te preocupes em ter tantos amigos, mas em ser bom amigo. A importância que os amigos têm na nossa vida é notável no bem que nos fazem ou pelo menos devem fazer-nos. A amizade surge seguindo diversos roteiros. O importante é que a amizade seja construída com utensílios de bem-querer.
Alguns amigos teus são-no e dás-te conta disso mal tenhas despertado para a vida. É o caso da amizade que se mantém entre ti e alguns membros da tua família biológica. Provavelmente, não te lembras do início dessa relação… a ocasião responsabilizou-se pela sua génese. Segundo o Dicionário Enciclopédico da Psicologia (2005, p.127), “as amizades de infância, se sobreviverem às crises da vida, se revelam de uma qualidade rara”. Sem desprimor para as outras, estas têm se revelado, grosso modo, mais ternas e eternas, pois pressupõem uma caminhada mais aturada, um conhecimento mútuo mais amplo, espontâneo e multifacetado, pois o amigo adolescente conhece o outro “há mais tempo que se espera ser bem vivenciado”. As amizades entre crianças, espera-se, estão alicerçadas sobre uma relativa inabilidade para a falsidade: a pureza, a transparência e a ingenuidade ainda são uma realidade frequente que corresponde a vantagens. Continua a ter o polo construtivo do perfil comportamental das relações amicais na infância como referência.
A criança é, por excelência, a reserva do humano. O modelo mais antigo, mais seguro e mais certo da essência humana. No caso de dúvidas sobre a saúde da sua amizade, observa as crianças e dissipa as inquietações com a naturalidade com que elas actuam. Lembras-te dos teus amigos de infância com quem te relacionavas anteriormente? Alguns se calhar, tomaram um rumo na vida que diverge com as tuas convicções actuais. Mas, aqueles que conservam a candura do vosso pacto afectivo, certamente, são recomendáveis para o teu desenvolvimento enquanto pessoa que ama e deseja ser amada. Em meio a essa realidade toda, compreende que as qualidades são aqui chamadas antes das quantidades; as qualidades determinam e condicionam as quantidades, em todos os aspectos de uma amizade. Inclusive no quesito tempo. Muito provavelmente, na adolescência, embora há menos tempo, terás cultivado relações de amizade mais nobres e verdadeiras que as de infância. Provavelmente terás poucos amigos, mas dão-te toda a felicidade que precisas. Boa.
Na amizade, dispensa as aparências. Não te deixes levar por isso. As qualidades a perseguir têm de ser as internas, as relativas à essência humana; os valores a considerar privilegiadamente são os de ordem ideal. Eventualmente tens ou terás amigos que pertencem a outras religiões ou igrejas, a mesmas ou diferentes faixas etárias, orientações sexuais, níveis académicos… isso é importante, mas não descures a pertinência de privilegiar valores de ordem ideal como as virtudes cardeais que são a prudência, a temperança, a fortaleza e a justiça ou como as virtudes teologais: fé, esperança e caridade. Provavelmente, será a voz humana agradável ao ouvido, uma opinião favorável à tua, um gesto de solidariedade aos mais desfavorecidos, uma peça de roupa, as mesmas preferências artísticas.
Sem mais nada a acrescentar… mas, por salientar, sê um protagonista de boas relações, na família e na amizade. Dá o máximo de ti para fazer o bem e evitar o mal. As regras de convivência são para serem observadas pois, em princípio, têm regulado as relações interpessoais. A paz no mundo depende também de ti. Então começa a tua missão nas coisas simples, nas pequenas coisas. Valoriza mais o Homem, substância de ti e das pessoas que te rodeiam. A toda a hora e momento mantém actualizada na tua consciência a necessidade de contribuíres com todas as tuas qualidades para a saúde das tuas relações interpessoais. Ser amigo é demonstrar que a humanidade pode ser feliz trocando amores uns com os outros.
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