O ESTADO DO REINO, SEGUNDO O… REI

Oradores de uma conferência pediram hoje ao Presidente angolano (não eleito, derrotado mas… vencedor), João Lourenço, para “clarear” a questão das autarquias, no seu discurso sobre o estado da Nação, considerando que as autárquicas vão reflectir o que os angolanos querem na gestão do país.

O Presidente do MPLA (a quem a CNE e o Tribunal Constitucional entregaram o Poder), João Lourenço, profere no sábado, 15 de Outubro, um discurso sobre o estado da Nação na abertura do primeiro ano parlamentar da V Legislatura da Assembleia Nacional de Angola (2022-2027).

Na antecâmara do discurso de João Lourenço, políticos, politólogos e jornalistas apontaram, durante uma conferência em Luanda, os temas que deverão nortear a mensagem de João Lourenço pedindo abordagem clara sobre as autarquias, que para um dos oradores é também “desejo do MPLA, no poder”.

“Acredito que, neste sábado, o Presidente possa trazer algum clarear sobre a questão das autarquias”, afirmou Faustino Mumbika, deputado da UNITA.

Mumbika, que foi um dos oradores da “Conferência sobre o Estado da Nação”, disse ser necessário que João Lourenço “fale com clareza” sobre a questão das eleições autárquicas, porque no seu discurso de investidura “deixou muitas zonas cinzentas” sobre o assunto.

Para o deputado do UNITA, João Lourenço, no seu discurso à nação, deverá também “trazer algumas promessas e reforçar outras que já fez” porque “o balanço tem sido pouco naquilo que é característica dos discursos anteriores”.

“Regra geral é mais promessas, é óbvio que muitas já as fizeram e poderá reiterar e uma ou outra poderá ser nova”, assinalou o político do partido dos “maninhos”.

Milonga Bernardo, deputado do MPLA (no poder desde 1975), disse acreditar que ao longo desta legislatura as “autarquias vão acontecer”, recordando que falta apenas aprovar um único diploma do pacote legislativo autárquico.

“E acredito eu que o maior desafio está agora na Assembleia Nacional, os deputados terão de aprovar este último pacote para depois então serem marcados os passos subsequentes para a realização das autarquias”, frisou o deputado do MPLA.

As eleições para as autarquias, sustentou Milonga Bernardo, “é um desejo de todos, aliás o MPLA deseja as autarquias, o Presidente da República deseja também as autarquias”. Ainda bem que este deputado esclareceu este aspecto, não fossem os angolanos julgar que o MPLA tinha coragem de desejar algo diferente do que deseja o seu presidente…

Além da componente das autárquicas, o deputado do MPLA acredita que a mensagem de João Lourenço estará muito voltada para as questões sociais, tal como foram as promessas da campanha eleitoral, sobretudo na temática da educação, saúde, electricidade e outros.

“Uma mensagem também sobre aqueles que serão os grandes desafios para este ano e dizer que é apenas o primeiro ano de uma legislatura de cinco anos”, salientou o político. Outra novidade. É que ninguém sabia que este é o primeiro ano de uma legislatura de cinco. Quem assim raciocina só podia mesmo ser do MPLA.

O jornalista Reginaldo Silva considerou que todos os cidadãos estão expectantes sobre as eleições autárquicas que, no seu entender, “vão dizer efectivamente o que os angolanos querem em termos de gestão do país”.

“Quem governa não tem feito grandes alterações na forma como olha o país, estamos neste momento mais preparados para pressionar e exigir mais a quem governa e nós temos de ser também mais cidadãos”, referiu o jornalista, aludindo ao suposto resultado das eleições de 24 de Agosto.

O também membro da ERCA – Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana espera ainda que João Lourenço altere um pouco a forma de fazer o discurso à nação e tenha em conta de facto a nação e não as realizações do Governo.

“A minha expectativa maior é que de facto, se vamos falar do estado da Nação, que o Presidente da República se preocupe efectivamente com o estado da Nação, do ponto de vista político, social, económico, cultural e mesmo afectivo, é que haja neste discurso mais nação e menos governo”, rematou Reginaldo Silva.

A “Conferência sobre o Estado da Nação” foi promovida pela organização Oficina do Conhecimento.

O Presidente dos angolano do MPLA dirige ao país, na abertura do ano parlamentar, na Assembleia Nacional, uma mensagem sobre o estado da Nação e as políticas preconizadas para a resolução dos principais assuntos, promoção do bem-estar dos angolanos e desenvolvimento do país, como estabelece o artigo 118 da Constituição angolana.

Este ano, o parlamento angolano terá pela primeira vez a oposição num lugar de destaque já que a UNITA conquistou quase o dobro dos mandatos nas eleições de 24 de Agosto e conseguiu eleger 90 deputados, num total de 220. Isto foi o máximo que a CNE e o Tribunal Constitucional tiveram do MPLA autorização para atribuir à UNITA.

Os restantes seis deputados distribuem-se entre o estreante Partido Humanista de Angola, o histórico nacionalista FNLA e o PRS. Estas organizações políticas elegeram dois deputados, cada uma, insuficiente para formar um grupo parlamentar.

(Ante)visão do discurso sobre o estado do reino

O Presidente da República, João Lourenço, tal como fariam com certeza os seus camaradas Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo, na sua mensagem sobre o estado do seu reino (ele chama-lhe Nação), muito aguardada pelos cidadãos neo-bajuladores e restante acólitos, abordará com certeza o muito que fez em cinco anos, reconhecendo com a humildade que (não) tem que há muito por fazer.

A diversificação da economia é, sem dúvida, uma das questões que não está, nunca esteve, de forma efectiva no centro das preocupações das autoridades, pelo que não será de admirar o facto de o assunto ser abordado pelo Presidente da República, que é, nos termos da Constituição, Titular do Poder Executivo (para além de Presidente do MPLA) com (in)competência para “dirigir a política geral de governação do país e da Administração Pública”.

A abertura do ano parlamentar suscita geralmente a atenção dos poucos cidadãos que ainda julgam que Angola é um Estado de Direito, porque ela é marcada pela mensagem do Presidente da República sobre o estado da vida nacional e sobre as políticas preconizadas para a promoção do bem-estar dos angolanos de primeira e para o desenvolvimento do país que, desde 1975, em vez de produzir riqueza produz… ricos.

Vivem os angolanos (que não os seus senhores) um período de crise económica e financeira, pelo que será inevitável que o Presidente da República dedique partes do seu discurso a uma questão que pode continuar a engordar os que gravitam na gamela do poder.

A diversificação da economia é uma questão que as autoridades do MPLA levam muito a sério, até porque ela é um meio para se tornarem ainda mais ricos. Estão, aliás, tarimbados neste tema porque o usam há 47 anos.

O Presidente dirá com certeza que “o objectivo a que o país aspira é o de pertencer até 2025 ao Grupo dos Países de Desenvolvimento Humano Elevado. Por essa razão, o combate à pobreza é, de facto, uma prioridade do Governo, e tem sido positivo o ritmo da sua redução. Mas é importante que haja um reforço e alargamento das medidas que, directa ou indirectamente, podem contribuir ainda para a sua maior redução”.

Segundo o que é previsível, o Governo adoptará um Programa de Formação e Redistribuição do Rendimento, a fim de criar condições que possibilitem uma maior inclusão social dos membros do MPLA. Pensará por isso utilizar de forma articulada e convergente os principais instrumentos de política de redistribuição do rendimento, tais como a Política Tributária e a Despesa Pública, em sectores sociais e segurança social, visando uma repartição mais justa da riqueza e do rendimento e um nível de bem-estar mais elevado… entre os seus.

A pobreza no nosso país é superável. A crise que atravessamos deve constituir para nós uma oportunidade para traçarmos os melhores caminhos que nos levem a rumar para um crescimento económico sustentável. Os angolanos podem resolver em poucos anos muitos dos seus problemas. O importante é que haja empenho efectivo para se ultrapassar os actuais problemas e para não se voltar a cometer os erros do passado.

O Presidente da República do MPLA apelará certamente aos seus angolanos para serem optimistas, perante as actuais dificuldades, afirmando na sua mensagem sobre o estado da sua Nação que “estamos habituados a lutar contra as adversidades e a ultrapassar obstáculos. Temos de continuar a confiar nas nossas forças e a trabalhar juntos para vencer a crise económica e financeira, no curto prazo”.

Recordando a anterior prima do mestre-de-obras

Em 2018, discursando sobre o estado da Nação, que marcou no dia 15 de Outubro a abertura solene dos trabalhos da segunda sessão legislativa da IV Legislatura da Assembleia Nacional, João Lourenço apelou ao investimento no sector agrícola, lembrando as vantagens para o desenvolvimento económico de Angola fora da esfera petrolífera.

No quadro do Programa de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018/2022, com grande parte dos financiamentos disponíveis, João Lourenço lembrou as oportunidades da exploração agrícola existentes no país, sobretudo nas zonas rurais, salientando que a aposta iria também ajudar no combate à pobreza e à criação de emprego, garantindo, paralelamente, melhor qualidade de vida às populações.

Foi bom ouvir o Presidente. Foi mesmo elucidativo e pedagógico. É que ninguém sabia que a agricultura ajuda no combate à pobreza, na criação de emprego e na melhoria da qualidade de vida das populações.

Nesse sentido, João Lourenço lembrou que estavam em curso programas integrados de desenvolvimento local, que, a par de reformas no plano social e educacional, trariam benefícios a médio e longo prazos para as populações mais desfavorecidas.

Na educação, o Presidente destacou os esforços do seu executivo na criação de condições para melhorar o ensino, quer através da aprovação do Estatuto da Carreira Docente, quer no estabelecimento das novas regras de procedimento para 20 mil novos professores, quer ainda na construção de novas escolas e na recuperação de outras, para melhorar o rácio professores/alunos e o nível de ensino.

Que maravilha. Quanto não vale ter um Titular do Poder Executivo que tem a capacidade de nos indicar o caminho do paraíso. Ou será que ele julga que somos todos matumbos? Não. Nem pensar. Ele estava mesmo a dizer-nos que o anterior “escolhido de Deus” abriu o caminho para que, agora, ele (por ter sido o escolhido) vai abrir a porta do paraíso.

As mesmas medidas estavam a ser tomadas, segundo João Lourenço, no sector da Saúde, em que o Governo aprovou o Regime Jurídico de Enfermagem e da Carreira Médica, estando aberto o concurso para a inserção de 7.000 novos funcionários médicos e de enfermagem, a par dos 33 projectos em 13 províncias que vão permitir construir ou renovar hospitais.

É claro que, sobretudo no campo da saúde mas também na agricultura, é preciso que os angolanos colaborem e perguntem não o que o Governo pode fazer por eles mas, isso sim, o que eles podem fazer pelo Governo. E o que o Povo pode fazer é, necessariamente, morrer sem ficar doente e viver sem comer. Simples.

Na área do ambiente, João Lourenço destacou as novas medidas de protecção da biodiversidade em Angola, nomeadamente as relacionadas com espécies em vias de extinção que, sendo símbolos nacionais, necessitam de ser revitalizadas, como a palanca negra gigante, o elefante, o hipopótamo e o rinoceronte.

Até dá gosto viver num país sob a liderança de alguém que se preocupa com as espécies em risco de extinção. Só por lapso o Presidente não incluiu nesta categoria uma outra espécie que também corre sérios riscos de extinção: os 20 milhões de angolanos pobres ou miseráveis.

Para João Lourenço, a questão da juventude estava também no “centro das preocupações” do Governo, pelo que apelou aos jovens para se concentrarem no estudo, no desporto e no trabalho, aproveitando as novas tecnologias da informação como ferramenta para assegurar o futuro.

Excelente repto aos jovens. Só um Povo culto consegue ser livre e ter capacidade para pensar pela própria cabeça, agir em vez de reagir, pôr o poder das ideias acima das ideias de Poder, pôr a força da razão acima da razão da força. Não seria bem isto que João Lourenço queria dizer, mas…

Na cultura, o Presidente de Angola lembrou estar em curso a revitalização do sector, nomeadamente no reforço da política do livro e da leitura, enquanto, na área da comunicação social, saudou o “maior dinamismo da imprensa, mais próxima das populações”, destacando a legislação que irá permitir a abertura de novos canais de rádio e de televisão no país.

Cá estamos para ver se o Titular do Poder Executivo, através dos seus membros, sempre nos vai dar lições do que é um “jornalismo mais sério, baseado no patriotismo, na ética e na deontológica profissional”, ou se se limitará – com outros protagonistas e roupagens diferentes – à tese de que patriotismo, ética e deontologia são sinónimos exclusivos de MPLA.

Menos assertivo, o Presidente considerou a possibilidade de implementar as autarquias em todo o país, num período de até 10 anos, se bem que a Lei sobre “Organização e Funcionamento das Autarquias Locais” prevê a implementação gradual das autarquias em 15 anos, privilegiando os municípios com maior desenvolvimento sócio-económico. Vamos então com calma, não é Presidente João Lourenço? Devagar, devagarinho, parados e entregues à vontade superior do que Deus, perdão, do que o MPLA quiser.

Segundo o Chefe de Estado, a primeira tendência aponta para a implementação gradual do processo, enquanto a segunda sugere as autarquias em simultâneo. Sobre a segunda, o Presidente disse (e todos sabemos o significa de “disse” no contexto de quem manda no país) que os seus defensores descuram o facto de ser a primeira experiência no país, que tem 164 municípios.
Em relação ao sector da habitação, o chefe de Estado salientou que estava em curso um programa habitacional em todo o país com a construção de 5.414 novas residências, que irão beneficiar quase 36.000 angolanos, nomeadamente nas províncias de Benguela, Bié, Namibe, Uíge e Luanda.

“Mas este não é um negócio para o Estado, mas sim para o sector privado, que tem de sair da letargia em que se encontra”, sublinhou João Lourenço.

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