MPLA APOSTA FORTE NA ELECTRICIDADE… POTÁVEL

Apenas 42% dos angolanos têm actualmente acesso a electricidade, percentagem que fica abaixo dos 10% em três províncias do interior, refere um estudo hoje apresentado. Relembre-se que Angola é independente há 46 anos, período em que sempre foi governada pelo mesmo partido, o MPLA.

O documento elaborado pela Associação Lusófona de Energias Renováveis (ALER) apresenta uma panorâmica sobre as energias renováveis em Angola, país que (de acordo com a crónica e ancestral propaganda do MPLA) pretende atingir uma taxa de electrificação de 50% até 2025 e que prevê um crescimento na procura que deve chegar aos 7,2 gigawatts.

A situação actual caracteriza-se pelo baixo nível de electrificação já que pouco mais de 42% dos angolanos têm acesso a energia eléctrica, dos quais 37,8% através de ligação à rede eléctrica nacional. As províncias do interior do país têm os níveis mais baixos de taxa de acesso, como o Bié, o Cunene e a Lunda Norte, que rondam os 10%, enquanto em Luanda a taxa de acesso é de 66% e em Cabinda de 52%.

Em 2021, a capacidade total instalada de produção eléctrica era de 5,9 gigawatts, repartidos por 63% de hídrica e 37% térmica, num mercado dominado pela Prodel (Empresa Pública de Produção de Electricidade de Angola), onde existem 66 centrais, em que 63 são públicas, uma corresponde a uma parceria público-privada e duas são privadas.

Segundo o estudo apresentado na conferência internacional sobre energia renovável em Angola, organizada pela ALER em parceria com a Associação Angolana de Energias Renováveis (Asaer), o objectivo do Governo é que até 2025 pelo menos 7,5% da electricidade gerada no país provenha de fontes de energias renováveis, excluindo as grandes hídricas, com uma potência total de 800 megawatts prevista.

O petróleo e a biomassa são as principais fontes de energia primárias em Angola, com destaque para a preponderância da biomassa nos agregados familiares das áreas rurais, que representam 37% da população total.

Ainda assim, conforme apontou Isabel Cancela de Abreu, directora executiva da ALER, na comparação com outros países africanos, Angola é dos que menos recorre a este tipo de energia para cozinhar (essencialmente lenha).

O sector residencial representa a maior parte do consumo de energia, seguindo-se os transportes, enquanto o consumo industrial é ainda reduzido.

A mesma responsável elencou algumas dificuldades do sector como o elevado nível de perdas e as dificuldades da ENDE (Empresa Nacional de Distribuição de Energia) em fazer as cobranças, levando à acumulação de dívidas e colocando problemas de sustentabilidade financeira, resultantes da operação deficitária.

“Houve um aumento de tarifas, mas ainda não cobrem os custos”, indicou Isabel Cancela de Abreu, sugerindo a necessidade de alguns “aumentos não lineares”.

O relatório indica que Angola tem actualmente uma das tarifas de electricidade mais baixas da África subsaariana, defendendo aumentos progressivos “a bem da sustentabilidade do sector”, ainda que esta seja uma medida impopular, bem como o aumento da eficiência das empresas responsáveis pela produção, transporte e distribuição de electricidade, para que o custo real do quilowatt/hora seja reduzido.

“É importante desmistificar o conceito de que os consumidores não têm capacidade para pagar os reais custos do fornecimento de energia eléctrica”, refere o estudo, indicando que devem ser garantidos escalões de pagamento, de acordo com a vulnerabilidade dos consumidores. Faz sentido. Desde logo porque os 20 milhões de pobres não consomem energia eléctrica. Por regra “vivem” recorrendo à luz dos candeeiros… apagados ou, como explicou o emblemático general do MPLA, Bento Kangamba, à electricidade… potável.

Por outro lado, a insustentabilidade do sector eléctrico público “cria uma distorção de mercado que faz com que as soluções renováveis não pareçam ser tão competitivas como já são”, acrescenta o relatório.

Recorde-se que João Baptista Borges, ministro da Energia e Águas desde 2011, afirmou em 10 de Setembro de 2019, em Luanda, que era preciso aumentar a taxa de acesso à electricidade, num país onde só menos de metade dos cerca de 30 milhões de habitantes tem acesso a luz. Nesse dia, o Folha 8 considerou que esta afirmação não era uma questão de desfaçatez, considerando-a uma questão de criminosa incompetência.

João Baptista Borges discursava na abertura da palestra sobre o Financiamento dos Projectos de Energia Renováveis e o Ambiente Regulatório Óptimo para o Sector da Energia Eléctrica, promovido pelo Programa Power África, do Governo norte-americano, no âmbito da cooperação com Angola no domínio da energia eléctrica.

Segundo o ministro, havia uma significativa parte da população ainda a viver em áreas rurais ou semi-rurais, zonas das periferias das cidades, e era necessário encontrar-se soluções que sejam económicas para se levar energia eléctrica a essas localidades, eventualmente (quem sabe?) testando essa metodologia no Bairro dos Ministérios, no ginásio para os deputados ou até no Palácio Presidencial.

“O nosso país dispõe de recursos abundantes, recursos energéticos, primários como é o caso da energia solar”, que tem hoje um custo cada vez mais competitivo e é uma solução para a electrificação do país, admitiu o ministro. Depreende-se, perante tão sábia conclusão, que esses recursos abundantes só agora foram descobertos, pois o MPLA está no Governo há 46 anos.

O titular da pasta da Energia e Águas sublinhou que o Plano de Desenvolvimento do Sector Eléctrico e o Plano de Segurança Energética apontam para a construção de uma capacidade de cerca de 600 megawatts de energia solar no país até 2022, com a instalação de cerca de 30.000 sistemas individuais de produção de energias fotovoltaicas.

Se em 2022 já será assim, o que será Angola quando o MPLA festejar os 100 anos de governação? E já não falta tudo. Mais 54 e lá estará o país a entrar no paraíso.

O governante, o tal que é ministro desta pasta desde 2011, salientou que para se alcançar essa meta conta com o concurso do sector privado, sendo que este terá de fazer o que o Estado/MPLA mandar.

Promessas que ficam às… escuras

No início de Setembro de 2016 ficou a saber-se que o Estado (MPLA) iria capitalizar a nova empresa pública nacional responsável pela comercialização e distribuição de electricidade com mais de 38 milhões de euros, segundo um despacho presidencial.

De acordo com o documento assinado pelo então Presidente José Eduardo dos Santos, de 18 de Agosto, foi autorizado um crédito adicional para a capitalização da Empresa Nacional de Distribuição de Electricidade, criada em Novembro de 2014.

Estabelecia-se ainda que caberia ao Instituto para o Sector Empresarial Público a abertura do crédito necessário, no valor de 5.417.600.000 de kwanzas (38,6 milhões de euros).

O Governo criara um ano antes, sob a égide de João Baptista Borges, três novas empresas públicas para gerir a área da energia, avaliadas em mais de 9,5 mil milhões de euros, e a extinção de outras duas.

A decisão foi justificada pelo Executivo de José Eduardo dos Santos com a “estratégia de desenvolvimento do sector eléctrico” do país e pela necessidade de “saneamento financeiro das empresas do sector”.

A nova estrutura organizativa do sector, também no âmbito do desenvolvimento programado até 2025, envolveu a criação de unidades de negócio dedicadas expressamente à Produção, Transporte e Distribuição de energia.

O diploma com estas medidas aprovou também a extinção das empresas públicas ENE (Empresa Nacional de Electricidade) e EDEL (Empresa de Distribuição de Electricidade).

Os activos destas duas empresas – e ainda do Gabinete de Aproveitamento do Médio Kwanza -, bem como responsabilidades e trabalhadores foram distribuídos, em função das unidades de negócio, pelas novas empresas criadas.

Foi o caso da empresa pública de Produção de Electricidade (PRODEL), “responsável pela exploração, em regime de serviço público, dos centros electroprodutores”, integrando um capital estatutário de 4.997 milhões de dólares (4,4 mil milhões de euros).

Outra das novas empresas públicas constituídas foi a Rede Nacional de Transporte de Electricidade (RNT), “dedicada exclusivamente à gestão do sistema, à operação do mercado (comprador único) e à gestão da rede de transporte” e com um capital estatuário de 2.997 milhões de dólares (2,6 mil milhões de euros).

Por último, o mesmo diploma criou a Empresa Nacional de Distribuição de Electricidade (ENDE), dedicada “exclusivamente à comercialização e distribuição de energia eléctrica, no âmbito do sistema eléctrico público”, representando um capital estatuário de 2.918 milhões de dólares (mais de 2,6 mil milhões de euros).

Produção hidroeléctrica

Recorde-se, entretanto, que o Governo chamou uma empresa privada para estudar a potencialidade e viabilidade de novos projectos de produção hidroeléctrica no país.

Segundo o despacho presidencial de 8 de Abril de 2016, o Ministério da Energia e Águas (do ministro João Baptista Borges) foi autorizado a celebrar um Memorando de Entendimento com a empresa Organizações Mário Freitas & Filhos, para a realização em conjunto de estudos preliminares de viabilidade para projectos de infra-estruturas eléctricas nos domínios de Produção, Transporte e Distribuição.

“Tendo em conta a existência em Angola de um potencial hidroeléctrico elevado e a possibilidade de serem consideradas ampliações na capacidade de geração de energia hidroeléctrica”, lê-se no documento.

Além disso, o Governo reconhece nesse projecto a “necessidade de reabilitar e expandir as redes de distribuição de electricidade das sedes municipais e implementar os projectos de electrificação rural”.

Angola precisava de mais do que duplicar a capacidade de produção de electricidade instalada no país, para cerca de 5.000 MegaWatts (MW), para responder a um crescimento de 12% ao ano no consumo.

Os números foram transmitidos pelo ministro da Energia e Águas, João Baptista Borges, a 11 de Novembro, tendo então admitindo que a actual potência instalada, de 2.162 MW, não era suficiente para responder ao consumo real.

“E estes números não incluem fontes térmicas privadas [geradores] que as pessoas usam para garantir o fornecimento próprio, porque são equipamentos importados e que não estão identificados. Daí que estes 5.000 MW sejam uma estimativa das nossas reais necessidades”, assumiu o ministro.

Na prática, este défice provoca sistemáticos cortes no fornecimento de electricidade à população, face ao aumento do consumo, explicado com o registo de subida das temperaturas no país, além da reduzida taxa de cobertura do território.

O plano de reforço da capacidade instalada em Angola envolvia, até 2017, a ampliação da barragem de Cambambe, a construção da barragem de Laúca (ambas na província do Cuanza Norte) e da Central do Ciclo Combinado do Soyo (província do Zaire), permitindo atingir a produção considerada necessária para assegurar os consumos de uma população de 24,3 milhões de pessoas.

Recorde-se que o ministro João Baptista Borges criou uma comissão de inquérito para apurar as causas que estiveram na base do corte geral de electricidade, registado no sistema norte no dia em que, curiosamente, o Presidente da República falava na Assembleia Nacional.

Um comunicado da Empresa Pública de Produção de Electricidade referia que enquanto decorria o inquérito ficava suspenso o director do Aproveitamento Hidroeléctrico de Cambambe, até à conclusão do mesmo.

O corte ocorreu durante o discurso sobre o Estado da Nação proferido pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, na abertura do ano legislativo da Assembleia Nacional. O incidente afectou à mesma hora várias províncias do norte do país, incluindo Luanda…

Folha 8 com Lusa

Artigos Relacionados

Leave a Comment