ENSINO EM EBULIÇÃO

Professores universitários angolanos retomaram hoje a greve por tempo indeterminado, suspensa há um mês, por “falta de vontade política” do Governo em solucionar as reivindicações da classe, sobretudo em relação ao aumento salarial, disse fonte sindical.

Segundo o secretário-geral do Sindicato Nacional dos Professores do Ensino Superior (Sinpes), Eduardo Peres Alberto, a greve interpolada em 5 de Abril para 30 dias, a retomada nesta segunda-feira acontece por falta de vontade política das autoridades.

“Findo o prazo e caso o governo não desse soluções sobre o problema salarial no dia 9 teríamos que retomar a greve e o que secretariado nacional fez foi fazer cumprir as deliberações da assembleia geral”, disse hoje o sindicalista.

Mas, sublinhou, “exigimos do Governo soluções dialogadas recorrentes sem imposições como tem acontecido com o Ministério do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação (MESCTI), para podermos chegar ao entendimento e o seu cumprimento pode ser faseado”.

“Já é um facto o recomeço da greve, por falta de vontade política do Governo em cumprir de forma integral o memorando assinado no dia 17 de Novembro de 2021, o que vem a ser um constrangimento para o país, sobretudo se houver anulação do ano académico”, realçou o líder do Sinpes.

A greve, que se iniciou em 3 de Janeiro passado e esteve suspensa por 30 dias, retomou hoje por “tempo indeterminado”.

Aumento salarial, melhores condições laborais, pagamento da dívida pública e eleições dos corpos directivos das instituições públicas do ensino superior constituem algumas das reivindicações dos professores universitários angolanos.

Um aumento salarial de 6% foi a proposta do Presidente João Lourenço, aos professores que, no entanto, foi rejeitada em assembleia geral, onde estes aprovaram uma proposta de 2,6 milhões de kwanzas (5,2 mil euros) para o professor catedrático e 1,5 milhões de kwanzas (3 mil euros) para o professor assistente estagiário.

O MESCTI anunciou, em Abril após a suspensão da greve, que os estudantes perderam 14 semanas lectivas, em consequência da paralisação dos professores, e esperava que as divergências com os docentes fossem dirimidas.

A entidade ministerial, em comunicado, após o reinício das aulas no ensino superior público, desejava que o retorno das aulas não sofresse outra suspensão e pedia o empenho dos estudantes e professores para “recuperar o tempo perdido”.

Enquanto isso, pais e encarregados de educação, em Luanda, lançam um “desesperado grito de socorro” ao Presidente João Lourenço, para melhorar as condições de ensino de uma escola do ensino especial e da condição social das famílias dos alunos.

Numa carta dirigida ao Presidente, datada de 6 de Maio, o colectivo de pais e encarregados de educação da Escola do Ensino Especial nº 8.001 solicita apoio institucional para a instituição e respectivos alunos.

Segundo os subscritores, as limitações decorrentes da condição especial dos filhos são, por si só, um grande desafio e impõem às famílias, a maioria em situação de pobreza e sem condições de custear escolas particulares, dificuldades que têm resultado em várias consequências.

O elevado grau de absentismo e desistência escolar estão entre as consequências porque, referem, devido à exiguidade de escolas do ensino especial, crianças de todo o município do Kilamba Kiaxi, onde está localizada a escola 8.001, e de outros municípios têm de percorrer longas distâncias para ter acesso ao ensino.

As salas da instituição escolar são “superlotadas e dificultam os trabalhos dos professores”. A falta de transporte escolar para os alunos, muitos com locomoção limitada, devido à incapacidade motora, consta também entre as inquietações dos pais, referindo que os transportes públicos não isentam os alunos com necessidades especiais e seus acompanhantes do pagamento de bilhete de passagem.

O colectivo de pais e encarregados de educação conta que a não isenção nos transportes públicos “constitui um enorme constrangimento para as famílias que não conseguem custear a deslocação diária dos filhos à escola, tendo de priorizar a época dos exames”.

Queixam-se também de “acentuada degradação” do nível social, da qualidade de vida dos portadores de necessidades especiais e da sua família, cujos pais vêem o “salário descontado ou perdem do emprego porque têm de acompanhar diariamente os filhos”.

“Nas actuais condições de transportação e, ao meio dia, levá-los de volta à casa, pois carecem de acompanhamento e supervisão contínua, o que é incompatível com o cumprimento do horário normal de expediente”, dizem.

Estes falam também em “desestruturação familiar e sobrecarga física, psicológica emocional”, sobretudo para a mulher, porque “muitas vezes o progenitor abandona a família por causa da rotina difícil e onerosa subjacente à criação e educação de crianças especiais”.

“Rogam” ao Presidente angolano que sejam disponibilizados meios de transporte escolar para as crianças das escolas especiais e que elas e seus acompanhantes sejam isentos do pagamento do bilhete de passagem nos transportes públicos.

A necessidade das escolas do ensino especial serem dotadas de material para a emissão de cartões escolares e da “efectivação da merenda escolar, para uma boa alimentação destes, devido à carência das famílias”, estão igualmente entre as solicitações.

Defendem ainda que na proposta de lei de alteração à Lei Geral do Trabalho seja equacionada uma cláusula de “horário especial e protecção contra o despedimento” de pais e tutores de alunos com necessidades especiais, aumento de salas de aula e quotas de ingresso de professores especializados “para suprir o actual défice”.

Noutra frente, o Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA) disse hoje que o retorno à greve dos professores universitários “caiu como uma bomba” no seio da classe estudantil, manifestando-se “tristes e indignados” pela “falta de sensibilidade” dos docentes e do Governo.

“Nós, o MEA, recebemos a notícia da greve como uma bomba e estamos indignados, revoltados, não aceitamos a retoma da greve, não aceitamos a postura do sindicato e também não aceitamos a postura do Governo”, afirmou hoje o presidente do MEA, Francisco Teixeira.

“Entendemos nós que tem de haver sensibilidade, tem de se pensar Angola, pensar nação e pensar nação é resolver os problemas muito distantes das greves”, salientou.

Segundo Francisco Teixeira, os estudantes vão promover várias “acções de luta, protesto e indignação” contra o Governo e o Sindicato Nacional dos Professores do Ensino Superior (Sinpes).

“Porque, explicou, entendemos nós que o ano lectivo não pode ser anulado, pobres não podem pagar por irresponsabilidade dos adultos e nós vamos encontrar formas de solução, estamos tristes, insatisfeitos”.

“É o sonho de futuro de milhares de jovens em jogo e entendemos que há de se fazer alguma coisa”, referiu.

Hoje, o MEA, que já promoveu duas manifestações em Fevereiro passado pelo retorno às aulas, assegurou que vai reunir estudantes de várias instituições para “traçar linhas de força para invertermos” o actual quadro que se vive no ensino superior público em Angola. 

“Vamos também marcar encontros com o Sinpes e o MESCTI para apurar realmente o que se passa e apresentar sugestões e caminhos para a resolução do problema”, rematou Francisco Teixeira.

Folha 8 com Lusa

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