Segundo a Lusa, o ex-Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, não deixou testamento o que, diz a Agência de Notícias de Portugal, dificulta a tarefa da justiça espanhola na batalha legal que envolve Governo e a família. Curiosamente, ou não, diversas fontes contactadas pelo Folha 8 apontam para a existência de testamento, “havendo várias cópias”, algumas em poder de “alguns dos seus velhos cabos de guerra” e “depositadas fora de Angola, em Espanha, por exemplo”.
Vejamos a versão apresentada pela Lusa. “Não existe testamento, isso foi já confirmado pelos familiares e pelo chefe da escolta com que confidenciou durante os últimos 33 anos”, disse a fonte à Lusa.
Segundo a mesma fonte, o antigo chefe de Estado era “pragmático” e “terá dado a cada um dos filhos aquilo que achava que cada um devia ter”, chamando “cada um a seu tempo”.
“Cada um dos filhos sabe perfeitamente o que ele deixou”, acrescentou, admitindo que “ainda muita água vai correr debaixo da ponte”, já que o chefe de Estado não deixou por escrito a sua última vontade, escreve a Lusa. É falso. Deixou. Deixou não só um testamento propriamente dito como “outros documentos complementares, de carácter político e social, com assinatura reconhecida notarialmente e testemunhados”, dizem diversas fontes (sem vínculo familiar a Eduardo dos Santos) ao Folha 8.
Entretanto, o Governo angolano deu indicações aos advogados que o representa em Barcelona para averiguar se José Eduardo dos Santos poderia encontrar-se em situação ilegal, como foi noticiado pelo Club K, tendo afastado essa possibilidade.
“Se fosse um imigrante ilegal, o assunto já estaria resolvido”, disse a fonte, indicando que José Eduardo dos Santos era tratado pelos mesmos médicos em Barcelona há vários anos e gozava do mesmo estatuto de quando era Presidente, que lhe permitia permanecer o tempo necessário em Espanha para tratamento médico na clínica Teknon, onde morreu, no dia 8 de Julho, com 79 anos.
“Ele não era residente em Espanha, e sim em Angola. Tinha uma equipa de apoio, com cerca de 15 pessoas, afectas ao seu serviço e à sua escolta e esta sim, era rendida a cada 30 dias. Os únicos que tinham visto de longa duração eram o Presidente, o seu médico pessoal e o chefe da escolta, mas José Eduardo dos Santos não tinha necessidade de sair de Espanha, até porque estava muitas vezes internado”, detalhou.
A questão foi levantada pelo site Club K, segundo o qual o juiz espanhol que julga a causa “descobriu” que o ex-Presidente estaria ilegal em Espanha pois tendo entrado com passaporte diplomático (que não requer visto de entrada), excedeu o tempo que lhe era permitido e não solicitou o visto para permanência no país.
Segundo a filha Tchizé dos Santos, as pessoas com passaporte diplomático podem entrar livremente nos países, mas não podem permanecer mais de 90 dias, e “se o fizerem terão de tratar de um cartão de residente”, que José Eduardo dos Santos não possuía.
“A embaixada, o Governo de Angola, não trataram de nada e nem precisavam de fazê-lo. Bastava dar um estatuto diplomático ao Eng. José Eduardo dos Santos e registá-lo com esse estatuto junto do Ministério das Relações Exteriores espanhol para ele constar da lista do corpo diplomático. Assim, hoje em dia poderiam ser eles a mandar por que a casa do Eng. Eduardo dos Santos seria território de Angola, seria uma casa diplomática, o que nunca ocorreu”, disse, numa mensagem de voz enviada à Lusa.
Esta poderá ser uma semana decisiva para o tribunal espanhol, que pediu exames toxicológicos complementares à autópsia, adiando a decisão judicial sobre a guarda e eventual trasladação do corpo do ex-Presidente para Angola. Por alguma razão, aliás, as fontes supostamente oficiais do Governo de João Lourenço têm se multiplicados em declarações em “off” sobre o caso, só faltando mesmo a divulgação de que Eduardo dos Santos terá deixando um “testamento” a dizer que gostaria de ser enterrado segundo a vontade de João Lourenço…
O tribunal deverá também convocar as autoridades policiais e migratórias espanholas, para apurar a legalidade da permanência de Eduardo dos Santos no país ibérico e onde era de facto a sua residência.
Duas facções da família dos Santos disputam, na Vara de Família do Tribunal Civil da Catalunha, quem ficará com a guarda do corpo de José Eduardo dos Santos. Apesar de defender – por conveniência – a inexistência de testamento, há conselheiros do Governo de João Lourenço que defendem que um testamento específico sobre a sua vontade “post mortem”, “vinha mesmo a calhar”.
De um lado, está Tchizé dos Santos e os irmãos mais velhos, que se opõem à entrega dos restos mortais à ex-primeira-dama, Ana Paula dos Santos, e são contra a realização de um funeral de Estado antes das eleições para evitar aproveitamentos políticos.
Do outro, está Ana Paula dos Santos e os seus três filhos em comum com José Eduardo dos Santos, que reivindicam também o corpo e querem que este seja enterrado em Angola nos próximos tempos, tal como consta das ordens superiores que recebeu do Governo.
Esta pretensão é, de facto, apoiada pelo Governo angolano que anunciou a intenção de fazer um funeral de Estado, mas teve de se contentar com sete dias de luto nacional e um “velório” sem corpo, enquanto a disputa prossegue nas instâncias judiciais, a quatro dias do início da campanha para as eleições gerais, tornando-se num facto político que está a marcar a corrida eleitoral.
Em entrevista no domingo a alguns meios de comunicação social angolanos, o ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente da República, que lidera a delegação que representa o Estado angolano, general Francisco Furtado, mostrou-se confiante num desfecho favorável, salientando que os cidadãos angolanos e a comunidade internacional querem ver “o problema resolvido”.
“Toda a Nação angolana quer a presença do seu antigo líder no país para lhe render a merecida homenagem”, disse Francisco Furtado, sublinhando que se as autoridades espanholas tiverem em conta as razões que levaram o ex-Presidente a Barcelona “não haverá outro desfecho que não seja o regresso do corpo para Luanda”.
Folha 8 com Lusa