DITADORES AMIGOS, A CPLP ESTÁ CONVOSCO!

A Missão de Observação Eleitoral (MOE) desse “elefante branco” que dá pelo nome de Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) às eleições de domingo na Guiné Equatorial recomenda que seja assegurado o “acesso equitativo dos candidatos e partidos políticos” na imprensa pública do país para “promover o voto esclarecido”. Ou seja, recomenda neste caso o que não teve coragem (tomates em linguagem popular) para recomendar na altura das eleições em Angola.

A recomendação consta da Declaração Preliminar da MOE da CPLP, e diz respeito às eleições presidenciais, Câmara dos Deputados, Senado e municipais, realizadas no passado dia 20.

“Tendo observado disparidades na execução dos procedimentos, em particular de encerramento, a MOE da CPLP recomenda a adopção de medidas com vista à uniformização e ao aperfeiçoamento contínuo dos procedimentos de votação e da gestão do processo eleitoral, nomeadamente através da formação e capacitação dos membros de mesa”, aconselha ainda a missão da organização lusófona que é um verdadeiro oásis para dar tachos a políticos desempregados e parasitas.

A MOE da CPLP, chefiada por Maria do Carmo Silveira, antiga primeira-ministra de São Tomé e Príncipe e antiga secretária-executiva da CPLP, integrou um total de 15 observadores, entre os quais, diplomatas e técnicos nomeados pela presidência em exercício (MPLA/Angola) e pelos demais Estados-Membros, representantes da Assembleia Parlamentar da CPLP (AP-CPLP), indicados pela Assembleia Nacional de Angola, bem como funcionários do Secretariado Executivo.

“Durante este período, a MOE da CPLP acompanhou a fase final da campanha eleitoral e promoveu encontros com todos os candidatos, tendo estado presente em comícios realizados na cidade de Malabo”, capital do país.

No dia da votação, a MOE da CPLP desdobrou-se em sete equipas, distribuídas pelas províncias de Bioco Norte (duas equipas), Bioco Sul, Litoral, Centro Sul, Kie Ntem e Wele-Nzas (com uma equipa cada), tendo observado 190 mesas de voto, correspondentes a um total de 60.831 eleitores, 18% das quais situadas em meios rurais.

Nas mesas de voto observadas, a MOE da CPLP constatou que os eleitores exerceram o seu direito de voto, directo e secreto, “de forma ordeira e organizada, não tendo sido registadas interrupções ou perturbações à realização do ato eleitoral”, tendo na generalidade sido cumpridos os procedimentos de abertura.

“As mesas de voto observadas estavam acessíveis aos eleitores e nas imediações dos locais de residência, registando-se, em muitos casos, a presença das forças de segurança e ordem pública próximas das mesas de votação”, sinaliza-se na declaração preliminar.

“Não foram afixadas as actas do escrutínio no local de voto nas mesas em que a MOE da CPLP observou o encerramento”, acrescenta-se no documento.

Relativamente, aos resultados anunciados hoje pelo ministro do Interior e Assuntos Locais, Faustino Ndong Esono Ayang, que preside à comissão eleitoral, estão escrutinados mais de 45% dos votos, com o Presidente Teodoro Obiang a recolher 189.031, a enorme distância dos restantes dois candidatos presidenciais.

Andrés Esono Ondo, da Convergência para a Democracia Social da Guiné Equatorial (CPDS), obteve até agora 5.473 votos, enquanto Buenaventura Monsuy Asumu regista apenas 1.490.

O Presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, concorreu a um sexto mandato após 43 anos no poder.

As eleições presidenciais de domingo coincidiram com eleições legislativas, senatoriais e municipais — o que constitui uma infracção à Constituição equato-guineense, que exclui a realização simultânea das presidenciais com outros plebiscitos.

As presidenciais estavam, por outro lado, previstas para Abril próximo, sendo esta antecipação também expressamente excluída na Magna Carta do país.

Um total de 427.661 eleitores, de entre uma população de 1,45 milhões de habitantes, estavam registados para escolher um dos três candidatos à Presidência, assim como o partido para ocupar os 100 assentos na câmara baixa do Parlamento em Malabo (99 dos quais actualmente reservados ao Partido Democrático da Guiné Equatorial (PDGE, partido único até 1991), parte do senado (cujos 70 assentos são ocupados pelo PDGE), e os dirigentes dos 37 municípios do país.

Os candidatos à presidência foram Teodoro Obiang, líder do PDGE, Andrès Esono Ondo, presidente do partido da CPDS, o único partido da oposição que não está proibido, e o líder Partido da Coligação Social Democrática (PCSD), Buenaventura Monsuy Asumu, um senador e aliado crónico de Obiang, que concorre contra o Presidente pela quinta vez oferecendo ao regime um simulacro de democracia.

Teodoro Obiang, actualmente com 80 anos, governa com “punho de ferro” um pequeno país rico em petróleo desde 1979, na sequência de um golpe de Estado em que derrubou o seu tio e ditador sanguinário Francisco Macias Nguema, e é o Presidente há mais tempo no poder em todo o mundo.

VERGONHA PRECISA-SE, URGENTEMENTE

Em 2016 os observadores da CPLP consideraram que as eleições presidenciais na Guiné Equatorial decorreram “de forma ordeira e pacífica” e registaram uma predominância de elementos do partido no poder. Teodoro Obiang ganhou com 98% dos votos. Que melhor prova de democracia poderia querer a CPLP…

“A votação decorreu de forma ordeira e pacífica, não havendo registo de incidentes. O acto eleitoral foi acompanhado de um visível dispositivo de segurança”, considerou a equipa de “turistas” da CPLP.

Os observadores/turistas da organização lusófona, a que a Guiné Equatorial aderiu em 2014, constataram, nas deslocações realizadas, “a predominância de elementos de campanha eleitoral do PDGE [Partido Democrático da Guiné Equatorial, no poder] face às demais candidaturas”.

Por outro lado, a equipa observou a presença de delegados do PDGE “em todas as mesas visitadas, e a presença, em menor número de mesas, de delegados de outras candidaturas”.

“O dia eleitoral decorreu conforme os procedimentos operacionais previstos para o efeito, designadamente no Manual de Instrução para os Membros das Mesas” e, “nos locais visitados, os membros das mesas de voto demonstraram o necessário conhecimento sobre os procedimentos a seguir, o mesmo acontecendo com a generalidade dos eleitores”, descreveu a missão de acompanhamento.

Os observadores verificaram ainda que as mesas visitadas “dispunham do material necessário ao seu bom funcionamento e ao exercício do voto por parte dos eleitores”, acrescentaram.

Segundo a CPLP, a acção da equipa “foi condicionada pela chegada tardia ao país, o que não permitiu o acompanhamento do ciclo eleitoral, designadamente do período de campanha, nem assegurar a cobertura da parte continental do território nacional”. O então secretário executivo Do elefante branco, Murade Murargy, disse que tal se deveu a constrangimentos financeiros.

Por outro lado, acrescentava a nota da missão de acompanhamento, não foram disponibilizadas listas das mesas de voto em tempo útil, o que “não permitiu a identificação atempada dos locais de acompanhamento do ato eleitoral”.

A missão decorreu a convite das autoridades da Guiné Equatorial e a equipa foi chefiada pelo então representante permanente de Timor-Leste junto da CPLP, embaixador Antonito de Araújo, integrando ainda diplomatas das representações de Cabo Verde e São Tomé e Príncipe e elementos do secretariado-executivo.

Recorde-se que, segundo Domingos Simões Pereira, então Secretário Executivo da CPLP, o processo de adesão da Guiné Equatorial à CPLP consistia em:

“Por um lado, a Guiné-Equatorial já está cumprindo com a aprovação da língua portuguesa, como língua oficial. Mas também há princípios que têm a ver com o exercício democrático no país, com uma maior abertura, com os direitos humanos. Há todo um conjunto de princípios no país que nós achamos que têm que ser respeitados”.

Era, na altura, uma tentativa, vã e coxa, de querer dar credibilidade à CPLP.

Com a bênção do democrata (apesar de não eleito nominalmente e no poder desde 1979) presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, e com o agachamento dos restantes países, a ditadura de Teodoro Obiang entrou na CPLP com armas e bagagens.

É evidente que a entrada da Guiné Equatorial na CPLP “não vai mudar nada no regime de Teodoro Obiang” (onde está a novidade?), afirmou já em Julho de 2010 à Agência Lusa um dos líderes da oposição em Malabo.

“Obiang está no poder desde 1979 e vai continuar a violar os direitos humanos, a torturar e a prender”, declarou Celestino Bacalle, vice-secretário geral da Convergência para a Democracia Social (CPDS).

“Nada mudou na ditadura nestes anos todos nem vai mudar com a entrada na CPLP. Quem muda são os que antes criticavam a situação na Guiné Equatorial e agora são convencidos pelo dinheiro, pelo petróleo e pelos negócios”, acusou o número dois da maior plataforma da oposição equato-guineense.

“Hoje, os que tinham uma posição crítica sobre a ditadura de Obiang mudam de posição depois de visitarem Malabo”, ironizou o dirigente da oposição, responsável pelas relações políticas internacionais da CPDS.

“A adesão à CPLP não nos surpreende. A candidatura era previsível, na linha do que Obiang tem feito com outras organizações internacionais. Ele quer mostrar ao povo guineense que o dinheiro pode comprar tudo o que ele quiser. O pior é que tem razão”, denuncia o dirigente da CPDS.

“Obiang está a conseguir que as portas se abram em todo o lado para o regime. Apoiam-no agora para ter o nosso petróleo mais tarde”, sublinhou.

“O que constatamos é que África avança a três velocidades, não a duas. Há uma África dos países que já atingiram a democracia, há outra dos países que estão a caminho de atingir esse objectivo e depois há o grupo da Guiné Equatorial, onde assistimos a um retrocesso”, afirmou Celestino Bacalle.

“A Guiné Equatorial faz parte do pior de África, mas isso não interessa a quem fica convencido pelas promessas de negócios”, acrescentou o líder da oposição.

“É uma vergonha para muitos governos africanos que fecham os olhos ao que se passa na Guiné Equatorial”, uma crítica que, disse Celestino Bacalle, “serve também para o Governo português”.

“Obiang não admite influência de ninguém porque não tem essa humildade. Quanto à promessa que ele fez de declarar o português como língua oficial da Guiné-Equatorial, vai acontecer o mesmo que aconteceu ao francês: é língua oficial há muitos anos e quase ninguém fala entre a população”, conclui o dirigente da oposição.

Obiang, como aliás os angolanos, sabe que o que hoje é verdade para os governos da CPLP amanhã pode ser mentira. Também sabe, tal como José Eduardo dos Santos, que ontem era bestial mas que ao deixar o cargo passou a besta.

Por alguma razão o moçambicano Tomaz Salomão, na altura secretário executivo da SADC (Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral), dizia a propósito da presença de muitos regimes ditatoriais: “São ditadores, mas pronto, paciência… são as pessoas que estão lá”.

Folha 8 com Lusa

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