VENDER ÁGUA SEM CANECO É UMA ARTE

O Presidente da República angolano, também Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo, João Lourenço, considerou hoje que o país está a “aprender a lidar cada vez melhor com as diferenças” de um contexto democrático que está em constante evolução, pedindo uma bienal com impacto “benéfico e duradouro”.

Aprendizagem difícil porque só aprende quem quer mesmo aprender. Democracia? Do tipo do que o MPLA determinou que se fizesse ao PRA-JA de Abel Epalanga Chivukuvuku? Do tipo do que o MPLA determinou que fizesse à UNITA, demitindo Adalberto da Costa Júnior de Presidente e “elegendo” Isaías Samakuva?

Enquanto intervinha no arranque os trabalhos do Bienal de Luanda 2021 – Fórum Pan-Africano para a Cultura de Paz, João Lourenço referiu que Angola “tem vindo a aprender a lidar cada vez melhor com as diferenças de um contexto democrático em constante evolução e aprofundamento”.

Tem razão. “Diferenças de um contexto democrático” que o MPLA aceita sem problemas desde que, é claro, continue no Pode. Aliás, desde há muito, que o MPLA defende e pratica a tese democrática de que todos podem e devem manifestar as suas opiniões, se bem que que só um pode mandar. E, é claro, só pode mandar quem é dono do reino.

A bienal começou hoje e vai decorrer até terça-feira na capital angolana, e o chefe de Estado espera que “seja um sucesso digno de registo com impacto benéfico e duradouro” na construção de um caminho para a paz que se sinta no “continente africano e em toda a humanidade”.

João Lourenço diz ter o desejo de que esta bienal, que se realiza pela segunda vez na capital angolana, possa vir a “constituir-se como uma plataforma de referência, que agrupe governo, sociedade civil, comunidades artística e científica, o sector privado e as organizações internacionais”, na conquista “e manutenção da paz e prevenção de conflitos”.

Para mais informações sobre os princípios do Presidente do MPLA sobre “manutenção da paz e prevenção de conflitos” basta recordar o massacre de muitos milhares de angolanos no 27 de Maio de 1977 (ordenado por Agostinho Neto), os assassinatos em Cafunfo, a situação em Cabinda, os 20 milhões de pobres etc. etc..

À semelhança do que o homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa, enalteceu que os vários governos têm de aprender a lidar e aproveitar a vasta comunidade jovem, assim como as diferenças culturais e demográficas que conferem singularidade ao continente africano.

O chefe de Estado lamentou que “muitos dos filhos de África” tenham abandonado “o continente em condições desumanas e com o risco de suas próprias vidas ao fugir das zonas de conflito ou na procura de emprego e de melhores condições de vida”.

Dos que, no caso de Angola, tiveram e têm de abandonar o país por quererem continuar… vivos, João Lourenço não falou.

“Independentemente da sua idade, formação académica ou profissional, todos eles são importantes e necessários para o desenvolvimento do nosso continente”, completou.

A expectativa, prosseguiu, é que possam um dia regressar “voluntariamente” e que contribuam para o desenvolvimento de África: “Este passo marcaria o reencontro com as suas terras, as suas gentes, para que, num abraço fraterno à pátria que os viu nascer, enfrentem o desafio de ser protagonistas do progresso e do desenvolvimento dos respectivos países”.

O importante agora, elencou, é “identificar com objectividade as causas reais das nossas dificuldades, os caminhos a trilhar e os parceiros verdadeiramente interessados em apoiar o desenvolvimento de África”. Ao fim de 46 anos de Poder, o MPLA ainda não percebeu o que é África, o que é Angola. E é pena que, apesar dos exemplos, esteja à espera que a história angolana volte a ser escrita com o sangue dos seus filhos.

De acordo com o Governo angolano, o envolvimento dos jovens como “actores de transformação social para a prevenção de conflitos”, África e as suas diásporas (só as afectas a quem estiver no Poder) face aos conflitos, crises e desigualdades e a exploração do potencial dos oceanos para o desenvolvimento sustentável e a paz, completam os objectivos da Bienal.

Entre génios e néscios o MPLA nunca teve dúvidas

2015. Os activistas detidos em Luanda, acusados de conspiração, queriam provocar uma intervenção da NATO em Angola que conduzisse ao derrube do Presidente José Eduardo dos Santos. Nem mais nem menos. Quem disse tal barbaridade? Ora quem haveria de ser? Nem mais nem menos o génio gerado pelos dois últimos líderes do MPLA.

António Luvualu de Carvalho estava desesperado e disparava em todos os sentidos. Na altura, ainda com o fantasma de José Eduardo Agualusa entalado na garganta, que lhe valeu um enorme puxão de orelhas do chefe do posto, descobriu mais essa pérola. Tinha então outras engatilhadas.

“São 15 cidadãos que durante vários dias, durante várias etapas foram acompanhados pelos Serviços de Investigação Criminal. Estavam num processo de sensibilização de um grupo (…) para levarem as autoridades até um ponto, um extremo de aconteceram inclusive mortes”, salientou Luvualu de Carvalho na resposta à encomenda de Luanda a que a Lusa (obviamente) respondeu afirmativamente.

Luvualu de Carvalho esteve na colónia europeia do MPLA (Portugal) naquela que foi a sua primeira etapa de uma peregrinação para, reconheceu na altura o próprio, “dar uma grande dinâmica à imagem de Angola a nível internacional”.

Socorrendo-se das afirmações feitas em Luanda pelo ministro do Interior angolano, Ângelo Veiga Tavares, o embaixador itinerante repetiu – e repetir é uma das suas mais entusiásticas características – que seria posta em prática uma marcha até ao Palácio Presidencial, “levando com que fossem quebradas as regras de segurança (…) para que a guarda presidencial ou a polícia presente reagisse, matasse crianças, matasse senhoras e matasse idosos para provocar a comoção internacional e justificar então uma intervenção vergonhosa”.

O rapaz é tão genial que até parece acreditar no que diz. Tem, reconheça-se, uma vantagem sobre a esmagadora maioria dos seus camaradas. Fala com tal convicção que ninguém reparou que era um dos boneco usados pelo ventríloquo Eduardo dos Santos, tal como é hoje por João Lourenço.

“É isto que se procurava. Que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) ou alguns países que dela fazem parte fizessem um ataque a Angola, para que se verifique o horror que se verifica agora na Líbia ou se verificou e verifica na Tunísia”, acentuou Luvualu de Carvalho.

Na altura, pedagogicamente, Agualusa bem lhe explicou que, por exemplo, o Quarteto de Diálogo para a Tunísia, composto por quatro organizações que negociaram uma forma de garantir que o país se mantivesse uma sociedade pluralista e democrática, em 2013, num momento de crise após a Primavera Árabe, venceu o Prémio Nobel da Paz de 2015. Isto pelo “contributo decisivo para a construção de uma democracia pluralista na Tunísia”.

Luvualu bem gostaria, por alguma razão tem íntimas ligações à ex-URSS, que o Pacto de Varsóvia ainda andasse por aí. Seria uma boa ajuda para manter a NATO quietinha, não seria Luvualu? Também gostaria que a Cuba continuasse a ser o que era nos tempos do Maio de 1977 e anos seguintes.

Mas era tudo uma chatice, um complô, para azucrinar o impoluto e honorável cidadão José Eduardo dos Santos. A URSS já não existe, Cuba até já vai à missa do Tio Sam, e a NATO apoia activistas…

Quanto aos efeitos do caso dos activistas então detidos na imagem do reino do seu patrão, Luvualu de Carvalho reconhecia que era negativa.

“A situação que levou à detenção destes 15 indivíduos e os processos de luta desenvolvidos por estes 15 levaram, claro, o nome de Angola às manchetes pelas piores razões e isso ninguém nega”, disse.

“Piores razões”? Lá teve Luvualu de baixar as calcinhas e levar uns tabefes do chefe.

Luvualu, similares e João Lourenço

O Presidente João Lourenço pediu no dia 23 de Maio de 2018 uma mudança radical na gestão do Ministério das Relações Exteriores, que para racionalizar recursos reduziu as missões diplomáticas e consulares, bem como o pessoal que nelas trabalhava. Talvez também fosse útil instituir o primado da competência e não só o da filiação no MPLA.

João Lourenço discursava na abertura da VIII reunião de embaixadores de Angola no exterior, encontro em que foram abordados aspectos administrativos e financeiros do Ministério das Relações Exteriores.

O chefe de Estado referiu que, na actual conjuntura de crise económica e financeira (um guarda-chuva que cobre uma doença mortífera – a incompetência), em que a diversificação da economia está no topo da agenda, é necessário que a diplomacia angolana se torne mais eficiente e “virada para a promoção da boa imagem do país, captação de investimento privado estrangeiro e promoção de Angola como destino turístico”. Daí, presume-se, a escolha de Luvualu para o reino de Obiang.

Para se atingir estas metas, é preciso, além de maior racionalização de recursos, através da redução de missões diplomáticas e consulares e consequentemente pessoal, enveredar para o aumento do número de países onde existirão embaixadores acreditados, mas não residentes.

Segundo o Presidente, esta prática, a que recorrem de uma forma geral todos os países, “em nada diminui a eficiência no atendimento aos países com quem mantêm relações diplomáticas”.

João Lourenço considerou que estas medidas, “corajosas, mas necessárias” e em que “o mérito deve ser premiado”, devem ser tomadas agora (2018). Certo. Deveriam ter sido tomadas há décadas, mas mais vale tarde do que nunca. Quanto a premiar o mérito, a teoria é boa, mas a prática é antagónica. O Presidente sabe, ou não fosse há décadas um homem do regime, que entre um néscio do MPLA e um génio da oposição as “ordens superiores” são bem claras: escolhe-se o néscio.

“Esta deve ser uma oportunidade que o senhor ministro com certeza não perderá para mexer naqueles funcionários sem qualificações, que foram nomeados apenas por serem familiares ou de alguma forma protegidos deste ou daquele político”, referiu.

Ora aí está. João Lourenço vem agora dizer o mesmo que, por exemplo, o Folha 8 diz há muitos, muitos anos. Não queremos direitos de autor, mas apenas que o Presidente não se limite a dizer: olhem para o que eu digo e não para o que eu faço.

De acordo com João Lourenço, Angola quer inaugurar uma era de maior responsabilização, na qual não será tolerada a “má gestão financeira e patrimonial ou ainda o nepotismo praticado por alguns quadros responsáveis do próprio ministério ou por chefes de missões diplomáticas”.

Outra preocupação actual, referiu o chefe de Estado, é a necessidade urgente de se actualizar a relação das entidades com direito ao uso do passaporte diplomático, “que venha a pôr cobro ao actual estado de banalização deste importante documento com validade internacional”.

João Lourenço orientou a recolha ou não renovação de passaportes diplomáticos na posse de cidadãos “que até prova em contrário não exercem, nunca exerceram ou deixaram de exercer qualquer função que os habilita a ser detentores do mesmo”.

“Trabalhemos para uma mudança radical na gestão do Ministério das Relações Exteriores. Peço, por isso ao senhor ministro das Relações Exteriores e à sua equipa, aos senhores embaixadores e a todos quantos trabalham directamente com fundos do MIREX que façam uma gestão parcimoniosa e exemplar dos fundos e do património desta instituição, tanto em Angola como no exterior”, disse.

Estas medidas, salientou o Presidente, visam ter um Ministério das Relações Exteriores “organizado e funcional, onde se respeita a carreira diplomática, promovendo-se uma rotação normal de embaixadores e de pessoal, permitindo-se assim a estabilização do ministério e a sua adequação aos melhores padrões internacionais”.

Nota. Esclarece-se a Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA), o Departamento de Informação e Propaganda e demais sucursais do MPLA que a expressão “vender água sem caneco” significa “não fazer nada”.

Folha 8 com Lusa

Foto: Lusa

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