“Substituir importações por produção própria é aposta certa”

O empresário angolano-brasileiro Valdomiro Minoru Dondo garante, mais uma vez, que não responde em nenhum processo na justiça angolana relacionado com suspeitas de corrupção, negando qualquer benefício nos seus negócios por alegada proximidade ao ex-Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos.

Quando Valdomiro Minoru Dondo começou a trabalhar em Angola, em 1992, a guerra civil ainda tardaria uma década para acabar. Na altura o empresário decidiu não centrar a sua actividade nas duas maiores fontes naturais de riqueza do país, o petróleo e os diamantes. Em vez disso, concentrou-se em impulsionar a economia angolana lutando contra as condições causadas pela pobreza e fortalecendo a classe média.

Nas duas décadas que passaram desde o seu empreendimento inicial, Valdomiro Minoru Dondo construiu projectos tais como cinemas, shoppings e restaurantes de “fast-food” em áreas urbanas, bem como sistemas de transporte. Deu uma decisiva contribuição na luta contra os efeitos da pobreza. Com o Projecto Sorriso, Valdomiro Minoru Dondo beneficiou crianças em escolas públicas com idades entre 5-12 anos na província do Huambo. O Projecto Sorriso distribui, por exemplo, utensílios de higiene oral, como escovas e pastas de dente, ao mesmo tempo que leva a cabo a educação social para a saúde.

Outro projecto que contou com o apoio de Valdomiro Minoru Dondo foi o Projecto Uhayele, programa ambicioso orientado para a saúde e a higiene oral. Composto não somente por profissionais médicos mas também por centenas de trabalhadores do ramo da saúde, vindos das comunidades onde actuam, o projecto atingiu sucesso considerável, incluindo a vacinação de mais de 70.000 crianças contra a poliomielite e um programa educacional que visou a construção e uso adequado de aterros sanitários e latrinas.

Sobre as alegadas ligações com José Eduardo dos Santos, o empresário garante que “nunca teve nenhuma”, esclarecendo que “nunca foi recebido” pelo antigo Presidente, referindo que “tinha sim relacionamentos como todos nós empresários que estamos aqui, temos que ter um bom relacionamento a nível do Governo, a nível de ministérios e isso tem sido o nosso esforço”.

Conhecido como um dos maiores empresários em Angola, com negócios em vários sectores económicos, Valdomiro Dondo é apontado em vários círculos como tendo relações de proximidade com vários dirigentes do Governo angolano.

Segundo o empresário, em nenhum dos seus negócios teve apoio directo do antigo Presidente, dando o exemplo do Luanda Medical Center (LMC), um centro médico privado, cujo edifício, em 2020, a Procuradoria-Geral da República anunciou a sua recuperação no âmbito de um processo de investigação patrimonial.

“De concreto, eu até gostaria que me apontassem um negócio em que eu tive favorecimento, que não tenha sido através de concurso, que não tenha sido aprovado pelo Tribunal de Contas, isso é especulação e não existe”, refere.

Em Março do ano passado, o site de investigação Maka Angola, do jornalista Rafael Marques divulgou uma matéria na qual questionava a legalidade dos negócios entre Valdomiro Dondo e o Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), que entre 2004 e 2018 terá monopolizado contratos de cerca de dois mil milhões de dólares (1,6 mil milhões de euros).

Entre os negócios com o INSS está incluída a construção do LMC, negócio sobre o qual Valdomiro Dondo diz que a sua participação, de 10%, foi através de um investimento privado.

“Tive a oportunidade de comprovar às autoridades que os recursos do meu investimento foram aportados e a minha participação no empreendimento é como empresário privado e sou minoritário, sou um accionista minoritário do empreendimento”, frisou.

Quanto à apropriação do edifício pelas autoridades angolanas, o empresário disse desconhecer as razões que levaram o Governo a tomar essa decisão. Garantindo que não é alvo de qualquer processo na Justiça angolana, o empresário diz que “isso não posso julgar, quais foram as razões que levaram o Governo a tomar essa decisão, mas o que estamos a faze e pleiteando é para que a nossa participação de empresário seja mantida”.

Sobre o combate à corrupção em Angola, compromisso eleitoral de 2017 de João Lourenço, que vem sendo levado a cabo pelas autoridades do país, Valdomiro Dondo considera que tem contribuído muito para a melhoria do ambiente de negócios.

“Nós empresários obviamente preferimos trabalhar, investir, num bom ambiente de negócios. Isso facilita o desenvolvimento de parcerias, de obtenção de financiamentos. Nestes últimos três anos temos constatado uma forma bastante satisfatória e um bom ambiente de desenvolvimento de negócios”, realçou Valdomiro Dondo.

Por outro lado, Valdomiro Minoru Dondo defende um maior incentivo do governo brasileiro para que os brasileiros invistam em Angola e quebrem o ritmo de decréscimo das relações comerciais verificados nos últimos anos.

“Nós fazemos muito esforço para trazer colegas para cá”, disse Valdomiro Dondo, manifestando o seu interesse no segmento da agro-indústria em parceria com empresários brasileiros que “têm tecnologia, ‘know-how'”, lembrando que a similaridade de produtos agro-pecuários que se produzem no Brasil podem ser produzidos também em Angola.

“Nós vemos que falta contrapartida de sensibilização do governo brasileiro junto do empresariado. O exemplo é que hoje o transporte marítimo Brasil/Angola praticamente não existe, a ligação aérea está suspensa, então isso torna muito difícil”, realçou.

Valdomiro Dondo começou a sua actividade empresarial em Angola na década de 1980 com o comércio de alimentos exportados do Brasil, expandindo mais tarde os seus negócios para outros sectores, sendo hoje detentor de mais de 20 empresas, nos segmentos dos transportes, banca, saúde, imobiliário, tecnologias de informação, mineração, restauração, bebidas e agricultura.

O empresário afirma ter investido em Angola acima de 500 milhões de dólares (420 milhões de euros), mas reconhece que a “realidade actual está bem diferente do que era há dois anos”.

Valdomiro Minoru Dondo diz que “a economia decresceu um pouco com a pandemia”, o que levou a uma redução de pelo menos 2.000 postos de trabalho dos 5.000 que conseguiu criar com os seus negócios.

Valdomiro Minoru Dondo, considerado um dos empresários mais bem-sucedido em Angola, disse que a Macon, empresa de transporte urbano, interprovincial e internacional, é bem o exemplo dos constrangimentos causados pela pandemia da Covid-19.

Segundo o empresário, a Macon, em 2020, devido à restrição da operação interprovincial, ficou limitada ao transporte urbano e teve resultados negativos, com uma perda no volume de negócios de 60%.

“Neste momento, aguardamos com uma certa esperança a reabertura do transporte para as províncias e estamos esperançosos que a nossa actividade, em alguns meses, volte à normalidade”, frisou.

O empresário referiu que houve necessidade de reduzir trabalhadores, mas a política é “demitir o mínimo possível”, informando que foram igualmente suspensos contratos com alguns dos seus quadros.

“O impacto não foi muito grande, porque o custo para nós treinarmos a mão-de-obra, motoristas, mecânicos, é muito alto e estamos resistindo para demitir o mínimo possível”, explicou.

As operações a nível internacional, para as vizinhas Namíbia e República Democrática do Congo, também nesses mercados a Covid-19 teve o seu impacto no negócio, sublinhando que até então a operação se encontrava em fase de crescimento, mantendo fé que a empresa voltará a crescer.

Outro grande investimento afectado pela crise económica angolana é o centro comercial Kinaxixi, obra imponente iniciada em 2008 e ainda em fase de construção.

Segundo Valdomiro Minoru Dondo, o cronograma foi alterado: “Um centro comercial como é o Kinaxixi, que é um conceito moderno de morar, trabalhar e lazer, é uma construção que quando estiver terminado vai ter mais de 180 mil metros quadrados de área construída”.

A âncora do projecto “é o centro comercial, mas com essa queda da demanda e da economia, nós redimensionamos o término da construção, para daqui a dois anos”, referiu.

Para Valdomiro Minoru Dondo, Angola tem vocação natural para muitos segmentos, principalmente na agricultura e exploração da mineração, algumas das últimas apostas de investimentos que fez.

“Para agricultura nós temos sol, terra e água, para a mineração temos todas as riquezas de muitos minerais para serem explorados. Então, riqueza nós temos”, destacou.

No que se refere à exploração mineira, há três anos a Sociedade de Mineração de Buco Zau e Lufo iniciou a pesquisa de ouro na província de Cabinda, no norte de Angola, onde obteve duas concessões, uma das quais já saiu da fase de prospecção e deverá até ao final do ano entrar na fase de produção.

De acordo com Valdomiro Minoru Dondo, são minas com um grande potencial e de reserva, estando atento a outras oportunidades que possam surgir nesse segmento.

“Na agricultura, estamos em fase de pesquisa e de produção de feijão e milho na província do Cuando Cubango”, disse, garantindo que não tem faltado apoio governamental a essas iniciativas.

A aposta do Governo angolano em diversificar a economia e deixar de importar para ser produtor “é certa”, considerou o empresário, reconhecendo que “muita coisa já está a ser produzida no país”.

Sobre o que tem dificultado um avanço maior no alcance desse objectivo do Governo, o empresário, que reside em Luanda e em 2002 obteve a nacionalidade angolana, disse que tem faltado projectos e investidores.

“Investidores, na prática, não faltam, temos entidades como a Deutsche Bank, a própria entidade de fomento do Governo americano, a Develop Finance Corporation (DFC), tem financiado e aportado investimentos em grandes projectos aqui em Angola, o que falta é iniciativa de empresários para irem atrás dessas oportunidades de financiamento”, considerou.

O empresário reiterou que falta iniciativa, bons projectos, que são exigidos quando se recorre a essas entidades.

“Tem que apresentar projectos bem elaborados e bem feitos, mas ultimamente já tem aparecido projectos, a nossa empresa tem submetido projectos a busca dessas oportunidades de financiamentos”, disse.

Folha 8 com Lusa

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