Para sermos um país… (só) falta quase para pouco

Angola emitiu, nos últimos dois anos, 1,7 milhões de bilhetes de identidade e atribuiu 3,2 milhões de registos de nascimento, informou hoje o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz. Quanto não vale sermos um país independente, há 45 anos nas mãos (nos bolsos e nos paraísos fiscais) do MPLA?

Francisco Queiroz considerou que “está a correr bem” o “Programa de Massificação do Registo de Nacimento e Atribuição do Bilhete de Identidade” iniciado em 2019.

Segundo o ministro, os resultados alcançados até à data para o registo de nascimento representam 36% das metas definidas para o programa, enquanto para o bilhete de identidade 27%.

O ministro frisou que o programa previa registar 6.044.225 cidadãos e emitir 4.232.814 bilhetes de identidade, o que significa que se está a 54% e 40%, respectivamente, da meta.

“Assim desde o início do programa, em Novembro de 2019 até Maio deste ano foram efectuados 3.288.285 registos de nascimento e atribuídos pela primeira vez 1.710.688 bilhetes de identidade”, disse Francisco Queiroz.

O governante revelou que estão por registar 5.826.788 cidadãos e por identificar, pela primeira vez, 4.562.274 cidadãos.

Numa visita de constatação, entre Abril e Maio, da coordenação técnica do programa, a alguns municípios das províncias do Huambo, Cuando Cubango, Bié, Huíla, Cunene, Namibe, Benguela e Cuanza Sul, foram verificadas algumas irregularidades na emissão de registo de nascimento e bilhetes de identidade.

O titular da pasta da Justiça e dos Direitos Humanos sublinhou que o programa está a correr bem, “apesar de algumas falhas no processo e de alguns constrangimentos conjunturais, que comprometeram, de certo modo, melhores resultados face às metas em mente”.

“Mas se fizermos a avaliação em comparação com outros resultados obtidos noutros programas e até durante a legislatura anterior concluiremos que este programa está a correr muito bem”, afirmou.

De acordo com o ministro, continua a haver preocupações relativamente aos furtos de equipamentos, concluindo-se que este trabalho tem que ser feito em cooperação com as outras instituições que concorrem para a segurança e ordem interna.

Uma das recomendações do encontro, vai no sentido de se reforçar o capital humano (brigadistas), pontualidade no subsídio aos brigadistas, aquisição de meios como viaturas, motos e bicicletas, também material publicitário para mobilizar os cidadãos para procurarem os serviços de identificação e atribuição do bilhete de identidade.

O programa tem um orçamento de 8,1 mil milhões de kwanzas, para despesas operacionais, pagamento de brigadistas e aquisição de viaturas.

O ministro sublinhou que apesar da execução financeira ter corrido de acordo com o que estava previsto as províncias da Huíla, Huambo, Bié, Cuando Cubango, Cunene, Malanje, Uíje a Zaire estão “muito abaixo” do esperado em termos de execução física.

Já as províncias de Benguela, com 75%, Luanda, com 52%, e Cuanza Sul, com 52%, estão com bom nível de execução do programa.

Não chega ter cartão do MPLA?

Quarenta e cinco anos depois da independência (sempre com o mesmo partido no governo, o MPLA), os cidadãos angolanos detentores apenas do cartão de eleitor, emitido no registo eleitoral de 2017, como documento de identificação, poderão ter acesso ao bilhete de identidade, saindo da condição de apátridas. É obra!

A medida consta da proposta de alteração do Regime Jurídico da Identificação Civil e Emissão do Bilhete de Identidade de Cidadão Nacional, aprovada em Agosto de 2020, na generalidade, na Assembleia Nacional, com 133 votos a favor, 41 contra e oito abstenções.

O documento passou com votos a favor do MPLA, votos contra da UNITA, da CASA-CE, do PRS e da FNLA e abstenção de deputados não integrados em grupo parlamentar.

O secretário de Estado da Justiça, Orlando Fernandes, sublinhou na altura a convergência na necessidade de se resolver o problema dos quatro milhões de cidadãos angolanos que possuem cartão de eleitor (esse sim vital) sem bilhete de identidade.

Orlando Fernandes, que respondia às várias preocupações, receios e riscos levantados pelos deputados na discussão da lei, nomeadamente a alegada obtenção de forma fraudulenta dos cartões de eleitor, disse que não seria proporcional nem justo que se mantenham estes milhões afastados da cidadania.

“São pessoas que vivem na sua pátria, numa verdadeira condição de apátridas, são pessoas que efectivamente serviram para votar, mas não conseguem exercitar os demais direitos e deveres que resultam da cidadania”, frisou.

O governante do MPLA considerou justos os receios, salientando que “este é um processo que naturalmente terá os seus riscos, mas que serão residuais”.

O secretário da Justiça frisou que os riscos estão ponderados, acautelados, lembrando que um processo similar foi praticado em 1975, com os combatentes que actuaram na luta de libertação. “Não traziam bilhete, registo civil e houve que resolver este problema. Em 2002, com a paz alcançada, também teve de se resolver este problema, portanto, existe algum ‘know-how’ neste domínio”, garantiu.

Orlando Fernandes reafirmou que a intenção é dar a nacionalidade aos angolanos e não aos estrangeiros, como receiam os deputados, tendo em conta a suposta atribuição de cartões eleitorais em 2017 a cidadãos estrangeiros.

A proposta de lei prevê que os cidadãos portadores dos cartões de eleitor, emitidos à luz da Lei do Registo Eleitoral Oficioso, de 2017, excepcionalmente atribuído mesmo sem o bilhete de identidade ou o assento de nascimento, bastando a apresentação de documentos, como fotografia, a assinatura ou impressão digital ou ainda mediante prova testemunhal, possam fazer o pedido de emissão do bilhete de identidade, desde que seja o primeiro e que o requerente não tenha qualquer outro documento exigido por lei para a emissão daquele documento.

Independentemente da apresentação do cartão de eleitor, os serviços competentes para a emissão do Bilhete de Identidade devem confirmar sempre os dados do cartão de eleitor apresentado pelo requerente, na base de dados de cidadão maior, de forma a serem evitadas fraudes.

De acordo com o governante, a base de dados de cidadão maior e a base de dados do Bilhete de Identidade estão já em interoperabilidade.

Quando a proposta de lei entrar em vigor, o pedido de emissão do Bilhete de Identidade é instruído mediante a apresentação da certidão narrativa completa, do assento ou cópia integral do assento de nascimento, da certidão de baptismo, desde que essa tenha ocorrido antes de 1 de Julho de 1963, ou ainda do cartão de eleitor, emitido até 31 de Março de 2017, nos casos em que o cidadão não possua qualquer outro dos documentos referidos.

Registo de Nascimento. Bilhete de Identidade. O que é isso?

Pelo menos 14 milhões de angolanos não possuem registo de nascimento e Bilhete de Identidade, divulgou em 23 de Maio de 2019 o secretário de Estado da Justiça, embora garantindo que um “novo paradigma estava em curso” para inverter esta realidade.

(Para ser militante do MPLA, como é óbvio, não é preciso ter nenhum desses registos.
Nem mesmo para votar… desde que seja no MPLA.)

“Em matéria de registo civil, encontramo-nos, efectivamente, numa situação muito difícil. De todas as áreas que o Ministério da Justiça tem sob sua tutela, a área dos registos, como o predial, civil, comercial, automóvel, é a mais problemática”, disse Orlando Fernandes.

“Mas dentro dessas áreas, a que apresenta mais dificuldades é a área do registo civil. Pela avaliação que fizemos temos muitos milhões de angolanos sem o bilhete de identidade, cerca de 14 milhões, porque para se ter o bilhete de identidade é preciso ter o registo civil primeiro”, acrescentou.

Angola conta actualmente com cerca de 30 milhões de habitantes, dos quais sete milhões residem em Luanda.

Em declarações aos jornalistas à margem de um encontro sobre “Conhecimento, Partilha de Experiências e de Boas Práticas sobre a Prevenção e Luta contra à Corrupção, Branqueamento de Capitais e Crime Organizado”, o governante assegurou que “várias acções decorrem para inverter a actual situação” que, acrescentamos nós, não foi possível ao governo do MPLA (o único que o país conheceu) resolver nos 45 anos de independência e nos 18 de paz total.

“Substituímos a empresa consultora que ao longo dos últimos dez anos trabalhou connosco, portanto, tratamos de desenhar um novo paradigma que vai ser prosseguido por uma nova consultora que entre em cena nos próximos dias”, assegurou.

Segundo o governante, “existe vontade política” para se registar, até 2020, todos os cidadãos sem registos, um processo, salientou, em que “teremos que mobilizar vários sectores do Estado”. Não se sabe, contudo, se o “sector” da competência entra nestas contas.

“Com essas medidas, e outras mais que estão a ser ensaiadas, pretendemos trazer para a cidadania esses 14 milhões de angolanos sem registos”, adiantou.

Orlando Fernandes deu conta também que dos 14 milhões de angolanos sem registos, quatro milhões não possuem o cartão de eleitor considerando uma “situação flagrante”, porque “não conseguem exercer outros direitos de cidadania”. Isto só é verdade se, a par do cartão de eleitor, não tiverem um cartão do MPLA.

“Em relação a esses cidadãos e há orientações claras nesse sentido, que são aproximadamente, quatro milhões, vamos tratar de, com base no cartão de eleitor, gerar o assento de nascimento e, consequentemente, atribuir-lhes o bilhete de identidade”, disse.

“Se considerarmos que em cada núcleo familiar há cinco filhos, se multiplicarmos esses dois milhões de casais teremos quatro milhões de cidadãos e com isso cerca de 12 milhões de descendentes sem registos”, assinalou.

Esta realidade não impediu o Governo de fingir que é um Estado de Direito. Recorde-se, por exemplo, que Assembleia Nacional aprovou no dia 28 de Junho de 2017 o diploma legal que iria conferir mais eficiência ao bilhete de identidade, com a introdução de novos dados, como os números de identificação fiscal e de eleitor dos cidadãos.

Trata-se da Proposta de Lei de Alteração sobre o Regime Jurídico de Identificação Civil e Emissão do Bilhete de Identidade de Cidadão Nacional aprovada por unanimidade.

Em declarações à imprensa, no final da sessão, o então ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Rui Mangueira, disse que o projecto foi concebido em 2016 para a implementação de uma nova plataforma tecnológica, para garantir algumas funcionalidades, que permitirão da mais eficiência ao bilhete de identidade.

Segundo Rui Mangueira, as vantagens do projecto eram a substituição da banda óptica por um microprocessador, que terá a capacidade de armazenar muitos mais dados.

O governante avançou que desse modo poderão ser incluídos elementos não visíveis, que irão facilitar a vida do cidadão, como a substituição de um conjunto de cartões que era obrigado a usar.

No novo bilhete estarão incorporados e armazenados os números de Identificação Fiscal, de eleitor, do registo de nascimento e da segurança social.

“Isto vai depender de um projecto mais alargado que o Estado poderá desenvolver no sentido de, por via de um regime de interoperabilidade, permitir a comunicação destes dados e os cidadãos não necessitarem de ter vários cartões, estando todos acoplados em apenas um”, reforçou.

O então ministro destacou ainda a “redução substancial” que se vai verificar com projectos sobre esta matéria, salientando ainda a durabilidade mínima de dez anos dos novos cartões, que podem chegar até 20 anos.

“O projecto está planificado para um período de dois anos, implementação efectiva, e mais cinco anos de curso de vida durante esse período, visando essencialmente obter, com o contacto com outros projectos, a redução muito maior dos custos. É um projecto com custos de 234 milhões de dólares (208 milhões de euros)”, disse.

Além dos elementos visíveis no novo bilhete de identidade, a lei fixou também outros que poderão ser não visíveis, poderão ser introduzidos no cartão a partir do momento em que as condições tecnológicas sejam concluídas.

“O novo projecto é muito abrangente e visa também, em primeiro lugar, resolver o problema do registo de nascimento e do registo de óbitos e ao mesmo tempo também se refere ao registo criminal”, disse.

Folha 8 com Lusa

Artigos Relacionados

Leave a Comment