China “ameaça” fechar a torneira

O Governo angolano estendeu a mão (e as riquezas qua ainda são nacionais) à China para pedir assistência técnica na elaboração de projectos sustentáveis e assim poder candidatar-se aos financiamentos, quer do Governo, quer dos potenciais investidores chineses interessados no desenvolvimento de Angola.

A solicitação foi feita pela secretária de Estado para as Relações Exteriores angolana, Esmeralda Mendonça, na abertura do Fórum de Negócios Angola-China no domínio da Agricultura e Pescas, realizado por videoconferência.

Esmeralda Mendonça frisou que as potencialidades industriais, agrícolas e tecnológicas fazem da China um dos maiores parceiros estratégicos do continente africano, cujas economias necessitam, e uma alavanca para o desenvolvimento cada vez mais sustentável.

Segundo Esmeralda Mendonça, a China tem sabido responder satisfatoriamente aos anseios dos Governos dos países africanos, em troca de uma cooperação mutuamente vantajosa, cujos efeitos têm vindo a reflectir-se no seio das suas populações. Por outras palavras, os africanos entram com as riquezas e os chineses com a experiência. No fim, os africanos ficam com a experiência e os chineses com as riquezas. Fácil!

“No nosso caso em particular, esta relação está alicerçada na parceria estratégica estabelecida através da assinatura de instrumentos jurídicos”, referiu a governante angolana, sublinhando que os projectos apresentados irão contribuir de forma significativa para o êxito das estratégias traçadas pelo Governo angolano, no âmbito da diversificação da sua economia e aumentar o tecido empresarial do sector mais importante para o desenvolvimento da sociedade angolana.

Por sua vez, o secretário de Estado para Agricultura e Pecuária angolano, João Cunha, destacou que as relações entre os dois países datam de 1983, altura em que foi rubricado o Processo Verbal de Conversações entre as delegações comerciais de ambos os países.

Nos últimos anos, prosseguiu, foi registado um crescimento da cooperação entre os dois países, no domínio da agricultura e pescas, e com a nova dinâmica que Angola tem vindo a aplicar pode consolidar e desenvolver parcerias mutuamente vantajosas através do reforço de intercâmbio do conhecimento nas diferentes áreas, como a formação, pesquisa e investimento privado.

“No âmbito da cooperação actual com a China existem no sector iniciativas de sucesso, nas áreas da investigação agronómica, com o Centro de Demonstração de Tecnologias Agrícolas de Masoso, o cultivo da amoreira para a produção de seda, actualmente em fase de estudo, horticultura, fruticultura e pesca (…) e estamos cientes de que, com investidores interessados no sector, poderemos multiplicar os resultados actuais, tendo em conta as estratégias do executivo”, disse.

Recorde-se que os chineses, como os portugueses e ao contrário dos técnicos do MPLA, plantam as couves com a raiz para baixo. Como os dirigentes do MPLA têm um atávico complexo de inferioridade em relação aos portugueses, nunca aceitaram os seus ensinamentos. Agora, embora sejam os mesmos mas com origem em Pequim, talvez aceitem…

João Cunha indicou as áreas de oportunidade de negócio em Angola no sector da agricultura, nomeadamente o da produção vegetal, em que manifestou “bastante interesse” de Angola para captação de investimento privado chinês, a investigação e produção de arroz, milho, soja, avicultura, óleo de palma, bem como a aquicultura.

“O nosso convite vai também para o investimento privado directo, não estamos a referir-nos apenas ao investimento privado em que há parcerias com angolanos, mas estamos disponíveis e abertos para que os empresários chineses possam, de forma individual, investirem no sector da agricultura, com ou sem parcerias directas com os empresários angolanos”, frisou.

O governante do MPLA sublinhou ainda a abertura da parte angolana para que o resultado da produção chinesa “possa ser exportada directamente para a China, ou o mercado que entenderem, ou então comercializada no mercado nacional”.

Entretanto, segundo uma análise do “The Africa Report”, Angola pode ser forçada a uma reestruturação da dívida em 2021, dado que as reservas em moeda estrangeira do país diminuem dramaticamente.

A China está relutante em amortizar os empréstimos a Angola, mas percebe que as suas opções estão a diminuir, diz Mark Bohlund, analista sénior de investigação da Redd Intelligence em Londres. “Deixar para depois aumentará o tamanho do corte de cabelo” que a China terá de fazer, diz ele.

Há poucos sinais de que o presidente João Lourenço será capaz de colocar as finanças do país em bases sustentáveis. O orçamento aprovado pelo parlamento em Dezembro projecta que os gastos do governo em 2021 aumentarão em cerca de 20%. E diversificar a economia angolana longe da dependência do petróleo, se é que alguma vez poderá ser feito, será um processo a longo prazo.

A Redd Intelligence estima que cerca de três quartos da dívida de US $ 20 biliões de Angola com a China no final de 2019 era devida ao Banco de Desenvolvimento da China (CDB). Por insistência de Pequim, o CDB ainda é classificado como credor comercial, e não bilateral. Bohlund vê isso como uma posição “insustentável” que a China terá que mudar.

As reservas de moeda estrangeira de Angola caíram para menos de US $ 10 biliões em 2020, de um pico de US $ 34 biliões em Abril de 2013. A continuação dessa tendência deve levar a posição da China a mudar de diferimentos de dívida para uma aceitação da necessidade de reestruturação, diz Bohlund. “É cada vez mais provável que a reestruturação da dívida aconteça este ano.”

O Clube de credores de Paris concordou em 7 de Janeiro em estender o alívio do serviço da dívida de Angola para cobrir o primeiro semestre deste ano. Essa etapa gradativa nada mais é do que varrer o problema para debaixo do tapete.

Permitir que os pagamentos aos credores comerciais continuem, com um credor privado registado no Reino Unido programado para receber US $ 1,1 bilião em Fevereiro , significará que as reservas monetárias de Angola continuarão a cair, diz Bohlund.

Após o fim da longa guerra civil do país em 2002, a relutância dos angolanos em aceitar as condições associadas ao financiamento ocidental levou ao afluxo de empréstimos chineses. Foi um salto da frigideira para o fogo, com o país obrigado a vender mais petróleo, o seu principal activo, quando o preço estava a cair.

O governo angolano consegue linhas de crédito chinesas apoiadas por garantias petrolíferas para financiar investimentos. Isso não significa que Angola tenha dinheiro nas mãos: os recursos são usados para empresas públicas chinesas no desenvolvimento de projectos de infra-estrutura e industriais.

Uma pesquisa liderada por Liviu Stelian Begu , da Universidade de Estudos Económicos de Bucareste, calcula que desde 2010, quase metade do petróleo exportado por Angola foi para a China. Como os reembolsos dos empréstimos chineses são baseados no preço do petróleo na altura do acordo, Angola tem de exportar mais para a China quando o seu valor diminui, escreve Begu.

Angola nem sequer beneficia em termos de emprego, já que as construtoras chinesas constroem projectos de infra-estrutura principalmente com seus próprios empregados.

Os credores comerciais provavelmente resistirão à reestruturação, na esperança de uma recuperação do preço do petróleo pós-Covid e com a retoma da exploração.

De acordo com Gerrit van Rooyen da NKC Africa Economics na África do Sul, insuficientes novos projectos de petróleo estão a ser desenvolvidos para substituir os poços de petróleo em esgotamento de Angola.

A NKC estima que a produção nacional de petróleo caiu de 1,39 milhões de baris por dia em 2019 para 1,30 milhões em 2020.

Angola tem projectos de petróleo offshore e em águas profundas que podem ser desenvolvidos, mas serão mais difíceis de executar se os preços do petróleo permanecerem baixos. O problema é que o petróleo mais barato faria com que Angola precisasse vender mais para a China apenas para ficar… estagnada.

Folha 8 com The Africa Report

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