Cheque na mão mataco no chão

O Presidente João Lourenço assinou um acordo entre Angola e um consórcio de bancos no valor de 910 milhões de dólares (751,4 milhões de euros) para financiar o projecto de abastecimento de água do Bita, em Luanda. Também determinou que as participações sociais detidas pelas extintas empresas públicas BOLAMA e CERVAL “passam para a titularidade do Estado”. A isso junta que a aprovação da quinta revisão do Programa de Financiamento Ampliado do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostra a “confiança da comunidade financeira internacional”. É para rir ou chorar?

O Despacho Presidencial nº 90/21, de 11 de Junho, refere que fazem parte do consórcio de bancos o Standard Chartered Bank (Hong-Kong) Limited, na qualidade de líder e agente, e o BNB Paribas — Credit Agricole Corporative and Investiment Bank, entre outras instituições financeiras que subscreveram os termos do acordo.

Este financiamento é coberto de uma garantia do Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) ao valor global de 500 milhões de dólares (412,8 milhões de euros).

O documento, que revoga o Decreto Presidencial 82/20, de 8 de Junho, autoriza a ministra das Finanças a assinar os acordos em nome de Angola.

O Projecto de Abastecimento de Água do Bita, a ser implementado no município de Belas, em Luanda, está avaliado em mais de um milhão de dólares, prevendo beneficiar mais de um milhão de pessoas, com a captação de água do rio Kwanza e a construção de uma conduta com seis quilómetros de extensão.

Em 16 de Julho de 2019, o então ministro das Finanças, Acher Mangueira, falava em 500 milhões de dólares para o Projecto de Água do Bita, financiado pelo Banco Mundial, vocacionado para o fornecimento de água potável à população da zona sul de Luanda, mais concretamente do Camama, Benfica I e II, Cabolombo e Rocha Pinto.

De acordo com o ministro, o financiamento pelo BM deste sistema de captação, de tratamento e distribuição de água, iria contribuir substancialmente para melhorar a qualidade de vida destas populações.

“O projecto Bita é consistente com os princípios de maximização de financiamento ao desenvolvimento, visando como fim único atrair a participação do sector privado”, frisou Archer Mangueia.

Noutra frente, João Lourenço, determinou que as participações sociais detidas pelas extintas empresas públicas BOLAMA e CERVAL “passam para a titularidade do Estado”, cabendo ao Ministério das Finanças o exercício da função de accionista.

Segundo o despacho presidencial n.º 94/21 de 11 de Junho, o destino das participações das extintas Empresa Regional de Massa e Bolacha (BOLAMA) e Empresa Nacional de Cervejas (CERVAL) surge no quadro da privatização do Banco de Comércio e Indústria (BCI).

O diploma legal, assinado por João Lourenço, refere que o decreto executivo conjunto que determinou a extinção da CERVAL não fez a indicação dos bens e direitos que o Estado pretende preservar para si.

A especificação sobre as referidas participações sociais surge igualmente, refere o despacho presidencial, pela “necessidade de se liquidar os activos integrantes da massa patrimonial” da extinta BOLAMA.

E da necessidade, sublinha-se no documento, de se “fazer a indicação do destino das participações sociais detidas pelas extintas empresas públicas no BCI”, banco angolano de capitais públicos, cujo processo de privatização em bolsa está em curso.

Já num outro despacho, o Presidente de Angola autoriza a privatização, mediante concurso público, de 16 unidades industriais localizadas na Zona Económica Especial (ZEE) Luanda-Bengo, integradas no Programa de Privatizações (ProPriv).

Estão agora na rota das privatizações as empresas AngolaCabos (Indústria de Cabos de Fibra Ótica), ANGTOR (Indústria de Torneiras), INFER (Indústria de Puxadores, Dobradiças, Fechaduras e Cilindros), INDUGALV (Cromagem, Niquelagem e Zincagem), BOMBAGUA (Bombas de Água para a Irrigação), INDUPLASTIC (Indústria de Produtos Plásticos Sanitários/Domésticos).

A INDUMASSAS (Indústria de Massas Alimentares), NINHOFLEX (Indústria de Colchões de Espuma, de Molas e Travesseiros), INDUPAME (Indústria de Naves Industriais em Estrutura Metálica), BTMT (Indústria de Quadros Eléctricos), BETONAR (Indústria de Pré-Fabricados, Pré-Esforçados e Artefactos de Betão), INDUCABOS (Indústria de Cabos Eléctricos de Baixa e Média Tensão) serão igualmente privatizadas.

Constam ainda da lista das unidades industriais da ZEE a serem privatizadas, as empresas MATEELETRICA (Indústria de Interruptores, Tomadas, Caixa de Derivação e de Aparelhagem), INDULOUÇAS (Indústria de Sanita Convencional), INDUTUBOS (Indústria de Tubos e Acessórios) e a FUNDINAR (Fundição de Ligas Metálicas).

Esta é a terceira fase de privatizações das unidades industriais de ZEE, segundo anunciou, recentemente, o presidente do Conselho de Administração do Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), Patrício Vilar.

O programa do Governo ProPriv prevê a privatização de mais de 190 empresas e/ou activos do Estado angolano até 2022 nos sectores da banca, hotelaria e turismo, finanças, seguros, agricultura, telecomunicações, indústrias, petróleos, entre outros.

Ficou também a saber-se que o Governo vai abrir um concurso público para gestão da rede de hipermercados e supermercados Kero, cujo capital social é detido em 90% pelo Estado, refere um despacho presidencial hoje tornado público.

A cadeia de retalho era detida pelos generais Hélder Vieira Dias ‘Kopelipa’ e Leopoldino Fragoso do Nascimento ‘Dino’, elementos da Presidência da República, ao tempo do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, do ex-vice-Presidente Manuel Vicente e do ministro da Defesa, general João Lourenço.

O Despacho Presidencial 89/21, de 11 de Junho, publicado em Diário da República, refere que o concurso é aberto considerando que o Estado angolano passou a deter 90% do capital social do Grupo Zahara Comércio S.A., que deste modo passou a integrar o sector empresarial público, como empresa de domínio público.

Nesse sentido, o Presidente aprovou a cessão do direito de gestão da rede de hiper e supermercados Kero, delegando nos ministros das Finanças e Indústria e Comércio a condução e verificação da legalidade de todos os actos inerentes ao procedimento do concurso público.

Em Outubro de 2020, a Procuradoria-Geral da República anunciou que depois de constituídos arguidos, os generais procederam à entrega ao Estado de vários activos, entre os quais a cadeia de retalho Kero.

Aproveitando o balanço, quase parecendo um corredor de fundo e não o que tem sido até agora, um corredor que está no fundo do corredor, o Governo considerou que a aprovação da quinta revisão do Programa de Financiamento Ampliado do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostra a “confiança da comunidade financeira internacional” nas reformas em curso no país.

“A aprovação da quinta revisão do Programa de Financiamento Ampliado apresenta-se como mais um dado muito relevante a registar no âmbito dos progressos que temos feito na gestão da economia do país e que demonstra a confiança da comunidade financeira internacional no programa de reformas que o executivo tem estado a desenvolver desde finais de 2017”, lê-se numa nota de imprensa divulgada em Luanda.

Na quarta-feira, o FMI aprovou a quinta revisão ao programa de ajustamento financeiro de Angola, permitindo o desembolso imediato de 772 milhões de dólares (633 milhões de euros), salientando a visão positiva das autoridades e o empenho nas políticas do programa.

“A decisão do conselho de administração do FMI permite um desembolso imediato de 772 milhões de dólares a Angola”, lê-se no comunicado do FMI, no qual se aponta que a economia angolana “está em transição para uma recuperação gradual de múltiplos choques, incluindo aqueles induzidos pela pandemia de Covid-19”.

No comunicado, o FMI acrescenta que “a visão política das autoridades continua sã, e continuam empenhados no programa económico apoiado pelo Programa de Financiamento Ampliado”.

Nesta avaliação, diz o Governo, “uma vez mais, o Conselho de Administração do FMI elogiou o executivo angolano pela sua forte resposta aos choques negativos causados pela covid-19 na economia e na população angolana, e em particular enalteceu o ajustamento fiscal prudente levado a cabo pelo executivo angolano em 2020 que envolveu ganhos no que respeita as receitas fiscais não petrolíferas e a diminuição de despesas não essenciais, ao mesmo tempo que preservou os gastos em despesas essenciais como a saúde, a educação e outros domínios do sector social”.

No comunicado de reacção à aprovação que permite a disponibilização imediata de 772 milhões de dólares, o gabinete da ministra das Finanças vinca que “o FMI faz notar que a economia angolana está no caminho certo para obter os mesmos ou melhores resultados fiscais em 2021” e destaca os “êxitos na reformulação do perfil do serviço da dívida pública de Angola”.

O Governo, conclui o comunicado, “reafirma o seu engajamento em aprofundar as reformas estruturais em curso no país, com o objectivo de restaurar os indicadores de sustentabilidade orçamental, melhorar a governação e acelerar o processo de diversificação da economia, de modo a atender as necessidades prementes da nossa população e mitigar os impactos de eventuais choques externos”.

O programa de ajustamento financeiro foi acertado com o FMI em Dezembro de 2018, num valor de 3,7 mil milhões de dólares, que foi em Setembro aumentado para cerca de 4,5 mil milhões de dólares (de 3 mil milhões de euros para 3,7 mil milhões de euros), dos quais cerca de 3 mil milhões de dólares (2,5 mil milhões de euros) já foram entregues, a que se junta o valor agora anunciado, totalizando 3,9 mil milhões de dólares (3,2 mil milhões de euros), e dura até final deste ano.

Folha 8 com Lusa

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