A(PRO)FUNDAR A DEMOCRACIA

O parlamento angolano aprovou hoje na globalidade, em segunda deliberação, o projecto de lei que altera a Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais, apenas com votos favoráveis do MPLA (partido no Poder há 46 anos).

O diploma legal passou hoje com 127 votos a favor, 47 contra e nenhuma abstenção durante a primeira reunião plenária ordinária da quinta sessão legislativa da quarta legislatura da Assembleia Nacional.

Para o deputado do MPLA, António Paulo, a aprovação da lei “demonstra que a classe política está comprometida” em aprofundar o Estado democrático e de direito, afirmando, no entanto, que o caminho a percorrer “ainda é longo”.

Por outras palavras, para António Paulo, se a aprovação foi só feita pelo MPLA e “demonstra que a classe política está comprometida” em aprofundar a democracia… essa tal classe política que quer aprofundar a democracia é apenas a do MPLA.

A UNITA votou contra o projecto de lei por considerar que o mesmo “apesar de incluir, de modo desvirtuado, uma proposta inicial” apresentada pelo maior partido da oposição, “não impede que fundos públicos sejam utilizados para fins eleitorais”.

E, já agora, quem está em condições (como sempre) de utilizar os fundos públicos para fins eleitorais?

“De igual modo votamos contra porque a alteração não foi no sentido de permitir o controlo biométrico dos eleitores, para assegurar a certificação, integridade, transparência e verdade eleitorais”, argumentou Mihaela Weba, deputada da UNITA, na sua declaração de voto.

No circo do MPLA a farra está sempre em alto nível. Desde quando é que o MPLA está interessado na “transparência e verdade eleitorais”? A não ser que se prove que os jacarés já são vegetarianos, para o MPLA transparência é sinónimo de votar no MPLA. Quanto maior for a votação no partido de João Lourenço, mais é o índice de transparência democrática.

Pela Convergência Ampla de Salvação de Angola — Coligação Eleitoral (CASA-CE, oposição), o voto contra foi justificado pelo deputado André Mendes de Carvalho porque o país “perdeu uma oportunidade de ter uma lei de consenso”.

Benedito Daniel, presidente e deputado do Partido de Renovação Social (PRS), reconheceu, na sua intervenção, a boa vontade do Presidente angolano, considerando, no entanto, que a “reapreciação do diploma não foi substancial”. “Não produziu os feitos que os angolanos pretendiam”, afirmou.

Por sua vez o deputado da FNLA, Lucas Ngonda, disse que a lei ora aprovada “não respondeu à expectativa que motivou o seu regresso ao parlamento”.

O projecto de lei que altera a Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais regressou ao parlamento após o Presidente João Lourenço solicitar a reapreciação de algumas das suas normas, nomeadamente as relativas à corrupção eleitoral e sobre a proibição de inaugurações de empreendimentos ou obras públicas em tempo de campanha eleitoral.

Os deputados aprovaram ainda hoje na globalidade a proposta de lei que autoriza o Banco Nacional de Angola e emitir e pôr em circulação a moeda comemorativa alusiva aos 20 anos de paz no país, a proposta de Lei Orgânica dos Tribunais da Relação e a proposta de Lei Orgânica da Organização e Funcionamento do Tribunal Supremo.

Em Setembro, o deputado Mário Pinto de Andrade considerou legítima a decisão do Presidente da República, João Lourenço, ter desautorizado do Presidente do MPLA, João Lourenço, ao ordenar à Assembleia Nacional a reapreciação da Lei de Alteração à Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais e desmentiu qualquer ruptura entre os chefes de posto (Executivo) e os seus sipaios (bancada parlamentar do MPLA).

O funcionário para todos os serviços reagia, em declarações à imprensa, a vozes que insinuavam a existência de ruptura na relação entre o Presidente da República, João Lourenço, e o Presidente do MPLA, João Lourenço, e os sipaios do grupo parlamentar do partido no poder há 46 anos.

O Chefe do Executivo, que por sinal também é João Lourenço, devolveu a Lei de Alteração à Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais à Assembleia Nacional para reapreciação, com objectivo de “reforçar, nalguns domínios, os instrumentos que garantam uma maior igualdade entre os concorrentes, sã concorrência, lisura e verdade eleitoral, no quadro da permanente concretização do Estado democrático de direito”.

Os partidos na oposição tinham instado o Presidente da República a rejeitar a promulgação da referida Lei Orgânica, que consideravam como “lei da fraude e de corrupção eleitoral”, postulado legal, aprovado, na ocasião e tal como agora, apenas com os votos favoráveis dos sipaios do MPLA, no estrito cumprimento das ordens do chefe do posto, João Lourenço.

Para Mário Pinto de Andrade, apesar de não conhecer em concreto as preocupações, o Chefe do Executivo estava a usar prorrogativas constitucionais e os deputados, por sua vez, iriam agir com serenidade, visando promover o mais amplo consenso para a aprovação das leis. Tão amplo que só o MPLA aprovou. Por outras palavras, os deputados do MPLA mostram, mais uma vez, que há muito deixaram de ter coluna vertebral e que a transferência do cérebro para o intestino grosso é mesmo irreversível.

Mário Pinto de Andrade acusou na altura a oposição (com 70 deputados) de pretender impor a sua vontade à maioria (com 150 deputados), sublinhando que o MPLA não abdica dos seus princípios (a não ser que o chefe mande), da sua visão estratégica e do poder soberano que lhe foi conferido nas eleições de 2017 ao “eleger” o Presidente da República como seu cabeça-de-lista e 150 autómatos para o Parlamento.

Mário Pinto de Andrade aconselhou a oposição a negociar mais de modo que a lei reflicta a visão da maioria e da minoria, conciliando interesses lá onde for possível. Amanhã dirá outra coisa, tal como ontem disse outra. Aliás, o chefe do MPLA tem razão quando impede os sipaios de dar palpites, pois sabe que, em função da localização do cérebro, sempre que o fazem sai… porcaria.

A criatura explicou que o MPLA e a oposição (UNITA, CASA-CE, PRS e FNLA) se desentenderam em matérias relacionadas com o apuramento municipal e provincial, que o MPLA acha não fazer sentido por se tratar de eleição nacional. O deputado exemplificou que países como Portugal apenas têm apuramento nacional, sem que se levantem suspeições de fraude. Excelente comparação. Saberá Mário Pinto de Andrade que em Portugal existe eleição nominal do Presidente? Ou é só no que interessa?

Mário Pinto de Andrade, manifestamente atingindo pela alergia endógena nos eunucos, exortou a oposição política a manter a serenidade e a evitar o discurso com acusações de fraude eleitoral, numa altura em que pela primeira vez vão votar cerca de três milhões de cidadãos que nasceram entre 2000 e 2002.

“É importante um discurso de apelo aos angolanos no país e no exterior para que todos tirem o Bilhete de Identidade, actualizem os dados eleitorais para se alcançar a mais ampla representatividade no dia do voto”, afirmou.

Segundo o deputado, o objectivo (tal como, por exemplo, a criação de 500 mil empregos) é para que se realizem eleições livres e justas, com a participação da maior parte dos angolanos e que Angola continue a dar lições ao mundo de realizar boas eleições em que, como tem acontecido, até os mortos podem votar (desde que seja no MPLA) e onde em algumas assembleias de votos aparecem mais boletins nas urnas do que eleitores inscritos.

O também secretário para os assuntos Eleitorais do MPLA sublinhou que o país está no bom caminho, e a democracia parlamentar e política são irreversíveis (desde que seja o MPLA a mandar), apelando para os eleitores actualizarem os seus dados para saberem onde cada um vai votar.

Folha 8 com Lusa

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