Afinal quem deixou os cofres vazios?

O oficial das Forças Armadas de Angola afecto à Casa de Segurança da Presidência da República de Angola, Pedro Lussaty, com a ajuda de outros generais, é dono de 45 imóveis, dos quais uma penthouse em Talatona, cinco apartamentos em Lisboa, um apartamento na Namíbia, dois iates de luxo, tinha em seu poder 19 malas abarrotadas de dólares, euros e kwanzas, duas dezenas de relógios de luxo revestidos de diamantes e ouro rosa e 15 viaturas topo de gama. Afinal quem deixou os cofres vazios?

O ex-Presidente angolano e Presidente Emérito do MPLA, José Eduardo dos Santos, negou no dia 21 de Novembro de 2018, ter deixado a Presidência/Governo/MPLA com os cofres vazios, garantindo que deixou pelo menos 15 mil milhões de dólares ao executivo do seu escolhido, João Lourenço, mostrando que o seu sucessor fazia da mentira uma poderosa arma. Tal como aconselhava Joseph Goebbels.

Foi, é e será caso para perguntar: Afinal quem é o ladrão? João Lourenço já disse que viu roubar, participou nos roubos, beneficiou dos roubos. No entanto, garante que apesar disso tudo não é ladrão… Se esta tese presidencial fizer jurisprudência, lá vamos ver os advogados de Pedro Lussaty e dos restantes impolutos generais do MPLA, escolhidos por João Lourenço para a sua Casa de Segurança, fazer uso dela para justificar que há ladrões bons e ladrões maus.

“Não deixei os cofres do Estado vazios. Em Setembro de 2017, na passagem de testemunho, deixei 15 mil milhões de dólares no Banco Nacional de Angola como reservas internacionais líquidas a cargo do um gestor que era o governador do BNA sob orientação do Governo”, disse José Eduardo dos Santos.

Numa declaração aos jornalistas sem direito a perguntas, na sede da Fundação Eduardo dos Santos, em Luanda, o antigo Presidente afirmou a necessidade de “prestar alguns esclarecimentos” sobre a forma como conduziu a coisa pública durante os 38 anos de Governo.

Numa entrevista ao jornal português Expresso (teve de ser a um órgão estrangeiro porque no país não há… jornais), o Presidente João Lourenço disse que quando assumiu o poder encontrou os cofres vazios ou a serem esvaziados. Seria uma premonição? Estaria já antever o que se ia passar agora? Estarão estes oficiais superiores das FAA ao serviço de José Eduardo dos Santos?

Segundo Eduardo dos Santos, o Orçamento Geral do Estado é aprovado pela Assembleia Nacional e todas as receitas e despesas do Estado devem estar obrigatoriamente inscritas.

“O OGE de 2017 tinha um défice de 6% e a cobertura desse défice era suportada com a venda de títulos do tesouro aos bancos comerciais, dívida que tinha de se pagar mais tarde com juros e o dinheiro depositado no tesouro”, justificou Eduardo dos Santos.

Por sua vez, João Lourenço também criticou a forma como o seu antecessor procedeu na fase de transição do poder, dizendo que não houve uma “verdadeira passagem de pasta”, o que o obrigou, nos primeiros meses no Palácio da Cidade Alta, a um trabalho redobrado para se inteirar da real situação do país. Quase quatro anos depois, continua a ter um trabalho redobrado que, aliás, não lhe permitiu sequer saber o que se passava dentro da sua própria Casa… de Segurança.

“Esperava uma verdadeira passagem de pasta em que me fosse dado a conhecer os grandes dossiês do país e isso, de facto, não aconteceu”, lamentou João Lourenço, que aproveitou ainda para dizer que esse momento de transição foi quando se deu conta da “anormalidade” dos últimos actos do ex-Presidente José Eduardo dos Santos.

“Anormalidade” que, convenientemente, passou ao lado de João Lourenço que, sendo uma virgem inocente, nada notou mesmo sendo ministro da Defesa de Eduardo dos Santos e vice-presidente do MPLA. Quem quiser pode acreditar, obviamente.

João Lourenço também desafiou Eduardo dos Santos a denunciar os corruptos e os traidores da pátria. O Presidente Emérito (do MPLA) estava disposto a fazê-lo, mas não com a metodologia que João Lourenço queria e quer. Tanto quanto é possível saber, Eduardo dos Santos quer apresentar essa longa lista de corruptos, começando pelos que mais responsabilidades políticas e governativas tiveram, o que coloca João Lourenço no pódio, já que foi, para além de ministro, vice-presidente do MPLA.

“Como vocês (Folha 8) escreveram, é claro que João Lourenço apostou tudo em passar a imagem, interna e externamente, de político impoluto, íntegro e honorável que nada tem a ver com traidores ou corruptos”, disse ao F8 , em Novembro de 2018, um dos generais da “velha-guarda” que se mantém fiel a José Eduardo dos Santos.

Um outro incondicional de JES que, aliás, integrou o governo em que João Lourenço foi ministro da Defesa, acredita que “os novos dirigentes do MPLA, assim como os velhos que estão a pôr a barba de molho e a ajoelhar-se perante o novo presidente, vão tentar calar Eduardo dos Santos, evitando que ele revele tudo o que sabe”. Eis se não quando os militares da Casa de Segurança de João Lourenço derrapam e confirmam que o MPLA tem garantido o primeiro ligar no ranking dos partidos com mais ladrões por metro quadrado.

Mas quem são esses “velhos”? “São quase todos os que agora integram o séquito do novo presidente, e que têm (tal como tem João Lourenço) rabos-de-palha que nunca mais acabam”, referia a mesma fonte.

Se dúvidas existissem, analisando as afirmações de João Lourenço confirma-se que ele rasgou o acordo de compromisso negociado com José Eduardo dos Santos. Mas, tal como Folha 8 já revelara em 22 de Novembro de 2017.

Mais do que o conteúdo dos pronunciamentos e das decisões já tomadas, muitos dos dirigentes do MPLA que até eram – embora moderadamente – críticos de JES, contestam a avidez e os “ataques kamikaze” de João Lourenço que relembra uma “tese marxista de que o importante não é a sociedade que se quer construir mas, apenas, a que se quer destruir”.

João Lourenço tem, de facto, demonstrado que quer, pode manda, mesmo que isso mais não seja do que a passagem de um atestado de incompetência ao anterior executivo ao qual, aliás, pertenceu enquanto ministro da Defesa e como alto dirigente do próprio MPLA.

Esta postura de João Lourenço recorda-nos uma história verdadeira, passada em plena ditadura colonial, em que um Chefe de Posto em cada discurso que fazia, rodeado pelo seu “exército” de sipaios, dizia sempre “quero, posso e mando”. Numa das vezes reparou que o seu sipaio mais fiel não estava na formatura. Foi procurá-lo e encontrou-o. Estava na cama com a mulher… do Chefe do Posto.

A interpretação de que João Lourenço só responde perante a Constituição, que solenemente jurou cumprir, esbarra e colide nas regras partidárias que fizeram jurisprudência nas últimas décadas e que dizem que todas essas decisões de Estado não podem contrariar a soberana orientação do partido.

Habilmente, embora sem efeitos práticos, João Lourenço conseguiu nos dois primeiros anos de (suposta) governação cativar a simpatia de velhos “inimigos” do MPLA. Bastou-lhe, para isso, pôr a correr pelo mundo que iria liderar um sério e decisivo combate à corrupção, branqueando à sua própria participação nesse cancro.

Meio mundo (o Folha 8 está no outro meio) acreditava que João Lourenço vai aniquilar José Eduardo dos Santos. Nessa ofensiva supostamente contra a corrupção, impunidade e ladroagem em Angola, o actual Presidente do MPLA, procura vender gato por coelho pois sabe por experiência própria que se acabar a corrupção… acaba o próprio MPLA.

O poder político em Portugal sempre teve, tem e terá uma relação oportunista com Angola, privilegiando ligações com a elite angolana, independentemente de considerações sobre corrupção, impunidade e ladroagem.

É exactamente isto que João Lourenço espera, foi exactamente isto que aprendeu com o seu grande mestre e mentor, José Eduardo dos Santos. Isto é, que os seus principais “advogados” de defesa sejam aqueles que acusam quem está dentro do galinheiro a roubar as galinhas, esquecendo os que estão, ou estiveram, à porta… de guarda.

Mas a verdade é que, até agora, João Lourenço não ganhou a guerra e, aliás, tem estado a perder uma série de batalhas importantes. Quis caçar leões, preparou toda a comitiva, mostrou armamento pesado e atiradores de alto gabarito. Todos, ou quase, acreditaram que seria desta que os leões virariam troféus. Chegados ao local, os leões apareceram, os caçadores fizerem pontaria e puxaram o gatilho.

Resultado? Os leões comeram os caçadores. Porquê? As armas de elevado calibre não tinham balas…

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