O empresário e general na reserva Bento dos Santos Kangamba, que foi detido no sábado por suspeitas de “burla por defraudação” saiu em liberdade, mas está proibido de sair de Angola. Entre foguetes e fanfarras segue a farra de quem quer, pode e manda.
Em teoria (na prática depende de quem está envolvido) não existe em Angola a possibilidade legal de um indivíduo ser preso em virtude de ter contraído uma dívida e não querer ou não poder pagá-la, configurando tal facto mero incumprimento de um contrato.
Uma dívida pode resultar de um indivíduo ter recebido determinado valor monetário no âmbito de um contrato de arrendamento, de compra e venda, de prestação de serviços… e ainda, no âmbito desse contrato, não ter cumprido a sua obrigação – de entrega da casa arrendada ou do bem vendido, de prestação do serviço ou ainda de devolução de quantia emprestada.
Uma “dívida” com esta configuração pode, no entanto, acarretar responsabilidade criminal, com a consequente possibilidade de prisão, se houver fortes indícios de que o “devedor” utilizou o contrato que esteve na sua origem apenas como meio para enganar (defraudar) o “credor”, ou seja, numa situação em que o “devedor” nunca teve a intenção de cumprir o contrato, mas apenas de usá-lo como meio para obter, à custa do “credor”, um ganho.
Os “fortes indícios” são obtidos pelas declarações do “credor”, do “devedor”, de testemunhas, de documentos e de outras provas. Não é “forte indício” a simples “queixa” criminal do “credor”, sendo ilegal (muitas vezes é até um verdadeiro abuso da autoridade), a prisão do “devedor” com base apenas na queixa por burla do credor.
Não existindo os referidos indícios e, pelo contrário, se verifique que o “devedor” contra quem foi feita uma “queixa de burla” pretendia efectivamente celebrar e cumprir o contrato no âmbito do qual foi contraída a dívida, e que só não chegou a pagar ou a realizar a prestação a que estava obrigado em virtude de um acontecimento imprevisível, conclui-se (pelo menos nos Estados de Direito) que não existe qualquer crime de burla que possa resultar em detenção do “devedor” faltoso.
Segundo uma fonte judicial, Bento Kangamba, que foi ouvido na Direcção Nacional de Acção Penal, foi posto em liberdade, ficando sujeito a Termo de Identidade e Residência e apresentação periódica às autoridades e não poderá ausentar-se do país.
Bento Kangamba, que foi detido na província do Cunene, no sul de Angola, junto à fronteira com a Namíbia sendo (ao que parece) suspeito de ter usado em proveito próprio cerca de seis milhões de dólares (cerca de 5,4 milhões de euros) “que lhe teriam sido entregues a pretexto de financiar uma campanha do seu partido [MPLA, partido no poder desde 1975]”, indicou a mesma fonte.
Na altura da detenção, com a devida propaganda oficial, foram apreendidos uma pistola e valores em kwanzas (moeda angolana) e rands (moeda sul-africana) cuja quantia não foi divulgada.
O general contesta, no entanto, que estivesse a tentar fugir do país, e afirma que tem colaborado com a justiça angolana, no sentido de pagar a dívida contraída, sem detalhar qual o valor da mesma ou quem são os credores.
Num comunicado enviado pela sua assessoria de imprensa pouco depois da detenção, Bento Kangamba referia que não pendia sobre si “nenhuma interdição de saída, ou qualquer outra medida de coacção” e que a “aludida dívida, que foi forçadamente contraída a alguém que pretendia expatriar os seus capitais, à revelia da legislação em vigor” era “de montante bastante inferior ao património que possuiu”.
Considerou ainda que a detenção foi “ilegal, ilícita e abusiva”, servindo para “humilhar publicamente um homem que tanto contribuiu, como militar, político e empresário, para o engrandecimento de Angola”, referem os assessores do general.
O general Bento dos Santos Kangamba foi detido junto à fronteira com a Namíbia por suspeita de “burla por defraudação” e fuga, anunciou de forma massiva e panfletária no sábado a Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola.
Em causa estão indícios de “prática do crime de burla por defraudação”, segundo as autoridades angolanas, que salientaram, que o general foi detido na província do Cunene, no sul de Angola, quando tentava fugir para a Namíbia.
Bento Kangamba casou com uma sobrinha do antigo Presidente angolano e Presidente Emérito do MPLA, José Eduardo dos Santos, é dono do clube de futebol Kabuscorp e foi dirigente do MPLA.
No passado, o general tem um histórico com autoridades judiciais internacionais. Chegou a ser acusado de tráfico de mulheres pela justiça brasileira e o seu nome esteve também envolvido numa investigação em França sobre o destino de três milhões de euros apreendidos no sul do país e que, alegadamente, se destinavam ao general, que se encontrava no Mónaco.