A Polícia do MPLA disse hoje que o uso da força em manifestações “muitas vezes resulta de desobediência dos cidadãos”, afirmando que a polícia é chamada para “garantir o livre exercício de reunião ou interditar manifestações violentas”.
Por Orlando Castro
“E m primeiro lugar a polícia é chamada para garantir o livre exercício de reunião e/ou de manifestação, em segundo lugar a polícia pode ser chamada para interditar aquelas manifestações que violem a lei sobre reunião e manifestações”, respondeu hoje à Lusa o director do gabinete de Estudos, Informação e Análise do Comando Geral da Polícia angolana, José Carlos da Piedade.
Segundo o comissário da Polícia do MPLA, em manifestação a polícia é chamada para actuar em duas perspectivas e a repressão surge em manifestações “que à partida sejam violentas ou aquelas que de um modo geral possam violar direitos fundamentais dos cidadãos”.
“O uso da força muitas vezes resulta de desobediência dos cidadãos”, disse hoje, em Luanda, à margem do acto de lançamento das festividades do 44.º aniversário da Polícia do MPLA.
Agosto de 2016. Em entrevista-encomenda ao boletim oficial do regime (Jornal de Angola), o juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar (do MPLA), general António dos Santos Neto “Patónio”, considerou que os militares das FAA (sob comando do general Wala) que assassinaram o adolescente António Rufino, ocorrida no Zango, agiram em legítima defesa.
O juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar do MPLA tinha toda a razão. Tal como hoje tem José Carlos da Piedade. Os militares em serviço no Zango estavam, afinal, fortemente armados… apenas com leques (para enfrentar o calor) e, por isso, viram-se em perigo quando o puto Rufino tirou do bolso todo um arsenal capaz de derrotar o próprio Exército… Islâmico.
Além disso, como certamente sabia o general “Patónio”, o Rufino foi atingido “em flagrante delito” quando se preparava para uma actividade criminosa, evidenciando “actos preparatórios para a prática de rebelião e atentado contra o Presidente da República”. Exactamente o mesmo cenário dos manifestantes que contestavam a tomada de posse do juiz Manico como soba da Comissão Nacional de Eleições.
Perante isso os militares não tiveram alternativa. Deram um tiro no perigosíssimo terrorista chamado António Rufino. Aliás, esses ou esse militar deveria ser promovido. É o mínimo que o regime pode fazer por ele. Tal como deve ser promovido José Carlos da Piedade.
Nesse flagrante delito, como certamente consta do relatório na posse do juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar do MPLA, os militares descobriram em poder do jovem Rufino diverso material bélico, altamente letal, caso de esferográficas BIC (azuis), um lápis de carvão (vermelho), blocos de papel (brancos) e, tanto quanto o Folha 8 apurou na altura, um livro (de bolso) sobre como derrubar as ditaduras.
Sabe-se, igualmente, que os militares do general Wala descobriram que o perigoso jovem activista tinha mísseis escondidos nas lapiseiras, Kalashnikovs camufladas no telemóvel e outro armamento pesado e letal disfarçado nos blocos de apontamentos. Eram, reconheça-se, provas mais do que suficientes para provar que estava a preparar um golpe de Estado. Exactamente o mesmo com os “terroristas” que contestavam o juiz Manico.
Perante isso os militares não tiveram alternativa. Deram um tiro no perigosíssimo terrorista chamado António Rufino. Legítima defesa pura e simples, segundo o general “Patónio”.
O jovem estava no seu quartel-general no Zango, por sinal uma forte estrutura terrorista disfarça da habitação precária, numa reunião dos seus estrategas militares que planeavam – como os Revús – um golpe a partir da leitura do livro “Da ditadura à democracia — Uma estrutura conceptual para a libertação”, do norte-americano Gene Sharp.
Mais ao fundo, no quintal, debaixo de um coberto de zinco, o exército terrorista mobilizado pelo jovem Rufino (talvez uns milhares de guerrilheiros, não general “Patónio”?) afinava os códigos para lançamento dos mísseis e, talvez, até de ogivas nucleares contra a residência do Presidente Emérito do MPLA, Eduardo dos Santos.
Perante isso os militares não tiveram alternativa. Deram um tiro no perigosíssimo terrorista chamado António Rufino. Legítima defesa pura e simples, segundo o general “Patónio”.
Com todo este manancial de provas, o juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar do MPLA não teve dúvidas. Foi legítima defesa. Não vai, pois, ser difícil aos servos do general “Patónio”, provar que o jovem Rufino estava envolvido (seria mesmo o comandante) numa conspiração para a “destituição do Presidente da República e de outros órgãos de soberania”.
Não foi difícil saber o que o Ministério Público do MPLA, com o apoio do Tribunal Militar do MPLA, escreveu na análise ao caso. Será algo do tipo: “Os factos descritos evidenciam claramente que a vítima participara em reuniões com vista a traçar estratégias e acções, tais como manifestações, greves e desobediência civil generalizada, conducentes à destituição do Governo e do Presidente da República”.
Dirão igualmente que o jovem Rufino liderava reuniões no Zango que visavam “mobilizar as massas populares ideais para desacreditar a governação do executivo angolano”.
Ainda com a perspicácia investigativa dos melhores peritos do país, será mais uma vez possível concluir que nesses “encontros de concertação”, o Rufino preparava a máquina de guerra para “destituir o poder político em Angola”.
Ao Tribunal Militar do MPLA não escapou também a análise conspirativa dos frustrados (como chamou aos jovens o próprio Eduardo dos Santos) do Zango, atentos leitores de uma “suposta obra de Domingos da Cruz com o título “Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura: Filosofia para a libertação de Angola”, uma adaptação do livro de Gene Sharp “Da Ditadura à Democracia”.
Pedagogicamente, ou não fôssemos todos matumbos, o Tribunal Militar do MPLA explicou que essa obra “inspirou as chamadas revoluções nos países da Europa de Leste, países nórdicos, africanos, como a Tunísia, o Burkina Faso, Egipto e Líbia, cujas consequências de tão nefastas deixaram os países atingidos completamente na desgraça, destruídos pelo vandalismo e pelas guerras que se seguiram”.
O Tribunal Militar do MPLA não teve, é claro, dificuldade em comprovar que o jovem Rufino dava aulas aos seus seguidores em que “explicava a metodologia e objectivos a perseguir e preparação de acções para a destituição do Presidente da República, ao que seguiria a criação de um governo de transição”.
“O jovem Rufino planeava formar um governo de salvação nacional e elaborar uma nova Constituição”, disseram os peritos dos generais “Patónio” e Wala, mostrando que o terrorista Rufino até já tinham gente a trabalhar num novo governo e numa nova constituição. É obra, reconheça-se.