Milhões para (dizem os mesmos de sempre) os jovens

As Nações Unidas vão contemplar Angola com 58 milhões de euros destinados aos jovens até 2022, anunciou hoje o coordenador residente da ONU no país, que destacou a importância da Política Nacional da Juventude do Governo angolano. Já estamos a ver o filme.

“É um plano muito importante onde as agências das Nações Unidas participaram activamente tendo em conta que 65% da população angolana tem menos de 65 anos”, salientou Paolo Balladelli, após a apresentação pública da Política Nacional da Juventude (PNJ), hoje em Luanda.

O plano “cruza-se” com o quadro de cooperação que a ONU assinou com o Governo de Angola para o triénio 2020-2022 que contempla um total de 270 milhões de dólares (243 milhões de euros), dos quais cerca de 64 milhões (58 milhões de euros) serão dedicados ao tema juventude, sobretudo acesso dos jovens a temas sociais (educação, protecção social e saúde), empregabilidade juvenil e a construção de espaços de participação e cidadania.

O programa, que a ministra da Juventude e Desportos, Ana Paula Neto, considerou “um importante instrumento de governação” foi aprovado em Setembro de 2019 e resultou de um “processo de discussão púbica abrangente que envolveu também a auscultação à juventude”.

A Política Nacional da Juventude (PNJ) é sustentada por sete eixos: acesso aos serviços sociais básicos, acesso a formação profissional, emprego e empreendedorismo, erradicação da pobreza, participação e representação na vida política pública, tempos livres, educação e desporto, acesso às tecnologias de informação e comunicação e segurança pública e cidadania.

Paolo Balladelli sublinhou que o envolvimento das Nações Unidas permite dar “um forte contributo” no que diz respeito ao acesso dos jovens à educação e à saúde, nomeadamente a saúde sexual e reprodutiva.

O responsável da ONU falou ainda sobre a necessidade fazer “uma formação focada nas reais perspectivas de empregabilidade dos jovens”, o que está a ser feito em coordenação com o executivo, de forma transversal, bem como a “criação de espaços de dialogo e intercâmbio dos jovens”, que ajudem a reforçar o seu envolvimento na cidadania e como podem activamente encontrar respostas para as suas necessidades e anseios.

Em 12 de Setembro de 2018, as Nações Unidas afirmaram que morriam diariamente pessoas em Angola em consequência das mudanças climáticas, considerando que essa era uma razão imperativa para “mobilização acelerada de recursos” para mitigação e adaptação ao fenómeno. Bem que o secretário-geral da ONU, António Guterres, deveria chorar de vergonha… se a tivesse. Os angolanos morrem de fome e de doenças apenas e só devido à criminosa incompetência do único Governo que conhecem desde 1975, o do MPLA.

“De acordo com a última avaliação feita pelo Ministério da Agricultura, temos as comunidades avaliadas nas três províncias do Cunene, Huíla e Namibe em fase 3 ou 4 do IPCC (Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas), que quer dizer que morrem 0,5 por 10.000 pessoas por dia devido à mudança climática no país”, afirmou na altura – com uma lata descomunal – Paolo Balladelli.

Segundo o responsável da ONU, que falava, em Luanda, na abertura do primeiro Diálogo Nacional sobre o Fundo Verde para o Clima (GCF, na sigla inglesa), a situação devia constituir preocupação das autoridades para “mobilização acelerada de recursos”.

“Esta é uma das tantas razões imperativas para mobilizar de uma forma acelerada os nossos recursos para focar de uma forma muito atenta sobre a mitigação e adaptação da mudança climática”, alertou nessa intervenção anedótica e de total branqueamento da incompetência de um partido, o MPLA, que nos desgoverna há 45 anos, como muito bem sabe a ONU.

O ambiente é fundamental para a sobrevivência do ser humano e tem ligações com todas as metas de desenvolvimento sustentável para a Agenda 2030, definida pelas Nações Unidas, porque, realçou Balladell, o ambiente pode ter um impacto muito grande na erradicação da pobreza, na eliminação da fome, saúde, educação, entre outras.

“Não há espaço para ineficiência e realmente a população angolana é um foco, então este vai ser um terreno bom, ou seja, temos o contexto facilitador para poder realmente mudar as coisas”, sublinhou.

Treta do representante de António Guterres

O representante residente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em Angola, Pier Paolo Balladelli, considerou em 5 de Outubro de 2018 que o país vivia uma fase “nunca antes vista”, com “maior liberdade crítica e aproximação” entre entidades do Estado e cidadãos.

No tempo de José Eduardo dos Santos, Balladelli optou por estar quieto e caladinho e, inclusive, esteve solidário com António Guterres quando este bajulou o presidente anterior para conseguir apoio à corrida para secretário-geral da ONU.

Pier Paolo Balladelli, que discursava na abertura de um ciclo de palestras subordinado ao tema “O Cidadão, a Nossa Ocupação, O Cidadão a Nossa Preocupação, Mais Direito, Mais Cidadania, Mais Cidadania, Mais Direito”, referiu que Angola regista “mudanças importantes”.

De acordo com Paolo Balladelli, “é evidente a fase de mudança” que se regista em Angola, sobretudo com a liderança do Presidente João Lourenço, onde, apontou, “é visível uma maior aproximação entre entidades do Estado e a sociedade civil nunca antes vista”.

“Agora temos possibilidade de discutir, de apresentar ideias, também de ser críticos sobre o desempenho ou sobre a aplicação de direitos. É um momento com grandes potencialidades para aplicar a participação da cidadania”, disse.

Para o também coordenador do Sistema das Nações Unidas em Angola, a materialização dos direitos e liberdades dos cidadãos concorre para a consolidação da paz e estabilidade nacional, que passa também, apontou, pela eficácia da Provedoria de Justiça.

“Um atendimento eficaz às petições dos cidadãos através deste mecanismo institucional, Provedoria de Justiça, pode prevenir, e mesmo evitar, possíveis actos de instabilidade resultantes de descontentamentos e frustração”, alertou.

No dia 21 de Setembro de 2016, o antigo primeiro-ministro de Portugal agradeceu o apoio de Angola à sua candidatura ao cargo de secretário-geral das Nações Unidas, elogiando (foi o preço a pagar pelo apoio) o papel do país no contexto internacional.

António Guterres, que foi igualmente alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados, falava à rádio pública angolana, sobre o apoio de Angola, salientando que tem sido “um instrumento muito importante” para que tenha possibilidades de vencer.

“Gostaria de exprimir toda a minha gratidão e o meu apreço pelo que tem sido a posição do Presidente José Eduardo dos Santos, do Governo e povo de Angola, a solidariedade angolana tem calado muito fundo no meu coração”, referiu Guterres mostrando que, afinal, bajular é uma questão genética em (quase) todos os socialistas – e não só – portugueses.

Em Março desse ano, o Presidente José Eduardo dos Santos recebeu em audiência, em Luanda, o candidato português à sucessão de Ban Ki-moon.

“Agora compete aos Estados-membros, entre os quais Angola, decidir, mas não queria deixar de exprimir esta grande gratidão em relação à posição angolana, que calou muito fundo no meu coração”, realçou Guterres.

Pela voz do então ministro dos Negócios Estrangeiros, Georges Chikoti, Angola disse que “esta eleição é muito importante para África, para a CPLP, para Angola e para a comunidade internacional em geral. O engenheiro Guterres tem sido um lutador incansável pelas causas importantes da comunidade internacional, em particular dos refugiados”.

Chikoti acrescentou: “Temos a certeza que nessa qualidade (secretário-geral) ele vai olhar muito para África e para Angola em particular, queremos esperar que ele consiga promover alguns quadros importantes do continente africano, particularmente da lusofonia”.

Enquanto candidato e por necessidade material de recolher apoios, António Guterres confundiu deliberadamente Angola com o regime, parecendo (sejamos optimistas) esquecer que, por cá, existiam (como continuam a existir) angolanos a morrer todos os dias, que ainda temos um dos regimes mais corruptos do mundo e que somos o país com um dos maiores índices mundiais de mortalidade infantil.

Na sua visita a Angola, António Guterres disse que, “por Angola estar envolvida em actividades internacionais extremamente relevantes, vejo-me na obrigação de transmitir pessoalmente essa pretensão às autoridades angolanas”.

Pois é. Esteve até no Conselho de Segurança da ONU. E, pelos vistos, isso basta. O facto – repita-se todas as vezes que for preciso – de ter na altura desde 1979 um Presidente da República nunca nominalmente eleito, de ser um dos países mais corruptos do mundo, de ser o país onde morrem mais crianças… foi irrelevante.

“Naturalmente como velho amigo deste país, senti que era meu dever, no momento em que anunciei a minha candidatura a secretário-geral das Nações Unidas, vir o mais depressa possível para poder transmitir essa intenção as autoridades angolanas”, sublinhou António Guterres.

Guterres tem razão. É, como a própria ONU, um velho amigo do regime. Mas confundir isso com ser amigo de Angola e dos angolanos é, mais ou menos, como confundir o Oceanário de Lisboa com o oceano Atlântico. Seja como for, confirmou-se que a bajulação continua a ser uma boa estratégia. Nesse sentido, António Guterres não se importou de continuar a considerar José Eduardo dos Santos como um ditador… bom.

António Guterres, além de ter sido primeiro-ministro luso entre 1995 a 2002, exerceu o cargo de alto comissário da ONU para os Refugiados, durante dez anos antes de ser eleito secretário-geral da ONU.

António Guterres, tal como Pier Paolo Balladelli, sabe que todos os dias, a todas as horas, a todos os minutos há angolanos que morrem de barriga vazia e que 70% da população passa fome; sabe que 45% das crianças angolanas sofrem de má nutrição crónica, e que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos; sabe que no “ranking” que analisa a corrupção, Angola está entre os primeiros, tal como sabe que a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos e que o silêncio de muitos, ou omissão, deve-se à coacção e às ameaças do partido que está no poder desde 1975.

António Guterres, tal como Pier Paolo Balladelli, também sabe que o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder, como sabe que ser amigo de quem está no poder é fácil e por norma rende muito.

Seja como for, António Guterres, tal como Pier Paolo Balladelli, não deve gozar com a nossa chipala nem fazer de todos nós uns matumbos.

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