Lourenço agradece ao camarada “tio Celito”

O ministro das Relações Exteriores de Angola, Manuel Augusto, anunciou hoje que teve um encontro durante a manhã com o Presidente da República português, Marcelo Rebelo de Sousa, para agradecer o apoio na luta contra a corrupção e nas reformas.

“Gostaria de informar que tive um encontro esta manhã com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a quem transmiti este agradecimento e a quem também pedi que continuasse, que Portugal continuasse a apoiar Angola nessas reformas e nesse combate porque vai beneficiar Angola, em primeira instância, mas também todos os seus parceiros, incluindo Portugal”, disse o chefe da diplomacia angolana.

Em declarações à margem da sua intervenção no Seminário Diplomático, que decorre hoje e terça-feira no Museu do Oriente, em Lisboa, Manuel Augusto acrescentou, sobre o apoio de Portugal ao combate à corrupção em Angola: “Temos todas as razões para estar satisfeitos com o papel que Portugal tem desempenhado nessa fase crucial do nosso desenvolvimento político, económico e social”.

Questionado sobre que apoio específico Portugal tem estado a dar e o que espera doravante, chefe da diplomacia angolana elencou a “cooperação entre as instituições” judiciais e lembrou a actuação do Reino Unido, que “permitiu recuperar de forma extraordinária 500 milhões de dólares [447 milhões de euros]”.

A comunidade internacional, argumentou, “está toda activamente ao lado do Governo angolano nesta sua luta, naturalmente não é só por razões filantrópicas, mas porque, sendo Angola um parceiro que pode ser importante, é do interesse da comunidade que seja um parceiro transparente, onde o ambiente de negócios corresponda ao padrão internacional”. Esta fase da luta contra a corrupção, salientou, “é absolutamente fundamental”.

“Não temos outra opção para podermos garantir um futuro bom para todos, incluindo para os nossos parceiros, é preciso que vençamos esse combate e estamos determinados a fazê-lo, e mais fácil será se continuarmos a contar com o apoio de países amigos como Portugal”, concluiu.

Seis de Eduardo dos Santos. Meia dúzia de João Lourenço

Em Setembro do ano passado, Manuel Augusto declarou, em Nova Iorque, que as reformas levadas a cabo pelo Presidente João Lourenço vão começar, em breve, a surtir efeitos positivos na vida dos cidadãos. O que significa “em breve”? Ninguém sabe. Até agora já lá vão 44 anos de governação do MPLA e os resultados são os que se conhecem.

Quando assumiu o poder (embora fizesse parte do poder há muitos, muitos anos), em Setembro de 2017, o Presidente da República, João Lourenço, herdou – diz o MPLA – um difícil cenário económico e financeiro, originado pela queda do preço do crude, com grandes repercussões na qualidade de vida da população.

O chefe da diplomacia angolana disse estar ciente (também não se sabe o que isso significa no léxico do MPLA) das expectativas criadas pela sociedade em relação às políticas do Executivo para relançar o desenvolvimento económico e social do país.

“Temos procurado informar a sociedade que, para colher, é preciso plantar e o que o Presidente João Lourenço tem feito, ao longo desses dois anos, é plantar para podermos brevemente colher os frutos dessas reformas, que são inadiáveis”, elucidou Manuel Augusto. E tem razão. O problema está que o Presidente do MPLA e da República e Titular do Poder Executivo ainda não percebeu que, por exemplo, plantar couves com a raiz para cima não resulta.

Para o ministro, que falava à imprensa, na antevisão do discurso de João Lourenço na 74ª sessão da Assembleia Geral da ONU, o mundo acompanha com muita atenção as reformas prometidas, propagandeadas e maquilhadas pelo Executivo angolano.

“Há uma nova Angola aberta ao investimento e determinada a fazer uso dos imensos recursos que tem”, disse o ministro Manuel Augusto, que considerou (pudera!) positivos os dois anos de mandato do Presidente João Lourenço.

Claro que considera positivo. Se o não fizesse seria exonerado. Além disso, bem que poderia explicar ao mundo e, já agora, aos angolanos, que “os imensos recursos” só foram descobertos com a chegada de João Lourenço ao Poder. É isso, não é ministro Manuel Augusto? Até então esses “imensos recursos” estavam fugidos e a residir em parte incerta.

Manuel Augusto elogiou (quem diria?), por outro lado, a coragem e determinação do Chefe de Estado em encontrar soluções para solucionar os vários problemas que o país enfrenta notando que, ao longo desses dois anos, várias mudanças se verificaram no país.

Mais uma vez o ministro tem razão. Nesses dois anos de governação de João Lourenço foi possível pôr os rios a desaguar na foz, as semanas a ter sete dias e os dias 24 horas, bem como ensinar com inegável sucesso os angolanos a viver sem comer.

“A coragem em identificar os problemas e soluciona-los é um facto que se deve realçar”, observou Manuel Augusto na mais servil e bajuladora posição de quem, para manter o tacho, prefere “matar” o chefe com elogios do que o salvar com críticas. É mesmo o MPLA no seu melhor.

Convenhamos que, tal como João Lourenço, apenas tendo regressado a Angola em 2017, Manuel Domingos Augusto (que nasceu a 2 de Setembro de 1957 em Luanda), pouco mais poderia ter feito.

Os opositores, que tanto gostam de azucrinar os ministros e o Presidente, irritando solenemente o Departamento de Informação e Propaganda do MPLA, bem como a sua sucursal para a comunicação social (ERCA), dizem que – afinal – Manuel Augusto sempre esteve em Angola.

Dizem que foi Secretário de Estado das Relações Exteriores; Secretário de Estado das Relações Exteriores para os Assuntos Políticos; Embaixador na Etiópia e Representante Permanente junto a UA e ECA; Vice-Ministro da Comunicação Social; Embaixador de Angola na República da Zâmbia; Chefe da Primeira Missão na República da África do Sul; Primeiro Secretário da Embaixada de Angola na Nigéria; Chefe de Sector para os Países Ocidentais (Estados Unidos da América; Canada, Japão, CEE) da Secretaria de Estado da Cooperação; Jornalista do Pravda (Jornal de Angola) e da Televisão Pública de Angola e perito e Chefe de Recursos Humanos do Jumbo- Pão de Açúcar.

Um ministro para todos os serviços

“Angola conduz um processo de consolidação da paz baseado na inclusão que permite ultrapassar incompreensões, restabelecer confiança entre as pessoas e lançar bases para uma paz duradoura”, afirmou, dizia em manchete o Pravda do MPLA, nas Nações Unidas, o então secretário de Estado das Relações Exteriores do Governo de… José Eduardo dos Santos. Foi em Janeiro de 2015 e o homem chamava-se Manuel Augusto. Hoje é ministro.

De acordo com o Boletim Oficial do regime, Manuel Augusto, que discursava no debate aberto do Conselho de Segurança subordinado ao tema “Desenvolvimento inclusivo para a manutenção da paz e da segurança internacional”, disse que “Angola desenvolve um programa económico e social de reintegração de segmentos da população vítima do conflito armado, especialmente ex-combatentes e famílias”.

Como os ouvintes da ONU têm uma noção do que é Angola real como, por exemplo, os jacarés que se alimentam dos inimigos do regime têm do que é a democracia, todas as aleivosias podem ser ditas. Foi, mais uma vez, o caso. E o homem não lhe perdeu o jeito. José Eduardo dos Santos ensinou-o bem.

No debate, que teve como moderadora a então Presidente do Chile, Michele Bachelet, e no qual participou o então Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, o secretário de Estado do MPLA disse que “nos países que emergem de conflitos armados, a consolidação da paz deve realizar-se no quadro de um processo inclusivo que permita ultrapassar incompreensões, restabelecer a confiança e lançar as bases para uma paz duradoura”.

É verdade. No caso de Angola a paz foi conseguida há 18 anos e o regime pensa começar a implementar o “processo inclusivo que permita ultrapassar incompreensões, restabelecer a confiança e lançar as bases para uma paz duradoura” dentro de, talvez, 30 anos. Mais vale tarde do que nunca, dirão com a sua atávica hipocrisia os membros da ONU.

Manuel Augusto considerou então importante a aplicação de políticas adequadas, com impacto positivo, nomeadamente nos domínios da educação, do diálogo social e da inclusão social e económica.

“O secretário de Estado garantiu que as políticas de inclusão social que Angola desenvolve comportam igualmente a promoção de género, em especial da mulher rural, que está gradualmente a tomar um papel mais assertivo, ocupando lugar de direito na comunidade”, retratava o JA, no seu habitual culto à divindade suprema do patrão.

“Uma governação inclusiva é o melhor garante para se obterem ganhos de representatividade e de efectividade para o desenvolvimento económico, a harmonia social e um desenvolvimento humano efectivo”, referiu Manuel Augusto na leitura do texto que lhe foi entregue.

O diplomata considerou que a exclusão territorial “é o ponto de partida para a existência de forças centrífugas que podem levar à fragmentação territorial dos Estados,” acrescentando ser necessário que “todas as regiões que compõem um determinado país sejam tratadas de igual modo, assim como os seus habitantes, para reforçar a identidade nacional e salvaguardar a integridade territorial”.

Mais coisa menos coisa era isso mesmo que o regime colonial dizia quando se referia a Angola, ou quando o governo indonésio falava da sua “província” de Timor-Leste. Mas a tese era tão boa que Manuel Augusto hoje é ministro.

A inclusão nacional, realçou o porta-voz do regime, contribui decisivamente para a coesão e a harmonia social e consequentemente para a mobilização efectiva dos cidadãos, para os grandes desígnios ligados à paz e ao desenvolvimento harmonioso.

“É nos países de carácter multiétnico que os desafios da inclusão se revelam de maior complexidade. Para a ultrapassagem da tendência natural à exclusão do outro, baseada na diferença, é fundamental que os Estados abordem os problemas da etnicidade com particular sensibilidade, de modo a não permitir que qualquer grupo seja marginalizado, promovendo a plena convivência e a igualdade de oportunidades para todos”, disse.

Não fosse esta afirmação dramática por ser falsa, certamente que os milhões de angolanos marginalizados (20 milhões são apenas e só… pobres), também por razões étnicas, se fartariam de rir. Mas, embora rir seja um bom remédio, a barriga vazia não ajuda a ter boa disposição.

Manuel Augusto disse que a inclusão social compreende a cultura da paz, da tolerância e da plena aceitação da diferença inerente à pluralidade social, bem como de género na formulação das políticas nacionais.

O orador acentuou que “a exclusão económica geralmente é a causa dos conflitos” e que a inclusão económica, “enquanto expressão da participação de todo o tecido social no usufruto da riqueza nacional, revela-se um bem tangível de importância crucial para a consolidação do sentimento de pertença e para a participação efectiva de todos no trabalho e no usufruto do trabalho de cada um”.

Para provar a sua tese, Manuel Augusto bem poderia ter dito que em Angola poucos têm milhões e milhões têm pouco, ou nada. Não o disse, obviamente. E não disse porque, legitimamente, não quer entrar na cadeia alimentar dos jacarés. Apostou bem. Hoje, e por enquanto, é ministro e tem a total confiança de João Lourenço. Amanhã se verá.

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