A UNITA, maior partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista em Angola, mostrou-se preocupada com a “partidarização” da comunicação social e recomendou a “reprivatização” urgente dos órgãos privados que passaram para as mãos do Estado. Talvez o MPLA alinhe. Mas, quiçá, para o fazer quererá que os dirigentes de UNITA deixem as lagostas e regressem à mandioca. Estarão eles dispostos a isso?
Em declarações à Lusa após uma conferência de imprensa da UNITA sobre o estado democrático em Angola, 28 anos após as primeiras eleições gerais, a segunda vice-presidente do grupo parlamentar do partido do “Galo Negro”, Navita Ngolo, salientou que, nesta altura, “a imprensa já devia ser mais plural, menos partidarizada”.
Vários órgãos privados como a Global FM, Palanca TV, TV Zimbo, Radio Mais e jornal O País foram confiscadas em Agosto pelo Serviço Nacional de Recuperação de Activos da Procuradoria-Geral da República (PGR) e entregues ao ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social.
Os meios eram detidos pelo general (do MPLA) Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino” e por Manuel Rabelais, antigo ministro da Comunicação Social (do MPLA) e foram alegadamente criados com fundos públicos que o MPLA roubou aos angolanos.
“Quando o Estado controla toda a imprensa, não abraça de facto o Estado democrático de direito. Há sempre a tendência de controlar o espaço noticioso, continuamos a ver espaços alargados para falar de matérias do partido que governa Angola [MPLA]”, notou a deputada, sublinhando que “a TV Zimbo e a Palanca traziam algum equilíbrio” ao panorama mediático.
Em relação ao confisco, “se, por um lado, houve ilicitude da forma como foram constituídos esses órgãos, é também necessário que haja órgãos plurais, que não dependam do Estado, para que possam servir o público”.
Sobre o caso de Edeltrudes Costa, que tem estado sob os holofotes da comunicação social não afecta ao regime mas não teve praticamente cobertura mediática nos órgãos do MPLA, Ngolo criticou o “olhar impávido da PGR e do próprio titular do poder executivo”… que por sinal é Presidente do MPLA e da República.
“Trata-se de uma pessoa directamente ligada ao seu gabinete, em países normais ou o próprio director demitia-se ou o Presidente o demitia, ou o próprio Presidente também se demitia porque quando a corrupção chega ao seu gabinete quer dizer que também é corrupto”, destacou Navita Ngolo, considerando que o silêncio à volta do caso “só denota que alguma coisa existe”.
Além de falar na violação dos pilares do estado democrático, nomeadamente no que respeita à descentralização, liberdade de imprensa e a corrupção institucionalizada, a deputada da UNITA elogiou também o governador de Benguela, Rui Falcão, por “ter tido a coragem de denunciar a falta de competência do Governo central em materializar a descentralização político-administrativa”.
Dias antes, Adalberto da Costa Júnior manifestou preocupação com acusações relativas à petrolífera estatal (leia-se: do MPLA) Sonangol e o envolvimento de “figura relevante” da Presidência da República em actos de alegado favorecimento em negócios.
Adalberto da Costa Júnior reagia numa mensagem publicada nas redes sociais à “quantidade de informações preocupantes” que os angolanos têm estado a receber nas últimas semanas, que nomeadamente “atentam contra a gestão e a transparência” da empresa pública Sonangol.
“Tudo isto ocorre sem que haja iniciativas de quem de direito, nomeadamente a Procuradoria-Geral da República”, disse Adalberto da Costa Júnior, considerando ainda “mais grave a publicação em que é tornado público a informação, não pela primeira vez, que envolve figura relevante da Presidência da República”.
Em causa estão “acusações bastante graves de violação da transparência e da Lei da Probidade Pública, inclusive com a indicação de que estas violações foram possíveis, porque também assinadas pelo Presidente da República”, acrescentou.
A televisão portuguesa TVI divulgou notícias, segundo as quais Edeltrudes Costa, chefe de gabinete do Presidente de Angola, João Lourenço, estaria a ser favorecido em negócios com o Estado, com o aval do chefe de Estado angolano.
O nome de Edeltrudes Costa foi citado como tendo recebido milhões de dólares, de origem desconhecida, tendo a sua empresa EMFC, as iniciais do seu nome, sido beneficiada em contratos de consultoria e prestação de serviços.
Por outro lado, o antigo gestor da empresária Isabel dos Santos na Sonangol, Mário Leite da Silva, queixou-se junto de reguladores internacionais sobre um “contrato falso” que terá lesado a Sonangol em 193 milhões de euros em 2005, altura em que o antigo vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, era o presidente do Conselho de Administração da petrolífera do MPLA.
O presidente da UNITA manifestou também preocupação com o silêncio sobre este assunto nas instituições, sobretudo nos órgãos de comunicação públicos.
“Estamos muito preocupados. E decorridos alguns dias é surpreendente o silêncio das instituições, é surpreendente que para outros casos haja rapidez, mas para este nem sequer a imprensa dá uma vírgula de notícia, um segundo de cobertura”, salientou.
Segundo Adalberto da Costa Júnior, em nenhum dos órgãos públicos se noticiou “o que quer fosse sobre esta matéria”, o que demonstra que Angola está “a viver um monopólio absoluto dos órgãos de comunicação e que o Estado está a violar inclusive a Lei de Imprensa”.
“Isto não se coaduna com uma sociedade democrática que nós todos pretendemos abraçar”, referiu o dirigente da UNITA, considerando que “é urgente que quem de direito não transfira cada vez mais a ideia que o combate à corrupção é apenas uma causa para alguns, não é universal e que é dirigido”.
“Esperamos o mais rápido possível, que os órgãos cumpram com a sua missão e que de facto não haja protegidos e que estejam acima da lei”, exortou.
A situação actual do país, prosseguiu, “é a razão que faz partilhar estas grandes preocupações de uma Angola que vê cada vez mais o que é de todos mal gerido”.
Para Adalberto da Costa Júnior trata-se de “mais uma preocupação acrescida no âmbito daquilo que é a falta de cumprimento pelas leis e a impunidade” que disse ser “cada vez mais uma instituição” no país.
Em Dezembro do ano passado, Adalberto da Costa Júnior avisou que o seu partido não ia engolir sapos e que estaria na linha da frente do combate por uma Angola para os cidadãos nem que, para isso, no limite, tenha de sair às ruas. Os crentes, como nós, ficaram sentados mas atentos. Continuam atentos e… sentados.
«O empenho com que os homens do presidente espoliam, de forma ilícita, violenta e impune, camponeses e pobres dos seus terrenos está a tornar-se num passatempo perigoso para os perpetradores e para o que resta da imagem de José Eduardo dos Santos. Basta lembrar o caso do actual secretário-geral da Presidência da República, Edeltrudes Costa, contra a camponesa Helena Teka. O banditismo descarado, com recurso à Polícia Nacional e às Forças Armadas Angolanas para os seus assaltos à mão armada contra populares indefesos, parece ser agora a ideologia dos que rodeiam o presidente», escrevei Rafael Marques de Morais em 7 de Outubro de 2016.
Folha 8 com Lusa