O ministro da Economia e Planeamento, Sérgio Santos, afirmou hoje que Angola quer subir 15 posições no “ranking” Doing Business (que realiza uma análise do ambiente de negócios em 190 economias) até 2022, uma “decisão firme” para a qual conta com a ajuda do Banco Mundial.
No ano passado, o país caiu quatro lugares no relatório Doing Business, passando da 173ª para a 177ª posição no conjunto dos 190 países analisados. A avaliação do Banco Mundial inclui critérios como facilidade em abrir um negócio, obter licenças de construção, registar uma propriedade, obtenção de crédito, cumprimento de contratos, pagamento de impostos ou obtenção de electricidade.
Hoje em Luanda, no seminário “Doing Business 2020 e a Melhoria do Ambiente de Negócios em Angola”, Sérgio Santos reafirmou o empenho em melhorar a posição de Angola e a “decisão muito firme” de avançar no indicador Doing Business.
“A nossa meta, segundo o Plano de Desenvolvimento Nacional é subir 15 posições até ao ano 2022”, afirmou o ministro, acrescentando que contam com a ajuda (ordens) do Banco Mundial para “perceber em que medida” se podem superar as dificuldades.
“É preciso uma acção muito mais enérgica da parte do Titular do Poder Executivo (João Lourenço), mas há uma posição inequívoca que temos de melhorar”, disse o ministro, reconhecendo dificuldades a nível legislativo com “muitas querelas jurídicas” que atrasam a tramitação de diplomas como o das insolvências, aprovado recentemente em Conselho de Ministros e que “estava a ser tratado há mais de três anos”.
Em declarações aos jornalistas, o secretário de Estado da Economia, Mário João, salientou que o ambiente de negócios é o “principal motor de tudo o que é actividade de negócios em Angola” e será “um veículo” para trazer investidores para o país.
“Os investidores estão habituados a ter um ambiente simplificado nas mais variadas geografias do mundo. Devemos arregaçar as mangas e estar preparados para competir com outras economias”, reforçou.
Mário João deu como exemplo de reformas em curso e que podem contribuir para esta melhoria, a implementação da janela única do comércio externo, processos mais simplificados na construção, bem como a reestruturação do ‘guichet’ único de empresas, que já está pronto a receber processos ‘online’ e a aprovação da lei das insolvências, que era outro “calcanhar de Aquiles” de Angola.
Para o representante do Banco Mundial em Angola, Olivier Lambert, o objectivo ambicioso de subir no “ranking” vai permitir “meter Angola no mapa do mundo e atrair interesse dos investidores internacionais”. Afinal o importante não é atingir a meta. Basta ter isso como objectivo, mesmo que nunca lá chegue.
Reconhece, no entanto, que “melhorar o ambiente de negócios é difícil porque toca muitas instituições, processos, toda a organização do Estado”, alterações que precisam de uma “coordenação e uma liderança muito forte”.
Estará Olivier Lambert a insinuar que João Lourenço não protagoniza uma “coordenação e uma liderança muito forte”? A qual João Lourenço se referia o representante do Banco Mundial em Angola? Ao Presidente do MPLA? Ao Titular do Poder Executivo? Ao Presidente da República?
Em 2017 era assim…
Angola estava na 182ª posição do “ranking” Doing Business. O último desta classificação era a Somália. O melhor era a Nova Zelândia, Portugal ocupava o 25º lugar. Estávamos, portanto, entre os dez países onde é mais difícil fazer negócios.
No relatório do Grupo Banco Mundial (BM) “Doing Business 2017- Igualdade de Oportunidades para Todos”, conclui-se que 137 países realizaram reformas para melhorar o ambiente de negócios em 2015/16, mais 20% do que no ano anterior.
Entre os 10 últimos encontrava-se Angola, com 38,41 pontos e na 182ª posição, embora estivesse entre os países que aboliram ou reduziram o capital mínimo requerido para a constituição de uma empresa e entre os que reduziram outros impostos para além dos impostos sobre o trabalho e sobre o lucro.
Angola, tal como seis dos nove Estados-membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), não viu melhorar nem piorar o seu ambiente de negócios, apesar de ter descido um lugar no ‘ranking’.
Na melhor posição entre os lusófonos está Portugal (com 77,4 pontos), um dos três países da CPLP que viram melhorar o seu desempenho, embora desça duas posições no ranking, para 25º. Cabo Verde encontrava-se no lugar 129, Moçambique no 137º lugar, o Brasil em 123º, Timor-Leste em 175º e a Guiné-Equatorial em 163º. São Tomé e Príncipe (162º) e Guiné-Bissau (172º) foram as duas outras economias lusófonas que viram melhorar a sua classificação no ranking Doing Business.
Os nossos (maus) exemplos
Mais de metade das 140 mil empresas registadas em Angola em 2015 estavam na província de Luanda, mas só 30% tinham iniciado actividade, segundo um relatório anual do Instituto Nacional de Estatística (INE) angolano. De acordo com o Ficheiro de Unidades Empresariais do INE, Angola tinha em actividade no final de 2015 um total de 41.507 empresas, das quais 22.930 a operarem em Luanda.
Segundo o relatório do INE, a província de Benguela era a segunda mais industrializada do país, com 3.643 empresas em actividade, enquanto no oposto da tabela, com apenas 383 empresas, estava o Cuando Cubango, no sul.
Em 2015 estavam constituídas em Angola 139.980 empresas, das quais 96.580 ainda a aguardar início de actividade, 1.692 com actividade suspensa, enquanto 273 foram mesmo dissolvidas. No ano anterior o país contava com 39.884 empresas em actividade, de um universo total de empresas constituídas de 116.894.
O estudo do INE referia 51,3% das empresas constituídas em Angola dedicavam-se ao comércio por grosso e a retalho e à reparação de veículos automóveis e motociclos, com um total de 21.306 negócios em actividade.
Em termos de alojamento, restauração e similares funcionavam em Angola 4.046 empresas e na construção 2.308.
No que tocava à forma jurídica, em cada 100 empresas constituídas em Angola, 55 eram sociedade por quotas e 41 em nome individual, além de sociedades anónimas ou empresas públicas.
Desaceleração estrutural
O Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) de Angola admitia que o país entrou num período de desaceleração estrutural do crescimento e que apenas crescerá a cerca de 2% ao ano até 2020.
A posição foi transmitida pelo director do CEIC, Alves da Rocha, durante a apresentação do Relatório Económico de 2015, elaborado por aquela instituição da Universidade Católica de Angola, tido como o mais relevante do género no país.
“Desde 2009, após a mini-idade de ouro de intenso crescimento económico, assistimos a uma desaceleração estrutural da economia, ano após ano. Estamos convencidos desta atenuação do crescimento da economia e neste momento não vislumbramos condições para que o país retome as taxas de crescimento do passado”, apontou o académico.
No Relatório Económico, apresentando juntamente com o Relatório Social também de 2015, o CEIC faz projecções do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) angolano até 2020, que não deverá passar uma taxa média anual “à volta dos 2 a 2,5%”.
“Pensamos que Angola está a entrar num período de desaceleração estrutural do crescimento, é uma situação de enorme preocupação para nós, no CEIC”, assumia Alves da Rocha, recordando a importância do petróleo nas contas angolanas, que só em 2008 permitiu uma taxa de crescimento económico de 12,8%.
Com uma reforma tributária e outros impostos entretanto criados “insuficientes” para cobrir a quebra nas receitas petrolíferas, o economista não tinha dúvidas em classificar o momento que o país atravessava: “A crise do petróleo é mãe de todas as crises em Angola”.
Entre 2002 e 2015, recordou, Angola registou “fantásticas receitas do petróleo” de 538 mil milhões de dólares (486 mil milhões de euros) e 320 mil milhões de dólares (289 mil milhões de euros) em receitas fiscais, cenário que a crise petrolífera – o crude representa cerca de 98% das exportações angolanas – veio entretanto comprometer.
“O país perdeu muitas oportunidades para melhorar substancialmente a qualidade de vida em Angola”, afirmou.
Além de uma verdadeira aposta na diversificação da economia angolana, o director do CEIC referia a necessidade de medidas para corrigir o modelo de distribuição de riqueza no país, que “está inquinado”.
Alertou igualmente, como preocupação do CEIC após a análise a todos os indicadores de 2015, para o “contágio” da crise ao sistema bancário, “que vive da concessão de crédito, com taxas de juro de 17%, e do negócio das divisas, que “simplesmente não as há”.
“O país não está em recessão, nem há nenhuma indicação que possa entrar em recessão, com os dados que temos. O mesmo não podemos dizer do PIB petrolífero”, admitiu o economista e académico angolano, director do CEIC.
Facturar nos impostos
O Programa de Potenciação da Receita Tributária (PPRT) de Angola previa arrecadar até mais 780 milhões de euros em 2016 com recurso a medidas estruturais de combate à fuga aos impostos e à habitual informalidade das transacções.
A informação constava de um documento de suporte à estratégia do Governo para ultrapassar a crise financeira provocada pela quebra nas receitas do petróleo, prevendo um “impacto” do PPRT nas contas públicas desse ano entre 75 mil milhões de kwanzas (420 milhões de euros) a 140 mil milhões de kwanzas (782 milhões de euros).
Embora sem concretizar as medidas, o documento, elaborado pelo Governo, referia que estavam previstas 25 acções tidas como prioritárias ao abrigo da execução do PPRT, desde iniciativas de “elevado valor”, “estruturais” e de “visibilidade e combate à informalidade”. De acordo com dados anteriores do Ministério das Finanças, a receita tributária não petrolífera representava já 44% do total de receita do Estado, mas a informalidade económica (negócios que não pagam impostos) em Angola rondava os 60%, colocando o país na lista dos que têm níveis mais altos na África subsariana.
Além do PPRT, o documento definia igualmente a necessidade de o Governo adoptar “medidas legislativas complementares” para “promover a uniformização da tributação dos rendimentos do trabalho, o alargamento da base tributária e a promoção da equidade horizontal”.
O então ministro do Planeamento e do Desenvolvimento Territorial, Job Graça, informou na altura que as contas angolanas reflectiram o efeito da crise petrolífera com o barril de crude médio exportado por Angola a ver a cotação cair de 96 dólares, em Janeiro de 2014, para 53 dólares em Dezembro de 2015.
De acordo com o governante, que falava no final de uma reunião do Conselho de Ministros que aprovou uma estratégia para fazer face à contínua diminuição das receitas petrolíferas, esta quebra teve como efeitos a redução da receita fiscal total angolana de 26,35% no espaço de um ano, o equivalente a mais de 850 mil milhões de kwanzas (4,75 mil milhões de euros). Passou de 4,096 biliões de kwanzas (22,9 mil milhões de euros) em 2014 para 3,242 biliões de kwanzas em 2015 (18,1 mil milhões de euros), precisou Job Graça.
O crescimento económico do país também se reflectiu e desceu dos 4,8% de 2014 para 2,8% em 2015.
O Governo projectara para 2016 um preço médio de 45 dólares por cada barril exportado, quando a cotação no mercado internacional caiu em Janeiro até aos 27 dólares, agravando os receios sobre a execução de alguns projectos, investimentos e despesa pública pelo país.
Mais do mesmo e os milhões a jorrar
Recorde-se (é um mero exemplo) que Angola fechou no dia 19 de Julho de 2018 dois financiamentos, no total de 280 milhões de dólares (239,5 milhões de euros), atribuídos pelo grupo Banco Mundial (BM), adicionais ao segundo Projecto de Desenvolvimento Institucional para os sectores da água e da agricultura comercial.
Pouco antes, em Fevereiro, o BM já tinha financiado outros 70 milhões de dólares (56,4 milhões de euros), para reforço da construção de infra-estruturas básicas sociais, designadamente hospitais e postos médicos, bem como residência para enfermeiros e professores.
O acordo de financiamento foi rubricado em Luanda, entre o então ministro das Finanças de Angola, Archer Mangueira, e o representante do Banco Mundial em Angola, Olivier Lambert.
Na sua intervenção, Olivier Lambert referiu que o financiamento adicional de 150 milhões de dólares (128,3 milhões de euros) iria contribuir para aumentar a cobertura do serviço de abastecimento de água a nove cidades, Lubango (província da Huíla), Ndalatando (Cuanza Norte), Dundo (Lunda Norte), Luena (Moxico), Cuito (Bié), Huambo (Huambo), Malange (Malange) e Uíge (Uíge).
Tratou-se de um financiamento através do International Bank for Reconstruction and Development (IBRD), do grupo Banco Mundial, e visava ainda alargar as actividades de apoio e reforço institucional ao subsector do saneamento, através da implementação de um projecto-piloto, sendo beneficiários 1,2 milhões de pessoas nas nove cidades citadas, com serviços públicos de ligação de água domiciliária.
No que se refere ao Projecto de Desenvolvimento da Agricultura Comercial, Olivier Lambert disse que os 130 milhões de dólares (111,2 milhões de euros) iriam contribuir para o aumento da produtividade e o acesso ao mercado dos beneficiários elegíveis ao longo dos corredores rodoviários Luanda-Bengo-Cuanza Norte-Malange e Luanda-Cuanza Sul-Huambo e norte da Huíla, principais elos de ligação da área agrícola do planalto central aos mais importantes mercados urbanos de Luanda.
“Para além da assistência técnica e do apoio financeiro aos agricultores elegíveis e às pequenas e médias empresas do sector das agro-indústrias nas áreas do projecto, este apoiará as infra-estruturas rurais e um ambiente favorável à agricultura comercial”, referiu o representante do Banco Mundial em Angola, salientando que este projecto deveria dar um forte contributo para a agenda de diversificação económica que, há décadas, o Governo promete implementar.
Segundo Olivier Lambert, este projecto contava ainda com o co-financiamento da Agência Francesa de Desenvolvimento, um empréstimo de 79 milhões de euros.
Por sua vez, o então ministro Archer Mangueira disse que o financiamento ia ajudar o país, que enfrenta há 44 anos o grande desafio da diversificação da economia, ma medida em que são projectos que estão enquadrados no Plano Nacional de Desenvolvimento 2018-2022.
Archer Mangueira salientou que com estes projectos estavam a ser seguidas premissas do Estado, no sentido da captação de financiamentos externos, para colmatar o défice existente de poupança interna.
“Vamos agora pedir aos sectores para que implementem esse projecto com rigor, que criem também capacidades institucionais, que permitam uma gestão eficiente dos recursos que serão postos à disposição”, frisou.
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