As Forças Armadas Cabindesas (FAC) anunciaram hoje em comunicado a morte de 10 soldados, oito angolanos e dois das FAC, durante um ataque a uma unidade das Forças Armadas Angolanas (FAA).
Num “comunicado de guerra”, assinado pelo Chefe Operacional da FLEC-FAC (Frente de Libertação do Estado de Cabinda-Forças Armadas Cabindesas), Futi Bonifácio Edinho, os independentistas falam de “intensos combates” entre as FAC e o exército angolano na região de Massabi.
No ataque à unidade das FAA, “que se preparava para surpreender uma posição das FAC”, ocorrido na aldeia de Chissanga, as forças cabindesas perderam dois combatentes e foram mortos oitos soldados angolanos, tendo outros três ficado feridos. As FAC referem ainda ter recuperado armas automáticas, de lançamento de foguetes e várias munições.
O Ministério da Defesa angolano, como é habitual, não confirmou a informação.
O movimento separatista, que reclama a independência de Cabinda, “província angolana” (segundo o Governo de Luanda) situada a norte e separada geograficamente do país, acusa o Presidente angolano, João Lourenço, de ser “responsável pela instabilidade que reina no enclave, assim como do perigoso agravamento da situação que irá deteriorar nos próximos dias”.
A FLEC-FAC afirma querer há vários anos um “diálogo de paz, honesto e sincero” que o governo angolano rejeita.
O ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República de Angola, Pedro Sebastião, negou, a 15 de Julho, a existência de situações de instabilidade no território, dizendo que Cabinda vive uma “paz efectiva”, apesar de “grupos que possam fazer uma ou outra acção”.
“De vez em quando, muito raramente, aqui e acolá podem surgir grupos que possam fazer uma ou outra acção, não uma acção organizada como tal, a guerrilha tem a particularidade que tão depressa está em paragem como se pode criar um momento de instabilidade”, afirmou, na altura o ministro e general Pedro Sebastião.
Cabinda, onde se concentram a maior parte das reservas petrolíferas do país, não é contígua ao restante território e, desde há muitos anos, que líderes locais defendem a independência, alegando e provando documentalmente uma história colonial autónoma de Luanda.
A FLEC, através do seu “braço armado”, as FAC, luta pela independência daquele território, alegando e provando que o enclave era um protectorado português, tal como ficou estabelecido no Tratado de Simulambuco, assinado em 1885, e não parte integrante do território angolano.
No passado dia 16, a FLEC-FAC saudou o que disse ser o reconhecimento da “existência de guerra” por parte do ministro de Estado, general Pedro Sebastião, que convidou a visitar “as bases militares”.
O movimento independentista reagia às declarações do ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, João Lourenço, que, na véspera, rejeitou situações de instabilidade no território, dizendo que vive uma “paz efectiva”, apesar de “grupos que possam fazer uma ou outra acção”
Recorde-se que o general Pedro Sebastião ingressou em 1973 no exército português e frequentou curso na Escola de Aplicação Militar de Angola (EAMA) e em 1974 desertou e, na cidade de Ponta Negra (Congo), ingressou no MPLA, tendo nesse ano, em Mayombe (Cabinda), participado nas últimas acções militares contra o exército colonizador.
O general Pedro Sebastião disse ainda que as notícias de Cabinda nas redes sociais (pelos vistos engloba jornais digitais no mesmo saco das redes sociais) não correspondem à verdade, levando os independentistas a convidá-lo “a visitar uma das bases militares da FLEC-FAC no interior de Cabinda e longe das fronteiras”.
Os separatistas prometem ainda “garantir a segurança” do general durante a sua permanência de Cabinda e lançam um apelo à população para abster-se “de qualquer manifesto de hostilidade” contra Pedro Sebastião “por ser um dos representantes da potência colonial que ocupa Cabinda”.
No comunicado, assinado pelo porta-voz do Estado-Maior-General das FAC, general António do Rosário Luciano, o movimento saúda “o momento de lucidez” de Pedro Sebastião quando “reconheceu a existência da guerra”, honrando “as famílias angolanas enlutadas” pelos soldados angolanos que morreram em combate.
Salienta ainda que o general “demonstrou desconhecer a realidade da dimensão da guerra”, uma “lacuna” que pretende corrigir, convidando Pedro Sebastião a inteirar-se da realidade, visitando os militares.
“De vez em quando, muito raramente, aqui e acolá podem surgir grupos que possam fazer uma ou outra acção, não uma acção organizada como tal, a guerrilha tem a particularidade que tão depressa está em paragem como se pode criar um momento de instabilidade”, afirmou o general, estribado no seu conhecimento das acções das FAPLA, nas quais exerceu vários cargos, nomeadamente comissário político de Coluna, chefe do Departamento de Agitação e Propaganda da Direcção Política Nacional.
No caso de Cabinda, acrescentou, as notícias divulgadas pelas redes sociais “são coisas que não correspondem à verdade” pois ”há naquele território do nosso país uma paz efectiva”. É, em tudo, uma conclusão similar às que aprendeu enquanto militar do Exército português e que, em plena guerra colonial, referiam-se a Angola como um território com “paz efectiva”.
Pedro Sebastião assinalou que, da mesma forma que surgem na capital do país ou noutros pontos do território, “um ou outro grupo de marginais que desenvolvem uma ou outra acção”, em Cabinda também essa possibilidade pode surgir. Brilhante comparação. Nem João Pinto diria melhor. Por alguma razão o general frequentou, de 1976 a 1978, a Academia Militar Vistrel – na antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
“Daí a considerar instabilidade vai uma distância muito grande”, rematou o general, não necessitando de mostrar a Medalha Comemorativa da Libertação de Mavinga, de Defensores do Cuito Cuanavale e de Mérito na Defesa da Pátria… do MPLA.
No tempo (colonial) em que o general Pedro Sebastião, tal como João Lourenço, frequentaram os liceus, na disciplina Organização Política e Administrativa da Nação (OPAN) apenderam a Constituição Política da República Portuguesa que, logo no início, dizia que “o território de Portugal é o que actualmente lhe pertence e compreende: (…) “Na África Ocidental: arquipélago de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe e suas dependências, S. João Baptista de Ajudá, Cabinda e Angola”.
Quando, em Novembro de 2014, o Ministro da Defesa de Angola, João Lourenço, visitou Cabinda, recomendou que os militares das Forças Armadas Angolanas (FAA) na Região Militar de Cabinda se mantivessem permanentemente vigilantes, visando a preservação da paz, soberania e das instituições do Estado, perante qualquer ameaça.
Foi uma posição no mínimo curiosa. Isto porque, segundo as teses do regime, Cabinda era já nesse tempo uma região há muito pacificada. Pelo que então transpareceu, e o mesmo se passa hoje de acordo com informações obtidas pelo Folha 8, João Lourenço tinha outras informações que podem indiciar duas coisas. Ou a FLEC estava e está de facto viva e disposta, apesar de tudo, a lutar, ou estava em preparação uma – mais uma – caça às bruxas, mesmo que elas não existam.
“A província de Cabinda tem um particular histórico na sua trajectória para a soberania nacional. Daqui saíram grandes combatentes que aprenderam a defender o país não só a província de Cabinda, como noutras regiões de Angola. Para isso, temos em memória muitos desses valorosos combatentes quando ainda a província era II região Militar”, recordou então João Lourenço.
O governante apelou às Forças Armadas em Cabinda para estarem atentas na defesa das fronteiras com os países vizinhos. Sim, porque qualquer acção que eventualmente a FLEC leve a cabo será sempre, do ponto de vista do regime, atribuída a bandos terroristas que se alojam noutros países.
“Temos que estar sempre em prontidão e estado de alerta. É necessário a preparação combativa permanente, para que as nossas fronteiras sejam protegidas e ninguém possa vir molestar a paz que o país tem. Cabe a vós essa missão para a defesa da soberania e integridade territorial”, disse o ministro, quase parecendo que Angola não tem fronteiras com outros países para além das de Cabinda.