A Exem Energy, empresa de Isabel dos Santos e Sindika Dokolo, que detém uma participação indirecta na portuguesa Galp, confirmou ser alvo de inquérito por parte das autoridades holandesas, relacionado com a Sonangol, mas garante nada dever à petrolífera angolana.
Em resposta à Lusa, após o jornal holandês “De Volkskrant” noticiar que o Ministério Público da Holanda está a investigar a empresa do marido de Isabel dos Santos, Sindika Dokolo, através da qual a filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos é accionista indirecta da Galp, fonte oficial da Exem Energy confirmou a informação, sublinhando que o inquérito é “bem-vindo” e será uma oportunidade para “esclarecer várias falsidades e alegações infundadas”.
Segundo a Exem, o inquérito pretende averiguar se existem relações familiares que possam ter influenciado a celebração de contratos, parcerias ou relações comerciais entre esta ou outras relacionadas com Sindika Dokolo e a Sonangol, na altura em que Manuel Vicente era presidente do Conselho de Administração da petrolífera do regime.
A Exem é accionista de 40% da Esperaza Holding, na qual a Sonangol detém 60%. A ‘joint venture’ detém 45% da Amorim Energia que, por sua vez, é accionista de referência da Galp.
A Exem afirma que acordou o investimento e a participação na Galp com Américo Amorim em 2005 tendo pago as suas acções na Esperaza, no valor aproximado de 75 milhões de euros, em duas parcelas: 11,5 milhões de euros pagos na assinatura do contrato e 64 milhões de euros mais juros pagos em Outubro de 2017, em kwanzas, ao câmbio do dia, “nada devendo à Sonangol pela entrada no capital da Esperaza e desta na Galp”.
De acordo com a mesma fonte, o pagamento em kwanzas foi feito na sequência de um acordo celebrado entre as duas accionistas da Esperaza (Exem e Sonangol), em antecipar o pagamento da dívida para Outubro de 2017, uma vez que a dívida remanescente apenas vencia em Dezembro de 2017.
Isabel dos Santos, que foi presidente da petrolífera durante cerca de 18 meses até ser exonerada pelo sucessor de José Eduardo dos Santos, João Lourenço, terá tentado fazer o pagamento da dívida da Exem em kwanzas o que foi rejeitado pelo novo presidente da Sonangol.
Carlos Saturnino “fez a devolução dos valores, indicando não aceitar kwanzas, e informando pretender receber o valor em euros, uma afirmação contrária à prática de pagamentos recebidos pela Sonangol na altura, de outras entidades”, alega a Exem.
As autoridades judiciais angolanas contrariam esta versão e sustentam que a Esperaza foi financiada em 100% pela Sonangol, num total de mais de 193 milhões de euros, tendo emprestado à Exem Energy 75.075.880 euros, valores não devolvidos até à data.
“Houve uma tentativa de pagamento da dívida por parte dos requeridos em kwanzas, facto que foi rejeitado, em virtude de a dívida ter sido contraída em euros e esta cláusula resultar do próprio contrato”, segundo a Procuradoria-Geral da República angolana.
A Exem defende, por seu lado, que tendo a Sonangol concordado em receber o pagamento em kwanzas ao câmbio actualizado, “não se entendeu a razão da devolução do dinheiro, o que gerou um litígio entre as partes, estando a decorrer uma arbitragem na Holanda”.
A empresária, o marido e o gestor e ex-presidente do Conselho de Administração do Banco de Fomento Angola, Mário Leite Silva, viram as suas contas bancárias e participações sociais em várias empresas serem alvo de arresto em Dezembro de 2018, por ordem do Tribunal Provincial de Luanda.
A medida, segundo um comunicado da Procuradoria-Geral da República divulgado na altura, surgiu na sequência de uma acção intentada pelo Serviço Nacional de Recuperação de Activos.
A notícia do jornal holandês foi partilhada no sábado na página da plataforma social Twitter de Rui Pinto, que esteve na origem das revelações do escândalo Luanda Leaks, através da PPLAAF, uma plataforma para denunciantes com sede em França.
O Luanda Leaks refere-se a uma investigação de um consórcio internacional de jornalistas de investigação (ICIJ), que revelou, através do acesso a mais de 715 mil ficheiros, os supostos esquemas financeiros de Isabel dos Santos e Sindika Dokolo, que permitiram retirar milhões de dólares ao erário público angolano através de paraísos fiscais.
Como se pode verificar, não existem fundadas razões para o Ministério Público impor o pagamento em moeda externa, quando, inclusive, o art.º 550.º (Princípio nominalista) do Código Civil diz: “O cumprimento das obrigações pecuniárias faz-se em moeda que tenha curso legal no país à data em que foi efectuada e pelo valor nominal que a moeda nesse momento tiver, salvo, estipulação em contrário”.
Isabel dos Santos também afirmou “que em Julho de 2017, a Sonangol se encontrava numa situação financeira crítica e o PCE da Sonangol Eng.º Paulino Jerónimo solicitou à Exem o pagamento antecipado do contrato, aceitando e indicando Kwanzas como moeda para pagamento uma vez a Sonangol ter necessidade urgente de kwanzas para as cash calls em dívida a empresas petrolíferas estrangeiras (…) A Exem e a Sonangol haviam assim chegado a um acordo em meados de 2017 que permitiu que a Sonangol recebesse antecipadamente e a ExemM pagasse em kwanzas, em Outubro de 2017. (…) Em Janeiro 2018, o então PCA da Sonangol, Carlos Saturnino, deu ordens para que se procedesse à devolução dos valores pagos pela Exem, depois de decorridos já 4 meses desde a sua transferência”. Iniciou-se, por via disso, “um litígio entre a Exem e a Sonangol na Holanda, no âmbito do qual os advogados da Sinangol (…) reconheceram que o pagamento havia sido feito pela Exem”.
Ademais a medida do Banco Nacional de Angola, cunhada pelo Titular do Poder Executivo, institucionalizou a “kwanzalização” dos pagamentos, no país, incluindo os das empresas e associadas petrolíferas.
Folha 8 com Lusa