Constitucional “admite” PRA-JA

O Tribunal Constitucional, pese os avanços e recuos e a tendência congénita de torcer para o lado partidocrata, parece começar a querer redimir-se de uma visão contrária ao Direito. Admite-se que seja difícil acreditar numa inversão, mas ao menos está a tentar dar um ar de abertura a alegações contrárias. Veremos se é para inglês ver ou se, de facto, o primado do Direito é superior.

Positivo ou negativo a verdade é a de ter aceite a última interposição de recurso interposto pela equipa de advogados do PRA-JA, que pela primeira vez “desafiou” o Constitucional a sair do olhar altruísta e divino, para uma mais justa e linear interpretação da hermenêutica jurídico-constitucional.

Não era normal (embora fosse juridicamente correcto) as pessoas, advogados, juízes questionarem os acórdãos deste Tribunal, como se estes fossem exímios e irrepreensíveis textos do processo constitucional. Em muitos casos violavam flagrantemente a Constituição e a Lei e tinha assentamento por uma denominada, segundo o jurista William Tonet, “Regra de Inacção”, que significa os fazedores da justiça conformarem-se mesmo se diante de leis e decisões injustas, quando a ciência jurídica diz que todas as decisões, qualquer que seja a magistratura da instância, podem ser alvo de escrutínio, logo de recursos, havendo neles factores desviantes, o imperativo é a aplicação do princípio da inconformidade.

O Tribunal Constitucional tinha rejeitado o “recurso extraordinário de inconstitucionalidade” submetido pela Comissão Instaladora do projecto político PRA-JA Servir Angola, liderado por Abel Chivukuvuku, por “não suprir insuficiências” e tornar “indecifrável” o seu pedido.

Segundo o Despacho de Rejeição de 27 de Agosto de 2020 do TC, o inicialmente denominado “Recurso Extraordinário por Violação” interposto pelo PRA-JA Servir Angola ao invés de suprir insuficiências “demonstra uma intenção clara de confundir o Constitucional”.

O TC observava que o recurso da Comissão Instaladora do Partido do Renascimento Angolano – Juntos por Angola – Servir Angola, com a sigla PRA-JA Servir Angola, que denominou Extraordinário por Violação “não existe no ordenamento jurídico angolano” e em cinco dias a referida comissão trocou para “recurso extraordinário de inconstitucionalidade”.

Os advogados da comissão instaladora do PRA-JA entregaram no dia 25.08.20, no Tribunal Constitucional, os documentos solicitados por este órgão para suprir e esclarecer novas (que se seguiram às anteriores novas, e às anteriores às anteriores) dúvidas no seu processo de legalização.

E de dúvidas em dúvidas, até a dúvida final, o Tribunal Constitucional ao instar os recorrentes explicou a sua visão, por sinal ortodoxa, face à interpretação de um artigo citado, como mais adiante se verá: “Os Recursos de inconstitucionalidade, ordinários e extraordinários, só podem ser interpostos em relação às sentenças dos tribunais comuns e demais tribunais e não do próprio Tribunal Constitucional, conforme disposto no artigo 49.º da LPC”.

Esta visão vinda da parte da juíza conselheira Guilhermina Prata constitui uma heresia por desvirtuar não só o sentido da norma jurídica, como também colocar os juízes do Tribunal Constitucional como se fossem as únicas eminências do saber jurídico-constitucional, o que seguramente, pela fraca produção de muitos acórdãos, a grande maioria, pelo menos não o é. Mais grave ainda é o facto do artigo 49.º LPC, referenciado pela juíza, não ser literal, nem enquadrar, no seu corpo a exclusão, peremptória do Tribunal Constitucional, pelo que constitui falsidade jurídica, tal alusão.

O artigo tem uma contracção “e”, que no bom rigor não pode ser descurada, em qualquer interpretação, por juiz e jurista comprometido com a verdade e honestidade jurídica: Artigo 49.º (Âmbito do recurso): “O recurso extraordinário de inconstitucionalidade tratado na presente secção só pode ser interposto após prévio esgotamento nos tribunais comuns e demais tribunais, dos recursos ordinários legalmente previstos”.

E é neste “e” que repousa, no caso o Tribunal Constitucional, por ter sido nele, na jurisdição de Tribunal eleitoral e político partidário o palco de toda a demanda, com dispensa de outro(s).

É este o princípio a legitimar a pretensão e ousadia dos advogados do PRA-JA em darem solenidade a norma jurídica, por ter ela andado em sentido contrário, com a introdução de factos novos, que não constavam da acusação inicial.

Neste caso o juiz extrapolou e saiu do quadro da demanda, optando por sentença adesão, ao introduzir, por exemplo, carta das administrações municipais do Libolo e do Kilamba Kiaxi, sob alegação de haver cidadãos a reivindicar não terem feito inscrição no PRA-JA. Ora aqui a porca torce o rabo, como é que estes cidadãos souberam do seu nome constar nos processos da Comissão Instaladora, quando o Tribunal Constitucional, com dolo, violou, discriminadamente, o n.º 5 do art.º 14.º da Lei 22/10 de 03 de Dezembro – Lei dos Partidos Políticos: “Os nomes dos subscritores cujas assinaturas tenham sido consideradas válidas devem ser publicadas em editais, em todas as capitais de províncias do País”, como se verifica a omissão é também danosa, por prejudicar cidadãos, cujo objectivo é, no quadro da Constituição, art.º 17.º CRA, constituir uma formação política.

O advogado da Comissão Instaladora entregou o Requerimento com os melhoramentos solicitados, pelo TC, na expectativa de ser admitido e poderem ser apresentadas as alegações de recurso.

Isto, presume-se, se o tribunal cumprir e respeitar as regras de um Estado de Direito o que, acrescente-se, nunca é certo que aconteça.

Esperava-se que o (a) novo(a) juiz(a) ou o Plenário, não optasse, mais uma vez, pelo Princípio do Inquisitório que não tem consagração constitucional, uma vez ser peremptório o Princípio do Acusatório, no n.º 2 do art.º 174.º CRA: “No exercício da função jurisdicional, compete aos tribunais dirimir conflitos de interesses público ou privado, assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, bem como os princípios do acusatório e do contraditório e reprimir as violações da legalidade democrática”. Como se vê, nesta estrada não cabem dúvidas.

Isso na convicção de que os juízes sabem que a Lei e, já agora, a Constituição, quando falam dos direitos do “corredor de fundo” não estão a falar dos direitos do “fundo do corredor”.

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