A analista política Sizaltina Cutaia considerou hoje que o processo de não legalização do PRA-JA Servir Angola, projecto político de Abel Chivukuvuku, “levanta várias suspeições” pondo em causa o sistema (que deveria ser) de justiça.
“L evanta várias suspeições, que não abonam em nada a compreensão (dos cidadãos) e o próprio sistema de justiça”, afirmou à Lusa Sizaltina Cutaia questionada sobre a legalização do PRA-JA
O Partido de Renascimento Angolano — Juntos por Angola Servir Angola (PRA-JA Servir Angola) liderado por Abel Chivukuvuku (ex dirigente da CASA-CE e da UNITA) viu recentemente rejeitada a sua pretensão de se constituir como partido pelo plenário do Tribunal Constitucional (do MPLA), depois de vários outros “chumbos”.
A formação política tem ainda como última possibilidade de contestação um recurso extraordinário.
“Obviamente que a Comissão Instaladora ainda tem a possibilidade de recorrer, vai fazer esse recurso extraordinário de inconstitucionalidade e esperar que prevaleça algum bom senso no sentido de que a decisão tomada pelo plenário do TC ainda possa ser revertida”, disse a analista, salientando, no entanto, ter dificuldade em acreditar numa decisão diferente do tribunal.
A também defensora de direitos cívicos e representante da Fundação Open Society Angola (OSISA) afirmou que a situação do PRA-JA Servir Angola não pode ser vista como um problema individual “ou que afecta aquele grupo de cidadãos”, porque “tem a ver com os pilares da democracia”.
Para si, a forma como este processo tem sido conduzido, faz com que a confiança dos cidadãos sobre aquela instituição de (suposta) justiça “fique minada, fique afectada pela negativa”.
“Sinceramente tenho alguma dificuldade, estava muito confiante de que o plenário do TC fosse reverter a decisão que, em sede administrativa, foi tomada pelo juiz presidente do tribunal, mas quando saiu o acórdão deixei de ter esperanças que, realmente, alguma coisa diferente possa acontecer”, afirmou em relação ao recurso extraordinário.
Considerou, todavia, que “é importante não desistirem, que continuem a buscar justiça”. É quase uma missão impossível buscar algo que, por só existir no Estado de Direito, não existe no reino do MPLA/João Lourenço.
Instada a comentar o que estará a travar a legalização do PRA-JA Servir Angola, Sizaltina Cutaia opinou que é a dificuldade de o Movimento de Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido no poder desde 1975, aceitar a contestação por parte de outras forças. O que, aliás, é normal num regime que não é de partido único mas que é de único partido.
“Nós gostamos muito de dizer que houve uma transição, que está a haver uma reforma, mas de facto a estrutura política que governa o país desde 1975 nunca se alterou, a dificuldade que o MPLA tem de lidar com as vozes contrárias permanece a mesma”, salientou, criticando a indiferença ao assunto “do grosso da oposição”, que “se cala diante de um caso tão sério como esse do PRA-JA”.
A analista política, que defende uma revisão da Constituição da República, que altere, entre outras questões os modelos de contestação, não crê que a legalização do projecto de Abel Chivukuvuku esteja condicionada apenas pelo político, até por que o PRA-JA Servir Angola congrega várias sensibilidades, nomeadamente “pessoas que estão desencantadas com o MPLA, com a oposição até e pessoas que nunca se tinham envolvido em política, a juventude”.
“Isso constitui um elemento que abala de certa forma o poder estabelecido, mas é pena, porque a beleza da democracia está mesmo na multiplicidade de apoios, de vozes, para que possamos construir uma Angola que seja de todos e para todos”, sublinhou.
Na sexta-feira, o presidente da Comissão Instaladora do PRA-JA Servir Angola, Abel Chivukuvuku, anunciou que, além do último recurso interno, está também sobre a mesa a possibilidade de recurso às instâncias internacionais.
Segundo Sizaltina Cutaia, para que se recorra aos tribunais internacionais é preciso que se esgotem todos os recursos internos e que a decisão permaneça desfavorável ao projecto político de Abel Chivukuvuku, que até Fevereiro de 2019 foi líder da Convergência Ampla de Salvação de Angola — Coligação Eleitoral (CASA-CE), a segunda maior força da oposição angolana.
Depois de destituído da liderança da CASA-CE, por problemas internos, Abel Chivukuvuku deu início a um novo projecto político, cujo processo de legalização teve início em Agosto de 2019, e viu como primeira dificuldade o tribunal determinar a alteração da sigla (PRA-JA), por alegadamente “violar o princípio da não confundibilidade com a sigla PRJA”, tendo a questão sido ultrapassada com a junção das palavras “Servir Angola”.
Na mesma altura chegou a pensar-se que o mesmo tribunal iria obrigar a UNITA a mudar de nome por, é claro, se confundir com o nome da operadora UNITel…
Para a legalização do PRA-JA Servir Angola foram apresentadas 23.492 declarações de aceitação, das 7.500 assinaturas exigidas por lei, contudo, o tribunal concluiu que apenas 3.997 estavam conformes e a restantes apresentavam problemas relacionados com os atestados de residência, dos bilhetes de identidade, entre outros.
Recorde-se que no passado dia 23 de Julho, apoiantes de Albel Chivukuvuku foram detidos e agredidos em Luanda por agentes da Polícia Nacional (do MPLA), quando tentavam marchar em protesto contra a terceira rejeição, na véspera, pelo Tribunal Constitucional (do MPLA) de legalizar o seu projecto político PRA-JA.
De facto, reconheça-se, para que é que Angola precisa de uma democracia com vários partidos se, como todos sabemos há 45 anos, basta ter uma democracia de um só partido, sendo que para dar cor à comédia parlamentar existem alguns figurantes que gostam de dizer que são opositores?
Será que os autóctones de segunda categoria (todos os que não são do MPLA), escravos ao serviço da monarquia de João Lourenço, ainda não perceberam que o MPLA tem nua sua génese o objectivo de ficar no poder, de forma ininterrupta, 100 anos, pelo que todos os angolanos que não são do MPLA terão de esperar pelo menos mais 55 anos?
Folha 8 com Lusa