O responsável no Banco Europeu de Investimento (BEI) pelo financiamento de projectos disse hoje que o facto de a família do ex-Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, estar muito envolvida na economia, impossibilitou a realização de operações no país. Nada como ser corajoso quando o “inimigo” cai do pedestal. Para além de ser… mentira.
Em declarações à Lusa, à margem de uma conferência “Financing Investment in Africa”, realizada em parceria com o Banco Europeu de Investimento (BEI) e a SOFID – Sociedade para o Desenvolvimento do Financiamento, que decorreu em Lisboa, Brunno Maradei acrescentou que esse cenário já acontece com o novo executivo, liderado desde Setembro de 2017 pelo Presidente João Lourenço.
“Não podemos trabalhar muito com pessoas politicamente expostas, isso dificulta o processo; como a família dos Santos estava muito presente na economia angolana até há pouco tempo, é difícil encontrar as companhias certas para trabalhar de uma maneira liberal”, disse Brunno Maradei.
“Uma das coisas com que nos preocupamos é o sistema de contratação, ou seja, se o BEI financia um projecto, vai querer saber se o projecto vai ser contratado ao abrigo das leis de mercado, queremos ver um processo competitivo, no mínimo, para as empresas europeias, mas idealmente para todas as companhias internacionais”, disse Brunno Maradei.
“Tem de haver um processo competitivo, ser uma coisa justa, e seguindo as leis da União Europeia, e isso não estava a acontecer muito em Angola, os angolanos não queriam abrir o seu mercado às companhias europeias, e isso causava-nos um problema, porque não podemos financiar esse tipo de projectos”, acrescentou o responsável.
Desde a entrada em funções do novo Governo do Presidente João Lourenço, o panorama mudou, disse Brunno Maradei: “Isso já mudou bastante, eles estão a conversar com a nossa delegação europeia, a dizer que querem fazer esse tipo de contratação aberta, internacional, num processo competitivo, e assim podemos participar muito mais nesse tipo de projectos”, salientou.
Questionado sobre os montantes e os limites para os empréstimos, o responsável no BEI pelo ‘project finance’ disse que não há limites por país: “Em ‘project finance’, começamos nos 10 milhões de euros mas podemos subir até 40, ou 70, ou mesmo 150, dependendo da qualidade de crédito do projecto, mas não há um limite para o país”, vincou.
De acordo com os dados divulgados na conferência que decorreu no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, o BEI investiu, no ano passado, cerca de 3,3 mil milhões de euros no continente africano, divididos sensivelmente ao meio entre o norte de África e a África subsaariana, sendo que a divisão entre o sector público e o sector privado é também sensivelmente pela metade.
O BEI é uma instituição multilateral de financiamento, actuando com o implementador da política externa da União Europeia, tendo como principais objectivos para os investimentos aliviar a pobreza e criar emprego.
Terá sido mesmo assim?
Vejamos um exemplo. O BEI financiou com 20 milhões de euros um projecto da TV Cabo Angola para disponibilizar acesso a internet de alta velocidade em várias cidades angolanas, segundo o acordado no dia 28 de Abril de 2015. Será que nesse ano já não era José Eduardo dos Santos o Presidente?
Segundo informação divulgada na altura pelo próprio BEI (banco detido pelos estados-membros da União Europeia), tratou-se de um empréstimo de longo prazo, o segundo concedido desde 2006 pelo BEI à TV Cabo Angola, empresa participada pelo grupo português Visabeira Global.
Depois de instalada, a nova rede iria permitir o acesso de escolas, hospitais, Organizações Não Governamentais, departamentos públicos e clientes privados a “serviços avançados de telecomunicações e internet”, explicava a mesma nota. O empréstimo visava financiar um projecto para fornecer internet de alta velocidade a clientes privados, empresas e administração pública, através do alargamento da rede em Luanda, Benguela e Lobito, e da instalação de uma nova rede de fibra óptica nas cidades de Lubango, Huambo, Cabinda e Soyo.
“As novas ligações não vão servir apenas para aumentar as conexões entre Angola e o resto do mundo, mas também vão fornecer novas oportunidades para negócios e utilizadores privados, além de melhorar o sector dos serviços públicos”, admitiu na altura Pim van Ballekom, vice-presidente do BEI, citado na informação então divulgada.
Já a presidente da TV Cabo Angola, o único operador de conteúdos e dados (televisão, internet e voz) por cabo do país, afirmou tratar-se de um empréstimo que demonstra a “confiança” da instituição neste projecto. Naiole dos Santos Guedes assegurava que a actividade da empresa tem permitido fomentar a “sociedade da informação” em Angola, além da criação de “empregos qualificados” e do apoio ao desenvolvimento do país.
O BEI garantia na altura e ter concedido mais de 2,5 mil milhões de euros de empréstimos para investimento público e privado em todo o continente africano em 2014.
Folha 8 com Lusa