Pedro Sebastião tentou implodir a reconciliação

A UNITA considerou hoje que o general Pedro Sebastião, ministro de Estado e da Casa de Segurança do Presidente da República de Angola, “não está à altura” do processo de reconciliação nacional em curso no país. E João Lourenço estará? Quanto a nós, achamos que não. Se estivesse teria já demitido Pedro Sebastião.

A acusação, que aliás corresponde ao sentimento de muitos angolanos, foi feita pelo porta-voz da UNITA, Alcides Sakala, enquanto se aguardava, no Andulo, pela trasladação do corpo do líder histórico e fundador do partido, entretanto transferido para a morgue do hospital local.

Em causa está o processo de trasladação dos restos mortais do fundador da UNITA, morto em combate em Fevereiro de 2002, em que Pedro Sebastião, também presidente da comissão multissectorial tripartida encarregada pelo Presidente João Lourenço em Agosto de 2018 de tratar das exéquias fúnebres de Savimbi, ter, segundo o Galo Negro, criado polémica “desnecessária” na fase final do processo.

Polémica que, na sua génese, revela um odioso ressabiamento conta a UNITA e Jonas Savimbi, eventualmente com raízes no tempo e que o general Pedro Sebastião integrou o exército colonial português.

Terça-feira, a família de Savimbi e toda a direcção da UNITA aguardaram durante todo o dia, em vão, pela chegada ao Cuíto, capital do Bié, dos restos mortais do fundador do Galo Negro, sepultado e sequestrado há 17 anos no cemitério do Luena (capital da província do Moxico), sempre sob controlo do MPLA.

Junto com mais de cinco mil apoiantes da UNITA, todos aguardavam que Pedro Sebastião regressasse do Moxico com o corpo, mas a urna seguiu directamente para o Andulo, onde foi hoje formalmente entregue à família e ao partido.

Quarta-feira, por seu lado, Pedro Sebastião garantiu que cumpriu o que estava programado (colando, assim, João Lourenço à sua estratégia de humilhação) e acusou a UNITA de querer “tirar dividendos políticos” da situação, considerando ainda não compreender o comportamento do partido liderado por Isaías Samakuva.

No mesmo dia, o líder da UNITA escreveu uma carta a João Lourenço a solicitar-lhe uma audiência para que, em nome da reconciliação nacional em curso, se pudesse esclarecer o assunto, de forma a que o funeral de Savimbi pudesse concretizar-se amanhã, sábado, na pequena localidade de Lopitanga, a 30 quilómetros do Andulo. Para isso, o corpo teria de ser entregue antes.

Da reunião entre João Lourenço, Isaías Samakuva e Durão Sakaíta, filho primogénito de Savimbi, saiu “luz verde” para a entrega dos restos mortais do fundador da UNITA, o que viria a acontecer hoje durante toda a manhã, com a urna a ser formalmente entregue às 14:30.

Alcides Sakala, nas declarações aos jornalistas, a meio da manhã, e questionado sobre se o incidente “belisca” o processo de reconciliação nacional no país, admitiu que afecta “um pouco”, uma vez que o processo “tem de ser feito com actores à altura”. E, na verdade, Pedro Sebastião seria um actor à altura se se tratasse de uma palhaçada (sem ofensa para os verdadeiros e dignos palhaços).

“Belisca um bocado, mas o processo tem de ser feito com actores que estão à altura deste processo”, vincou Sakala.

Pedro Sebastião, disse, “não [está à altura] pelo seu discurso e pelo seu posicionamento. Angola viveu décadas de conflito. Somos parte desta geração que desde a independência só conheceu conflitos. Agora há uma fase nova. Há um novo paradigma que parece abrir-se e é nessa perspectiva que aqueles que querem animar o debate da reconciliação nacional têm de ser encorajados”.

Questionado se, à semelhança do que se passou no ano passado entre Portugal e Angola, a questão pode ser considerada um “irritante” nas relações entre o Governo e a UNITA, Alcides Sakala evocou outra vez o nome de Pedro Sebastião.

“O irritante penso que ficou com o general Pedro Sebastião, que sai um bocado beliscado deste processo. Mas são nos encontros que é preciso ultrapassá-los [os ‘irritantes]. Angola tem desafios enormes na procura de caminhos para a reconciliação nacional”, frisou.

No entanto, sublinhou Alcides Sakala, o assunto ficou “ultrapassado” com a reunião mantida com João Lourenço.

“O assunto está encerrado. O essencial, o fundamental agora, é darmos continuidade a um programa já gizado em Janeiro deste ano e que o grupo de dirigentes da UNITA e da família são os mesmos O que começou Bem deve acabar bem. O funeral será amanhã [sábado] em Lopitanga”, acrescentou.

O porta-voz da UNITA também garantiu que não haverá mais discussões sobre o tema.

“Do nosso lado temos experiência e estamos muito acima dessas questões. O importante é mantermos o foco na missão que nos trouxe aqui”, observou, referindo que a UNITA não vai comentar a ideia de que Pedro Sebastião poderá ter desrespeitado João Lourenço e que, por essa razão, deverá ser demitido.

Por fim, Alcides Sakala desdramatizou o facto de o Presidente angolano ir participar sábado numa cerimónia parecida com a de Savimbi, ligada ao antigo presidente democrático congolês, Etiénne Tshisekedi, falecido a 1 de Fevereiro de 2017 na Bélgica, e não no do líder histórico da UNITA.

O Presidente da República “tem naturalmente a sua agenda. Não interferimos. É a agenda do PR. Nós temos o nosso programa, que vai chegar agora ao fim, com o enterro” de Savimbi.

Folha 8 com Lusa

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