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O ministro das Relações Exteriores de Angola, Manuel Augusto, defendeu hoje, em Luanda, uma “diplomacia com impacto real na economia e na sociedade angolana”, tendo em vista a captação de mais investimento estrangeiro para o país. Limitou-se, como bom bajulador, a repetir as ideias de João Lourenço apresentadas, por exemplo, em 15 de Outubro de 2018 na Assembleia Nacional.

No discurso de abertura do VIII Conselho Consultivo do Ministério das Relações Exteriores (MIREX), sob o lema “Reforma e Formação: Uma Visão Virada para o Futuro”, Manuel Augusto considerou fundamental que se opte por uma diplomacia “proactiva e focada na diversificação económica nacional”.

O chefe da diplomacia angolana referiu-se à necessidade de o país apostar mais no ingresso de quadros angolanos nos órgãos de decisão das diferentes organizações internacionais e regionais, considerando “indispensável a dinamização das relações” com as comunidades angolanas no exterior, sobretudo – é claro – as que se sabe serem afectas ao MPLA, na versão João Lourenço.

Nesse sentido, traçou como metas imediatas a efectivação do programa especial de registo civil, sobretudo nos países fronteiriços, a fim de assegurar a participação da diáspora no desenvolvimento do país.

Perante os directores dos órgãos executivos centrais, embaixadores, cônsules e chefes de departamento, Manuel Augusto salientou que o MIREX continua a dedicar atenção à conclusão dos acordos de promoção e protecção recíproca de investimentos, à semelhança do que já foi feito recentemente com Portugal.

Segundo o chefe da diplomacia angolana, o objectivo, entre outros factores, é “evitar” a dupla tributação nos investimentos, criar um ambiente de negócios de “confiança”, bem como “consolidar” parcerias para concretizar os programas do Executivo angolano.

No quadro bilateral, Manuel Augusto realçou a importância da eliminação dos constrangimentos, “ainda existentes”, na concessão de vistos, sobretudo aos empresários, e apelou aos chefes de missão para uma gestão “responsável e transparente” do dinheiro público.

No dia 15 de Outubro de 2018, embora o discurso de João Lourenço, na Assembleia Nacional, não tenha sido sobre o estado da Nação mas, antes, sobre a Nação do Estado/MPLA, bem como para chinês (entre outros credores) ver, o Presidente da República conseguiu com extrema facilidade, no contexto da opinião pública, atirar os outros partidos (falar de oposição é um manifesto exagero) ao tapete.

Não que a UNITA e a CASA-CE não tenham dito algumas verdades que, contudo, foram ofuscadas pelo idolatria de alguma comunicação social (sobretudo estrangeira) em relação a João Lourenço, bem como pela incapacidade da oposição perceber quando, como e em que moldes deveria desmontar o discurso de João Lourenço.

A UNITA e CASA-CE, as principais forças da suposta oposição e que decoram a Assembleia Nacional, consideraram “interessante” e “bom” o detalhe da informação anunciada pelo Presidente da República sobre os empréstimos obtidos no exterior, que garantiram ao país 10 mil milhões de euros. Pelos vistos esgotaram todas as munições a atacar José Eduardo dos Santos que, agora, só lhes restam meia dúzia da canhangulos.

O chefe de Estado, que discursava na abertura da segunda sessão legislativa da IV legislatura da Assembleia Nacional, disse que a “intensa e a inédita” campanha de diplomacia económica (a tal de que hoje falou Manuel Augusto) que realizou em 2018 já garantiu financiamentos no valor de 10 mil milhões de euros, o que permitirá recolher frutos nos próximos anos para garantir o desenvolvimento do país.

Em reacção ao discurso, o líder da bancada parlamentar da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, engoliu em seco e não teve outro remédio do que elogiar o “esforço” feito pelo Presidente, em reposta a algumas questões que o seu partido havia colocado.

Contudo, Adalberto da Costa Júnior referiu que todo o valor descrito pelo chefe de Estado angolano “é só para pagar dívidas”.

“O cumprimento do serviço da dívida, que o Presidente da República não falou aqui, é muito alto, é superior a 30 mil milhões de dólares. Ora, o serviço da dívida tem de ser cumprido, aqueles 11 vírgula qualquer coisa mil milhões [11,2 mil milhões de dólares] que foram ditos estão a fazer o cumprimento do serviço da dívida, mas à margem daquilo que o orçamento permite”, frisou.

“Achei muito interessante o detalhe daqueles empréstimos no plano internacional, foi um desafio que lhe foi lançado e, neste desafio, João Lourenço fez um esforço para responder algumas questões”, acrescentou.

Por seu turno, o então líder da CASA-CE (entretanto “assassinado” pelas costas pelos seus correligionários), Abel Chivukuvuku, considerou “mau sinal” os empréstimos contraídos por Angola, “porque são dívidas e amanhã serão pagas pelos angolanos, com juros e em situações mais difíceis”.

“Não é bom. Ninguém pense que esses dinheiros das dívidas vêm assim para Angola, não! A dívida alemã é para irmos lá buscar máquinas, o dinheiro não vem para aqui, as linhas de crédito portuguesas são para as empresas portuguesas, que vêm prestar serviços em Angola. O dinheiro não vem para aqui, é bom, porque nos ajuda a resolver alguns problemas, mas é um problema que estamos a criar para as gerações futuras, vindouras”, sublinhou.

Para o então líder da segunda maior força política da oposição, o ideal seria que Angola tivesse capacidade de construir o país com os seus próprios recursos e não endividar-se.

“O facto de João Lourenço ter dito, explicado de forma pormenorizada, é bom, mas que ninguém crie a perspectiva e a expectativa de que a vida ficará mais fácil. Não vai ficar, porque vamos ter de pagar aquilo com juros. Muita parte do dinheiro não vem para Angola, fica para as empresas estrangeiras”, frisou.

“Em termos de política orçamental, os excedentes não podem ser utilizados sem a aprovação da Assembleia Nacional, o que aconteceu”, disse Abel Chivukuvuku, para o facto de o Presidente ter anunciado o uso de 4.000 milhões de dólares provenientes do diferencial positivo da exportação de petróleo, “que serviram para fazer face à dívida interna titulada”.

Abel Chivukuvuku entendeu que ainda que não era importante fazer-se um balanço neste momento, em que o Presidente da República “teve um ano bastante difícil”, desde logo com a afirmação da autoridade, alcançada no congresso extraordinário, em Setembro, do MPLA, partido no poder.

“Foi um ano de aprendizagem. Mas também, em certa medida, foi um ano de lançamento do esforço da luta contra a corrupção. Mas há muito a fazer, em primeiro lugar, a vida das populações piorou”, frisou.

No discurso, João Lourenço salientou que a diversificação económica é “um imperativo nacional” e lembrou que, nas visitas que efectuou ao estrangeiro, conseguiram-se garantias de investimento e de financiamento da economia angolana que, além dos montantes de 10 mil milhões de euros, há que contar também com as “intenções” de apoio financeiro a investimentos no país.

“Fizemos uma verdadeira diplomacia económica”, resumiu o Presidente angolano, lembrando as visitas a França, Alemanha e China e os apoios financeiros de Portugal e Reino Unido, além da disponibilidade de linhas de crédito de várias instituições bancárias internacionais.

O que Abel Chivukuvuku disse é (muito mais do que o que foi dito por Adalberto da Costa Júnior), de facto, uma sintética mas assertiva e demolidora análise ao (mau) estado da Nação. No entanto, o que fica para a história (escrita em mandarim, inglês, alemão etc.) é o discurso de João Lourenço e, agora, a tentativa de Chivukuvuku reagrupar as suas “tropas” e formar um novo “exército”.

Folha 8 com Lusa

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