Os “DIPianos” e alguns “ERCAnianos” não perderam tempo. Mal se soube que Adalberto da Costa Júnior seria o próximo líder da UNITA colocaram os seus sipaios a comentar nas redes sociais (dezenas deles foram banidos do nosso Facebook) que ele era o candidato dos portugueses, dos colonialistas. A crítica, acéfala e racista, foi motivada pelo facto de ele ter estado muitos anos em Portugal. Ora, como se sabe, isso só não é crime se for praticado por quem for do MPLA. Não foi o caso.
Então, recorde-se que o presidente do grupo parlamentar da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, criticou no dia 12 de Setembro de 2019 os “novos latifúndios” que limitam o acesso das populações à terra e à água, e destacou que o desrespeito pelos povos autóctones é agora maior do que nos tempos coloniais. As verdades, para além de duras como punhais, são eternas…
Falando aos jornalistas no último dia de visita dos deputados da UNITA à província da Huíla, no âmbito das VIII Jornadas Parlamentares do partido do “Galo Negro”, Adalberto da Costa Júnior salientou a importância de se “encontrar respostas que vêm da experiência local” e lamentou o desrespeito pelas populações.
“Ficou-nos a indicação de que, no tempo colonial, apesar de ter sido no tempo colonial, houve um respeito pelas populações autóctones. Este respeito praticamente desapareceu hoje”, afirmou Adalberto da Costa Júnior, responsabilizando “os novos latifúndios” pelo desrespeito dos “donos da terra” e das comunidades locais, por limitarem o acesso às águas e às suas fontes de sobrevivência.
O dirigente da bancada da UNITA, maior partido da oposição que o MPLA (ainda) permite, criticou a “sobreposição” entre actividades empresariais e políticas e “entre o latifúndio e o governante”, e reiterou a necessidade de declarar a situação de emergência humanitária nas províncias do sul de Angola devido à seca.
Adalberto da Costa Júnior pediu ao Governo para “fazer mais do que está a fazer”, salientando que das 35 mil toneladas de bens que seriam necessários por mês para acudir à população apenas mil estão a chegar, pelo que as respostas do executivo “não são as que as pessoas precisam”.
Do contacto dos deputados com a população e dirigentes locais registaram-se, também, preocupações com a saúde, desemprego e educação.
O então líder parlamentar da UNITA não poupou críticas ao governador da Huíla, Luís da Fonseca Nunes, que não recebeu a delegação, fazendo-se representar pela vice-governadora, Maria João Chipalavela.
“Parece-me que aqui na Huíla o senhor governador não tem o hábito de receber os partidos políticos da oposição. É mau”, vincou, acrescentando que “o diálogo entre instituições é absolutamente necessário para uma boa gestão de responsabilidades”.
O governador da Huíla voltou a ser visado, depois de o dirigente da UNITA ser questionado sobre as obras que estão a ser feitas no Lubango, alegadamente a cargo de uma empresa pertencente ao próprio governador.
“Estamos a ver uma cidade com várias ruas interrompidas, mas não sabemos que tipo de obra é aquela, como é normal no âmbito da legalidade”, comentou o deputado.
“Isto preocupa-nos bastante. Não basta haver obras, é preciso que sejam feitas no espaço rigoroso da legalidade”, sublinhou Adalberto da Costa Júnior, dizendo que “ficam algumas interrogações” sobre os trabalhos, depois de os deputados terem recebido “indicações de que o decisor e o beneficiário possam ser a mesma pessoa”.
Os quatro dias de visita serviram também para reforçar a convicção de que é necessária a realização em simultâneo em todas as autarquias das eleições municipais.
Angola prepara as suas primeiras eleições autárquicas para 2020, mas está ainda em aberto se o processo será gradual ou feito em simultâneo em todos os municípios.
No âmbito das jornadas, recorde-se, os deputados transportaram 40 toneladas de alimentos, incluindo farinha, milho e sal, das quais 15 foram entregues no município dos Gambos, na Huíla, e outras 55 toneladas seguiram viagem até ao Cunene.
Adalberto da Costa Júnior admitiu que os donativos não são “a solução para o problema” da seca, mas considerou que a ajuda humanitária “salva vidas”.
No comunicado final, o grupo parlamentar da UNITA “deplorou a situação degradante das populações do interior das províncias da Huíla e Cunene, caracterizadas pela fome e seca profundas”, e anunciou que vai propor ao Governo a criação de um grupo de trabalho para estabelecer um “plano nacional de Fome Zero” e um plano de emergência alimentar para as populações afectadas.
Contra os portugueses marchar, marchar…
Recorde-se que a Direcção da UNITA demarcou-se no dia 14 de Dezembro de 2018, pela voz de Adalberto da Costa Júnior, das declarações do deputado David Mendes, eleito pelo partido, que afirmou, na Assembleia Nacional, estar “farto dos portugueses em Angola”, classificando benevolamente a afirmação como um “deslize”. Nas eleições internas de hoje, David Mendes não apoiou Adalberto, preferiu Alcides Sakala.
“Acompanhámo-las [as declarações de David Mendes] e nós próprios ficamos muito surpreendidos com esta saída, que, naturalmente, não nos pode vincular, até porque não temos essa posição sobre Portugal ou sobre outra qualquer presença estrangeira em Angola. Creio que acabou por ser um deslize, vamos considerá-lo a este nível, que lamentamos profundamente”, disse o líder parlamentar da UNITA, Adalberto da Costa Júnior.
No debate que antecedeu a aprovação sobre a Lei de Repatriamento de Capitais, o advogado e fundador da associação Mãos Livres, David Mendes, deputado independente eleito nas listas da UNITA, questionou o plenário sobre as intenções do Governo com as privatizações das empresas estatais angolanas, culminando com um ataque duro a Portugal.
Ao longo de uma intervenção de cerca de cinco minutos, David Mendes defendeu que o processo de privatização em curso em Angola não pode permitir que as empresas públicas sejam entregues a estrangeiros, sobretudo aos portugueses, “que querem tomar a economia” nacional.
“Queremos entregar o país aos estrangeiros quando temos consciência que não temos condições económicas? Qual é a pressa? Já cometemos muitos erros no passado, cometemos muitos erros, e não vamos cometer mais um. Isto de entregarmos o país aos estrangeiros tem de parar. Os estrangeiros não vêm aqui de graça. Vêm retirar o que é nosso”, disse então David Mendes.
“Estamos hoje aqui a lutar com o repatriamento de capitais, muitos estão a embandeirar que o dinheiro vai voltar. Eu não acredito que Portugal vai devolver o dinheiro que está lá. E a França e a Espanha também não. Gostaríamos de pedir aqui a esta casa [parlamento] que pensássemos quem são os que vão comprar essas empresas. Queremos privatizar a Sonangol, para quem? Quem vai comprar? Eu não sou contra os portugueses, mas estou farto dos portugueses em Angola”, disse o deputado.
David Mendes continuou, depois, a pôr em causa a presença de “estrangeiros” em Angola, lembrando que, no país, residem mais de 170 mil cidadãos portugueses.
“Quem serão os beneficiários desta lei? Em primeiro lugar serão os estrangeiros. Não nos esqueçamos de que mais de 170 mil portugueses estão em Angola. A fazer o quê? Querem tomar a nossa economia”, afirmou.
“Outros beneficiários serão os angolanos que têm dinheiro para comprar as empresas. Porém, como estão a ser perseguidos, as abelhas vão tomar conta do negócio, porque o mel todos o querem. Que país é que queremos? Para meia dúzia de indivíduos? Para meia dúzia de estrangeiros? Vamos continuar a ser os escravos na nossa própria terra? Que alternativa? Precisamos de reflectir, de reflectir para os angolanos”, acrescentou.
Dirigindo-se de seguida a Fernando Piedade Dias dos Santos, presidente do Parlamento angolano, David Mendes questionou sobre o que valeu a guerra anticolonial, que culminou com a independência, em 1975.
“O que valeram os 14 anos de guerra? Valeu para quê? Para devolvermos tudo de novo a Portugal? Foi para isso que lutamos? Foi para isso que muitos de nós perderam sangue, que muitos de nós foram para a cadeia? Para perdermos tudo para quem nos esteve a colonizar? É essa a nossa tendência? Devemos parar e reflectir”, disse.
“Qual é o angolano que tem dinheiro? Os empresários estão falidos. Se nos viessem aqui dizer que a dívida pública interna deveria ser convertida em acções das empresas, se o Estado assumisse perante os empresários que, com este dinheiro que lhes deve, iria convertê-lo em acções nas empresas, estaríamos de acordo. Agora, oferecer as nossas empresas aos estrangeiros não estou de acordo”, frisou.
Para David Mendes, os antigos combatentes, veteranos de guerra e os desmobilizados têm uma pensão que fica aquém do que merecem, pelo que defendeu a solução de as acções da Sonangol e de outras empresas a privatizar convertessem também a favor deles.
“Temos de pensar o país. Muitos, muitos companheiros nossos, sofreram, deram toda a sua juventude na luta, e hoje estão na miséria. Quantas vezes olhamos para vários nossos antigos companheiros de luta que estão na miséria. E hoje, com a possibilidade de privatizarmos as empresas, não estamos a olhar para esses nossos companheiros. O senhor presidente [da Assembleia Nacional] sabe do que estou a falar, pois foi um combatente, dirigiu tropas, dirigiu homens, e eu fui um deles”, concluiu.
No comentário a este ataque racista de David Mendes, o líder parlamentar da UNITA disse não estar de acordo com o posicionamento de David Mendes, que será “seguramente pessoal, fruto de um momento não reflectido”.
“David Mendes não tem esta posição anti-portuguesa como permanente. Nunca a tinha ouvido. Devo dizer que foi uma surpresa ouvir esta declaração. Não sei a razão. Naturalmente que vamos conversar com ele. É preciso que, futuramente, se cuide melhor este tipo de frases, evitar ferir sensibilidades, porque, de facto, quando se vive em excessos exacerbados de reacções contra determinados povos temos de ser exemplo de tolerância e de abertura”, justificou-se.
“Temos uma comunidade angolana muito vasta em Portugal e não devemos ser nós a tomar aqui iniciativas em Portugal e noutros países. Tivemos uma longa guerra, onde os angolanos tiveram de ir buscar hospitalidade em muitos países, vizinhos e longínquos, pelo que o exemplo de tolerância e de respeito deve ser algo que nós próprios devemos assumir em primeiro lugar. Portanto, lamentamos”, terminou.