“Eu sou (o) único”

João Lourenço, general, ex-ministro da Defesa, Presidente do MPLA, da República, Titular do Poder Executivo e, em síntese, dono disto tudo, julga-se a cada dia que passa como um Messias capaz de reduzir a menos de zero todos os que foram líderes de Angola, até mesmo os do seu partido, Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos. Não se importa, por isso, que – por sua sugestão – passe a ser conhecido como o “único”.

Por muito que isso custe a reconhecer, sem alardes, com dignidade e postura de Estado, José Eduardo dos Santos mostrou a João Lourenço que um líder não se faz por decreto, que um líder não é o que manda mas sim o que dá o exemplo. Do ponto de vista dos parâmetros que definem um verdadeiro Estadista (não está aqui em análise a estatura democrática ou ditatorial), José Eduardo dos Santos mostrou que João Lourenço não passa de um estadista pigmeu que, perante o estertor do pânico que até o espelho reflecte, se põe em bicos de pés não para ver o que se passa mas, apenas e só, para ser visto.

José Eduardo dos Santos abdicou de parte das prerrogativas constitucionais, incluídas no art.º 133.º CRA (Constituição da República de Angola), na qualidade de ex-presidente da República, face ao clima de crispação existente com o seu sucessor que após a tomada de posse resolveu, “in continenti”, declarar-lhe guerra, mesma que de forma indirecta, ao alvejar quase diariamente os membros do seu clã familiar e de alguns dos seus mais íntimos colaboradores.

Em comunicado, a Casa Civil do Presidente da República referiu – com visível pânico – que a “surpreendente decisão” de José Eduardo dos Santos utilizar o voo comercial da TAP, “em detrimento da própria companhia de bandeira TAAG”, não respeitava o protocolo. Recorde-se que essa “coisa” do protocolo não se deve aplicar apenas quando João Lourenço quer. Ou é para aplicar sempre ou… comem todos.

Ao “retribuir” a gentiliza de Marcelo Rebelo de Sousa que voou para Angola num voo da TAAG, JES optou por viajar para Portugal na TAP. É claro que Dos Santos sabia que ao primeiro “tiro” o general e seu ex-ministro da Defesa se iria esconder debaixo da “mesa”. Assim aconteceu. E logo num voo para Portugal onde, tempos antes, João Lourenço insultou o ex-presidente da República apelidando-o de marimbondo.

Mostrando que quem nasce lagartixa nunca chega a jacaré, João Lourenço tentou apagar um pequeno fogo com gasolina. O incêndio ficou incontrolável. Por obra e graça de João Lourenço, uma simples deslocação de JES ao estrangeiro tornou-se notícia em todos os lados, sobretudo na praça-forte portuguesa.

João Lourenço vestiu a farda de comandante dos bombeiros e deslocou-se (depois do falhanço dos seus emissários enviados para convencer Eduardo dos Santos) à residência do ex-chefe de Estado, em Luanda, para o demover da pretensão. Calmo e sereno (dizem as fontes do Folha 8), JES foi paciente e terá mesmo dado mais uma lição ao seu sacristão que promoveu a padre e que, do dia para a noite, já queria ensinar o Padre Nosso ao vigário.

Explicou-lhe, caricaturemos a situação, que a corda que lhe fornecera tanto dava para enforcar os inimigos como para ele próprio se enforcar. JLo não percebeu. Não nos admiremos. Está no ADN.

“A surpreendente decisão do ex-Presidente da República se fazer transportar em aeronave comercial estrangeira, em detrimento da própria companhia de bandeira TAAG na sua deslocação à Europa, contraria diligências protocolares e logísticas desencadeadas pelo Estado angolano nas últimas semanas, que pôs à sua disposição uma aeronave compatível com o seu estatuto”, dizia o comunicado da Presidência da República que, aliás, em matéria de comunicação, oportunidade política e correcção linguística é revelador de ter sido escrito com os pés e sem tirar os sapatos.

“Tão logo o Executivo soube da intenção, por parte do ex-Presidente da República, de rejeitar a utilização do meio aéreo contratualizado, foram accionados todos os canais de diálogo e persuasão em ordem a prevalecer as normas e os princípios de protocolo atendíveis, sem que, contudo, tais esforços desembocassem numa solução para o impasse”, acrescentava o comunicado.

Não é difícil de imaginar as gargalhadas de José Eduardo dos Santos ao ler este comunicado.

“Nem mesmo depois de (…) o Presidente da República, João Lourenço, se ter deslocado e falado com o ex-Presidente na residência deste, ao Miramar”, dizia ainda o comunicado.

“Entretanto, e respeitando em rigor o normativo que define os direitos e regalias dos antigos Presidentes da República, o Executivo assegurou todos os aspectos logísticos e financeiros relacionados com a atenção médica a que se submeterá o ex-Presidente José Eduardo dos Santos em Espanha”, acrescenta-se no comunicado, dizendo que “o Executivo lamenta profundamente tal atitude, cujas consequências não são da sua responsabilidade”.

Consequências? Será que os peritos de João Lourenço previam que o avião da TAP fosse abatido? Anteviam que fosse desviado para a Jamba? Calculavam que José Eduardo dos Santos se atirasse de pára-quedas sobre o Oceano Atlântico?

Mais do que a decisão de José Eduardo dos Santos, a reacção de João Lourenço criou um dado novo na já tensa relação, principalmente depois de JLo o ter alcunhado, a partir do estrangeiro (Portugal), pejorativamente, como uma espécie de “Marimbondo-Mor”, logo, chefe de quadrilha dos marimbondos, conceito lourenciano que, sem grande dificuldade de interpretação, significa nessa língua vernácula, bando de corruptos, gatunos, larápios invertebrados do erário público, caricatamente, todos do MPLA, que só não levaram o país à falência total graças à chegada ao poder do actual Presidente da República, qual Messias…

Este acumular de tensão é alimentado não só pelas farpas nos discursos presidenciais, onde José Eduardo dos Santos é diabolizado como o único responsável pelo descalabro do país, mas também, com a prisão considerada arbitrária, do filho varão, Zenú dos Santos (ex-presidente do Fundo Soberano), por cerca de seis meses, pese este, antes de ser recolhido à cadeia, por alegada ordem expressa de João Lourenço ao Procurador-Geral da República, general Pitta Grós, ter procedido à devolução integral dos valores envolvidos numa operação (500 milhões de euros, como primeira tranche, de três de igual montante, mais 64 milhões, para procedimentos administrativos e financeiros viabilizadores da transacção), visando, hipoteticamente, a obtenção de um financiamento de 30 mil milhões de euros, que Eduardo dos Santos pretendia brindar como desafogo, o consulado de João Lourenço, para consolidar mais 10 anos de domínio do MPLA.

Mas, rapidamente, o sonho transformou-se em pesadelo ao invés de realidade pacífica e conciliadora, que agora serve para a destruição das bases do próprio regime.

A tal ponto que desde Setembro de 2018, que Eduardo dos Santos não teve nenhum contacto pessoal, telefónico ou escrito, com o Presidente da República, nem mesmo quando o filho definhou nas masmorras da Cadeia de São Paulo de Luanda ou devido ao exílio “forçado” de duas filhas (temendo prisões e humilhações públicas arbitrárias).

E é este passivo, ao que parece, o grande responsável, pela decisão de José Eduardo dos Santos abdicar do apoio do Protocolo de Estado, para viabilizar a sua deslocação ao estrangeiro para tratamento médico.

É o preço da manta de retalho que se transformou o regime do MPLA com os constantes tiros no pés e as humilhações internas, com o carimbo MARIMBONDOS, de João Lourenço direccionado ao seu mentor, como gratidão invertida.

Por isso, cada vez mais e de forma cada vez mais assertiva, os angolanos perguntam: Se JLo queria prender e mandar para a sarjeta todo o consulado do MPLA na República de José Eduardo dos Santos, porque se prestou ao triste papel de o condecorar, como presidente emérito do partido governante? Porque o venerou e idolatrou perante os angolanos e perante o mundo, atá ao exacto momento em que recebeu o cajado de líder do MPLA?

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2 Thoughts to ““Eu sou (o) único””

  1. O JLO quer mudar o modo de fazer as coisas em Angola, porque Angola já se tinha transformado em país sem lei, sem rumo, onde o índice de pobreza era assustador, com um punhadi de dirigentes angolanos a se distribuirem os recursos financeiros dos angolanos cimo se fosse propriedade pessoal.
    JLO quer mudar tudi isso para que Angola seja um país normal.
    Os que se zangam com JLO são os egoístas do MPLA que se esqueceram e nem reconhecem que os recursos de Angola são de todos angolanos.

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