O Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica (INAMET) de Angola alertou para o risco de ocorrências, esta semana, de chuvas intensas com descargas eléctricas, fenómeno que já provocou 11 mortes nos últimos 30 dias. E o Povo morre. Só morre. De fome, de doenças, devida à seca ou às chuvas ou às descargas eléctricas…
O alerta foi dado para as autoridades e população das províncias da Lunda Norte, Lunda Sul, Huambo, Bié, Huíla, Moxico, Cunene e Cuando Cubango, no sentido de tomarem medidas de precaução e segurança.
O boletim meteorológico do INAMET prevê para esta semana períodos de ocorrência de aguaceiros ou chuvas, que poderão ser fortes, acompanhada, por vezes, de trovoada durante a noite, madrugada e manhã em alguns municípios daquelas províncias.
Sobre as descargas eléctricas, o porta-voz do Serviço de Protecção Civil e Bombeiros, Faustino Miguêns, disse que nos últimos 30 dias foram registadas um total de 11 mortes por descargas atmosféricas.
Nos últimos dias, a imprensa tem relatado a ocorrência de mortes por descargas eléctricas em várias províncias do país, sendo os últimos casos notificados na província da Huíla e de Benguela, com um total de sete óbitos.
Na Huíla, cinco pessoas da mesma família morreram e uma outra ficou ferida após um raio ter atingido a sua residência, enquanto em Benguela duas pessoas morreram e duas outras ficaram gravemente feridas pelo mesmo fenómeno natural.
Recorde-se que o Ministério das Telecomunicações e Tecnologias de Informação de Angola previa investir mais de nove milhões de euros na modernização do INAMET, processo apoiado por França.
De acordo com a proposta de lei do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2018, aquele ministério previa avançar nesse ano com a primeira fase do projecto de modernização, que deveria prolongar-se até 2022. Na primeira fase, segundo a proposta orçamental, seriam investidos 2.100 milhões de kwanzas (9,3 milhões de euros).
Em 2017 estava prevista a recepção pelo INAMET de equipamentos e software fornecidos pelo instituto público Météo Française Internationale (MFI), no âmbito do projecto de modernização.
Esse processo envolveu a assinatura de um contrato de fornecimento entre a MFI e o Ministério das Telecomunicações e das Tecnologias de Informação, subdelegado no director-geral do INAMET, Domingos José do Nascimento, conforme despacho governamental de 2017.
Assinado pelo ministro das Telecomunicações e das Tecnologias de Informação, José Carvalho da Rocha, o documento referia que o contrato com a MFI envolvoa ainda obras de construção civil e a prestação de outros serviços no âmbito do contrato para a modernização do INAMET.
A concretização deste contrato resultou de um acordo assinado em Luanda, a 3 de Julho de 2015, durante a visita do então Presidente francês a Luanda, prevendo uma parceria do INAMET com o instituto público Météo Française Internationale e a empresa angolana LTP Energia.
Aquele instituto público angolano chegou a apresentar um Plano de Desenvolvimento Estratégico para o período 2011-2017, avaliado em mais de 116 milhões de dólares (95 milhões de euros), cuja concretização foi dificultada pela crise queafectou Angola a partir de finais de 2014.
Previa então o reforço da capacidade operacional do INAMET, como a reposição e funcionamento adequado de 28 estações convencionais, espalhadas por todas as províncias, a instalação de 572 novas Estações Meteorológicas Automáticas (EMAS) para fins sinópticos (previsão de tempo), climáticos, agrometeorológico e hidrológico.
O plano envolvia ainda a instalação de estações de medição da radiação Ultra Violeta (UV), descargas eléctricas atmosféricas e qualidade do ar, e a construção de três centros regionais de previsão do tempo para as áreas norte, centro e sul do país.
A (suposta) mea culpa do Governo
O Governo angolano (que desde 1975 é da responsabilidade do MPLA) admitiu no dia 10 de Abril deste ano que a resposta aos fenómenos atmosféricos relacionados com as fortes chuvas e consequentes inundações em Angola “não se tem revelado oportuna e suficiente”. O balanço provisório oficial da época das chuvas em Angola, entre 15 de Agosto de 2018 e 2 de Abril de 2019, registava a morte de pelo menos 209 pessoas, 100 delas por descargas eléctricas.
Ao abrir, em Luanda, a Reunião da Comissão de Secretários de Estado e Representantes da Sociedade Civil Angolana, no âmbito do Quadro de Recuperação Pós-Seca 2018/2022 e à Época das Chuvas, Salvador Rodrigues lamentou a desadequada “prestação de serviços básicos e de socorro, por falta de meios essenciais, incluindo muitas vezes a exiguidade de verbas”.
Importa, como intróito, reconhecer que João Lourenço só é Presidente desde Setembro de 2017 e que o MPLA só está no Governo desde Novembro de… 1975. E, em tão pouco tempo, não seria inexequível (ou será que era?) fazer mais e melhor.
“Embora tenhamos um plano nacional de preparação, contingência, resposta e recuperação de calamidades e desastres, a nossa intervenção no terreno não se tem revelado oportuna e suficiente”, sublinhou o secretário de Estado do Interior para o Asseguramento Técnico de Angola.
“Neste contexto, tendo em conta a degradante situação social em que se encontram as populações afectadas, e não existindo stock suficiente de meios e bens para atenuar o sofrimento, é urgente e necessário que a Protecção Civil se preocupe e se debruce sobre o assunto”, avisou Salvador Rodrigues.
Para o governante, o Serviço Nacional de Protecção Civil e Bombeiros (SNPCB) tem de encontrar forma de mobilizar atempadamente meios para socorrer as vítimas, “recorrendo à prestimosa atenção do Ministério das Finanças na disponibilização de recursos paria a implementação de acções imediatas de resposta humanitária e reposição das condições básicas de vida daquelas populações”, concluiu.
Moçambique e Angola ou uma “santa” hipocrisia
Por sua vez, mostrando uma rara perspicácia, a ministra da Saúde de Angola admitiu no passado dia 25 de Março que as chuvas abundantes que caíram na província de Benguela, que causaram pelo menos 16 mortos, podiam originar “novos casos de malária”, mas garantiu que a “situação sanitária está controlada”.
“Do ponto de vista da saúde, em Benguela, e da assistência médica e medicamentosa, estamos a cumprir o nosso papel e em termos de saúde a situação está controlada. Acreditamos que tenhamos mais casos de malária”, disse Sílvia Lutucuta, em Luanda.
Quanto a eventuais e atempadas medidas ficamos na mesma. Ou seja, depois da casa assaltada… prescreve o tempo de prisão preventiva.
Questionada em conferência de imprensa sobre o apoio que estava a ser prestado às populações afectadas pelas chuvas abundantes que então se registavam na província de Benguela, que no dia 16 de Março causaram 16 mortos e o desabamento de várias residências, afirmou que o sector “respondeu prontamente”.
Sobre a ajuda humanitária que Angola estava então a prestar a Moçambique, com assistência médica e medicamentosa, devido ao ciclone Idai que vitimou centenas de pessoas e deixou milhares afectadas “quando em Benguela se alegam carências”, Sílvia Lutucuta disse tratar-se de “situações distintas”.
“Em Benguela, ao contrário de Moçambique, nós ainda conseguimos ter as nossas unidades sanitárias preservadas, não foram afectadas minimamente, uma inundação, mas não foi uma situação tão dramática como em Moçambique”, explicou. Mas, observou, “havia meios e recursos para tratamento dos doentes”.
“Mesmo assim, enviámos dois contentores com bastantes medicamentos e com material gastável e fomos os primeiros a chegar a Benguela”, assinalou. Boa, senhora ministra. O Governo de… Angola foi o primeiro a chegar à província… angolana de Benguela. É obra!
“O sector da saúde foi o primeiro a chegar a Benguela com meios necessários e recursos humanos, equipas técnicas especiais para o combate às catástrofes. Tão logo tivemos conhecimento da situação interagimos com as autoridades locais sobre a situação”, disse Sílvia Lutucuta.
Na ocasião, o Presidente João Lourenço manifestou “grande consternação” pelos “acontecimentos trágicos” ocorridos na província de Benguela. As vítimas mortais não devem ter sentido grande diferença com a consternação do Presidente. Se calhar estariam vivas se o Governo tomasse a tempo e horas medidas profilácticas que evitassem estes dramas. Mas, compreende-se, o Executivo tem outras prioridades. E, entre cuidar das condições de vida dos cidadãos e construir um “elefante branco” para homenagear cubanos e russos que andaram a matar angolanos, a escolha só poderia ser mostrar a megalomania do regime no Cuito Cuanavale.
Numa mensagem divulgada pela Casa Civil do Presidente da República, João Lourenço lamentou também os ferimentos em “dezenas” de cidadãos, a destruição de habitações e os danos em bens patrimoniais.
No mesmo dia em que Sílvia Lutucuta explicava o inexplicável, o seu governo enviava o quarto voo com cerca de 52 toneladas de medicamentos e material gastável, para a cidade da Beira, para acudir as populações afectadas pelo ciclone Idai.
Segundo a ministra Sílvia Lutucuta, a acção enquadrou-se na “missão humanitária e de solidariedade” de Angola, naquele país desde 22 de Março, para “atenuar a situação crítica”.
“Porque de facto o cenário que encontramos é bastante crítico, tivemos ocasião de sobrevoar a cidade da Beira, um cenário de grande destruição e ainda continuava a haver pessoas penduradas nas árvores, por cima de residências”, disse.
Para a cidade da Beira, seguiram nesse mesmo dia dois helicópteros para apoiar a operação de resgate de pessoas em zonas de difícil acesso, e mais dois helicópteros com uma tripulação de especialistas treinados em resgate.
Angola teve na cidade da Beira uma “missão humanitária e de solidariedade” composta por cerca de 100 pessoas, entre técnicos do Ministério da Saúde e da Defesa, com tropas especiais, que se juntaram às equipas locais de salvamento.
Especificamente, Sílvia Lutucuta deu conta que das 100 pessoas estavam em Moçambique de forma permanente 68 profissionais entre médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico, de saúde pública treinados para as grandes epidemias e outros especialistas.
A governante recordou que o primeiro apoio de Angola foi de cerca de 26 toneladas, com diversos meios, nomeadamente medicamentos, materiais gastáveis e outros meios para a subsistência das equipas.
Folha 8 com Lusa