Depois de Sindika Dokolo
foi a vez de João Lourenço

O Presidente de Angola, também Titular do Poder Executivo e Presidente do MPLA, João Lourenço, afirmou que a cerimónia oficial na Câmara do Porto (a mesma autarquia que atribuiu a Medalha de Ouro da cidade a Sindika Dokolo, genro do ex-presidente – agora proscrito – José Eduardo dos Santos) abre portas a “um futuro promissor” nas relações entre Portugal e Angola.

“Esta cerimónia abre as portas a um futuro promissor de cooperação e intercâmbio em todos os sectores que possam contribuir para o aprofundamento das nossas relações bilaterais, pois estou convencido que a nossa visão sobre o intercâmbio ganhará expressão real nas conversações que dentro de momentos serão mantidas entre as delegações angolana e portuguesa, chefiadas por mim e pelo primeiro-ministro, António Costa”, disse João Lourenço.

O presidente João Lourenço, que chegou ao edifício da autarquia portuense cerca de 40 minutos depois do horário previsto, afirmou sentir-se “honrado” com esta visita ao Porto, “cidade conhecida no mundo pela sua coragem” e pelos “feitos” da sua população, que lhe valeram “título único de cidade Invicta”.

Para João Lourenço, a história “heróica” do Porto “tem paralelo com algumas cidades de Angola”, onde “também os seus habitantes souberam com estoicismo lutar pelos valores das suas cidades, pela sua liberdade e pela salvaguarda de importantes conquistas, alcançadas com esforço, empenho e dedicação”.

O chefe de Estado angolano enalteceu, ainda, valores do Porto, afirmando que o município é uma “cidade do trabalho, vencedora quando se propõe realizar objectivos” e “pujante” no desempenho, quer das suas indústrias como no desporto e cultura.

Certamente que a autarquia liderada por Rui Moreia, velho e querido amigo dos governos de Angola (desde a independência, em 1975, foram todos do MPLA) e dos seus líderes… enquanto estiveram mo Poder, não se esquecerá de erigir uma estátua ao Presidente João Lourenço ou, no mínimo, dar o seu nome à Avenida da Boavista que, aliás, já “esteve” para se chamar… Avenida José Eduardo dos Santos.

Por sua vez, num discurso de boas-vindas, o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, disse que poderá haver quem tenha uma “visão paternalista” em relação a Angola, mas garantiu que neste concelho se vive os “sucessos angolanos sem complexos de superioridade ou de inferioridade”.

Manifestamente Rui Moreira passou uma esponja sobre a bajulação da “sua” Câmara Municipal ao casal Sindika Dokolo/Isabel dos Santos, bem como ao “líder carismático” (citando José Sócrates) que dominou Angola durante 38 anos sem nunca ter sido – tal como agora João Lourenço – nominalmente eleito.

“Haverá sempre quem, pelas melhores ou piores intenções, tenha uma visão paternalista sobre o que se passa em Angola. Também haverá quem, pelas melhores ou piores razões, mantenha algum ressentimento e desconfiança. Mas, falando em nome dos portuenses, porque só em nome deles posso falar, afianço-lhe que vivemos como nossos os vossos sucessos e os vossos avanços e não temos complexos de superioridade ou de inferioridade”, disse o presidente da Câmara do Porto.

Numa cerimónia que contou com a presença do primeiro-ministro português, António Costa, Rui Moreira sublinhou os laços afectivos entre Portugal, dando destaque à cidade do Porto, e Angola, para depois frisar a importância do aspecto económico.

“Temos trocas económicas e os investimentos cruzados que constroem riqueza em ambas as nações. Temos famílias que se abraçam e que se foram construindo, unindo os nossos povos”, disse o autarca, acrescentando que no Porto se olha para o mercado angolano “com atenção e carinho”.

Por fim, apontando o exemplo da loja Kinda Home – de um grupo português implantado em Angola – que vai abrir no Porto, num investimento de cerca de 20 milhões de euros, e somando outros aspectos sobre as rotas mercantes entre os dois países, Rui Moreira referiu-se ao “empenho do Governo português no sucesso desta visita de Estado”.

“É um sinal claro do caminho que vem sendo trilhado e de que o Porto faz parte e quer continuar a fazer parte”, concluiu Rui Moreira, antes de entregar a João Lourenço as chaves da cidade, um acto que o autarca considerou “o mais simbólico dos actos que um presidente de câmara pode ter para com um chefe de Estado” por significar que este “não é apenas bem-vindo, mas um cidadão do Porto”.

Rui Moreira esteve, está e estará de parabéns

O presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, continua a ser uma das mais proeminente figuras portuguesas na bajulação ao regime angolano, desde que seja do MPLA. Para o autarca portuense pouco importa que Angola seja um dos países mais corruptos do mundo e o país com um dos maiores índices de mortalidade infantil do mundo.

Chafurdar na bajulação é para muitos políticos portugueses uma questão de vida.

Recorde-se que o Executivo da Câmara Municipal do Porto, presidido por Rui Moreira, distinguiu Sindika Dokolo com uma medalha de mérito. Só faltará agora dar o nome de José Eduardo dos Santos à Avenida Boavista. Esteve quase, não fosse aparecer João Lourenço.

Na altura, a vereadora do PS na Câmara do Porto, Carla Miranda, deu uma no cravo e outra na ferradura ao criticar o princípio subjacente à decisão de atribuir a medalha de Mérito Grau Ouro ao dito coleccionador de arte.

Numa atitude de gato escondido com rabo de fora, a vereadora do PS votou favoravelmente esta proposta mas – repare-se – tinha “dúvidas se será suficiente para receber esta medalha apenas vir ao Porto divulgar o seu património”.

“Existe um regulamento para atribuição de medalhas e para as de mérito é bem claro: ela deve ser dada a quem tenha praticado actos com assinaláveis benefícios para a cidade. Precisaríamos de mais benefícios para a cidade e para a população para lhe atribuir esta medalha”, disse a vereadora socialista.

Que maior acto de benefício para a cidade do Porto em particular, e em geral para todo o país, do que ser – na altura – genro do presidente no poder desde 1979? Ou marido de uma multimilionária que começou a ganhar umas massas vendendo ovos nas ruas de Luanda?

Sindika Dokolo nasceu no antigo Zaire, actual República Democrática do Congo, e foi educado pelos pais na Bélgica e em França, tendo começado aos 15 anos a constituir uma colecção de obras de arte, por iniciativa do pai, refere o texto laudatório, bajulador e servil da autarquia.

“Em Luanda, constituiu a Fundação Sindika Dokolo, a fim de promover as artes e festivais de cultura em Angola e noutros países, com o objectivo de criar um centro de arte contemporânea que reúna não apenas peças de arte contemporânea africana, mas que, além disso, providencie as condições e actividades necessárias para integrar os artistas africanos nos círculos internacionais do mundo da arte”, acrescenta o panegírico submisso e de clara bajulação da Câmara Municipal do Porto.

A justificação apresentada por Rui Moreira, um cada vez mais visível apologista da autocracia do MPLA, para tão importante distinção a alguém que não tem qualquer ligação à cidade foi – repita-se – a de ir patrocinar a apresentação da exposição You Love me, You love me not.

Rui Moreira disse ainda que “com este gesto de grande generosidade, Sindika Dokolo, permite à cidade do Porto desenvolver um dos projectos mais relevantes no âmbito da arte contemporânea da actualidade, ajudando a estabelecer uma ponte singular entre a cidade e o mundo”.

Por este andar, e então agora que se tornou amigalhaço de João Lourenço, não tardará que o MPLA retribua com a atribuição a Rui Moreira da medalha da democracia e do Estado de Direito que Angola não é.

Folha 8 com Lusa
Foto: Pedro Correia/global Imagens

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