O relatório “Fórum Ibrahim de 2018: Serviço Público em África” servirá de base para o debate do Fórum Ibrahim de 2018, a ocorrer em Kigali, Ruanda, no sábado, 28 de Abril. O Fórum irá concentrar-se no Serviço Público em África, a sua relação essencial com a boa governação e liderança eficaz, novos desafios e actuais deficiências, formas e meios de o fortalecer e de o tornar apelativo para a geração seguinte.
Mo Ibrahim, Presidente da Fundação Mo Ibrahim, dz: “O serviço público é o pilar da governação. Sem serviços públicos fortes e funcionários públicos dedicados, não haverá uma prestação eficiente dos bens e serviços públicos esperados, nem a implementação de qualquer compromisso, mesmo que este tenha sido firmemente expresso.”
O Relatório de 2018 analisa em primeiro lugar a exigência dirigida aos serviços públicos africanos, destacando as crescentes expectativas dos cidadãos. As novas exigências resultam dos vários desafios do séc. XXI e da demografia jovem e urbanizada específica de África: solidariedade, protecção contra várias ameaças criminosas, emprego, ambiente favorável a negócios, cultura, mitigação das alterações climáticas, desenvolvimento do sector rural.
Estas exigências juntam-se às tradicionais – segurança, saúde, educação, justiça – relativamente às quais a insatisfação dos cidadãos parece estar a aumentar.
Uma carga adicional é a multiplicação de compromissos multilaterais: ODS, COP, Agenda 2063 da UA… Muitos intervenientes poderiam ser responsáveis por todos estes dentro do sector público – União Africana, comunidades regionais, governos nacionais, cidades – ou fora deste – sector privado, doadores multilaterais. Isto exige uma avaliação cuidadosa de quem está melhor posicionado para abordar estas exigências e quem tem de se responsabilizar pela sua concretização.
O Relatório avalia ainda o estado actual dos serviços públicos africanos e os seus principais desafios, tanto do lado da atractividade do trabalho como do lado da concretização. Em média, os serviços públicos africanos apresentam falta de capacidade ao nível do continente. Continuam a ser um pequeno empregador, com um custo superior em comparação a outras regiões, com grandes disparidades nos países.
Nos sectores da saúde, educação e segurança, os serviços públicos estão longe de satisfazer as exigências. Em parte, para responder às exigências que aumentam exponencialmente, em parte para substituir os serviços públicos ineficazes, um número crescente de intervenientes não estatais tem-se tornado prestadores essenciais de bens e serviços públicos, ao ponto de por vezes impedirem os governos nacionais de terem políticas públicas.
Os funcionários públicos em África possuem, em média, melhor educação académica do que os do sector privado, e também têm, em média, o dobro da idade da população que servem. A motivação no trabalho centra-se essencialmente na segurança do trabalho e não na remuneração, a mobilidade dentro ou fora dos serviços públicos é praticamente inexistente, a dependência política é forte, o equipamento de trabalho escasseia, a corrupção encontra-se no nível mais elevado à escala global, os “funcionários públicos fantasma” ocupam postos em vários serviços, enquanto que muitos dos indivíduos com melhor formação escolhem trabalhar no estrangeiro.
Desenvolver serviços públicos em contextos pós-conflito, muitas vezes do zero, representa um desafio específico. Mas num continente jovem, cuja capacidade de superação já foi várias vezes demonstrada, existem soluções potenciais e melhores práticas: incentivos monetários e não monetários, mobilidade interna e externa, desenvolvimento de competências, novas tecnologias…
Em conclusão, o Relatório destaca a necessidade de criar um contrato sólido entre cidadãos e prestadores de serviços públicos. Para qualquer acordo sólido é essencial haver confiança, é necessário garantir a transparência e a responsabilização e implementar os compromissos. Num continente em que os fluxos financeiros ainda são equivalentes a quase metade das receitas fiscais internas, onde as receitas fiscais só contam, em média, para menos de 15% do Produto Interno Bruto, e onde a maioria dos cidadãos é a favor de pagar pelos seus serviços públicos, fortalecer a cobrança de impostos é fundamental para a autonomia e propriedade.
Destaques do Relatório:
• Apenas três países – Líbia, Maurícia e Tunísia têm pelo menos um médico para cada 1 000 pessoas;
• Para preencher a lacuna deixada pelos serviços públicos, estão em crescimento exponencial os sectores da segurança privada, ensino privado e saúde privada, com o risco de aumentar as desigualdades no continente;
• A RDC e o Quénia têm dos rácios mais baixos de forças policiais, com cerca de 100 agentes por cada 100.000 pessoas;
• A população do Cairo (Egipto) é superior a cada um dos 36 países menos povoados do continente;
• Cinco dos dez países africanos com os maiores gastos em saúde pública (em percentagem das despesas públicas totais), estão também entre os dez países com a maior quota de financiamento externo sobre os seus gastos totais em saúde;
• 30% a 50% dos impostos totais de África mantêm-se por cobrar;
• A dimensão média do sector informal na África Subsariana está estimada em 42% do rendimento interno bruto, alcançando os 60% na Nigéria, Tanzânia e Zimbabué;
• Na África Subsariana, a média de gastos em saúde privada é de 57,4%, mais do dobro em comparação com a Europa e a Ásia Central;
• Na última década, a Segurança Pessoal é a mais deteriorada das 14 subcategorias no Índice Ibrahim de Governação Africana;
• Em África, em média, os funcionários públicos têm melhor educação académica, são mais velhos e incluem mais mulheres em comparação com o sector privado;
• Na Nigéria, foram pagos cerca de 82,3 mil milhões de dólares em subornos no ano de 2016, o equivalente a 39% do orçamento conjunto federal e estatal para a educação;
• A Maurícia é o único país em que os funcionários públicos são designados e avaliados unicamente com base em critérios profissionais, de acordo com a Global Integrity;
• Anualmente, África perde cerca de 2 mil milhões de dólares devido à fuga de cérebros no sector da saúde;
• Na Etiópia, os governos locais têm apenas 21% dos dias úteis com acesso à Internet, o equivalente a apenas um dia numa semana de trabalho;
• 22% da população africana que teve contacto com um serviço público em 2015, afirmou ter pago um suborno, principalmente à polícia e aos tribunais;
• O Gana é o único país em que os funcionários públicos trabalham livremente, sem interferência política, de acordo com a Global Integrity;
• Na administração pública electrónica, África está muito atrasada em relação à média global. No Ruanda, o tempo de entrega de um fornecimento de sangue de emergência foi reduzido de três horas por estrada, para 30 minutos com drones;
• Muitos Índices apontam para um nível baixo e decrescente de práticas governamentais transparentes em África;
• Na última década, a média africana para a Responsabilidade dos Funcionários Públicos deteriorou-se, com o ritmo de declínio a piorar nos últimos cinco anos;
• A maioria dos cidadãos africanos é a favor de pagar por serviços públicos;
• Apenas sete países africanos têm um sistema completo de registo de nascimentos.
Pela primeira vez, o Fórum será precedido por um “Fórum Geração Seguinte”, na sexta-feira, dia 27, onde os jovens irão debater, como cidadãos, o que esperam dos seus serviços públicos e, como potenciais candidatos a emprego, a atractividade, ou a falta dela, dos serviços públicos ao nível nacional, local ou regional. Os resultados serão partilhados no dia seguinte no Fórum Ibrahim pelos seus representantes, que serão os “desafiadores” por constarem como membros do painel em cada uma das sessões.