Raiva continua a matar

Pelo menos 26 pessoas morreram vítimas de raiva na província angolana do Bié ao longo do primeiro semestre deste ano, mais 12 do que em idêntico período de 2017, indicaram hoje fontes de saúde provinciais. Tudo normal, não é Senhor Presidente João Lourenço?

Em declarações à Angop, no Cuito, o chefe de Departamento de Saúde Pública e Controlo Endemias local, Isaías Sambunga Cambissa, frisou que o município do Andulo lidera com 11 mortes, seguido pelo do Cuito, com seis, Chinguar e Cunhinga com três cada, enquanto Catabola, Chitembo e Nharea notificaram apenas um óbito cada.

Isaías Sambunga Cambissa disse ainda que, no período em referência, as autoridades sanitárias registaram 900 casos de mordeduras de cães, suspeitas de possuírem a raiva, contra os 1.342 do mesmo período de 2017.

O responsável salientou que a província do Bié não tem doses de vacina anti-rábica humana há mais de dois anos, motivo que tem contribuído para o aumento do índice de mortalidade.

A existência da raiva na província do Bié, segundo Isaías Sambanga Cambissa, deve-se ao facto de haver muitos animais de estimação portadores da doença que vagueiam pelas ruas da cidade e vilas, principalmente cães.

No programa de combate à raiva, referiu, participam igualmente os sectores como a Comunicação Social, Agricultura e Desenvolvimento Rural, Direcção da Família e Promoção da Mulher, Administrações Municipais, entre outros, sobretudo na mobilização e sensibilização das comunidades.

No dia 20 de Janeiro de 2017, a Organização Mundial da Saúde (OMS) informou, em Luanda, que o surto de raiva tinha provocado na capital angolana, em 2016, um total de 113 óbitos, das quais 24 eram crianças com menos de cinco anos.

A informação foi divulgada pelo representante da OMS em Angola, Hernando Agudelo, durante o lançamento de uma nova campanha de vacinação animal contra a raiva, que decorreu no município de Cacuaco, um dos mais populosos de Luanda e um dos mais afectados pelo surto em 2016.

“Neste momento, temos um grande incremento do número de mortes por raiva a nível do país, principalmente na província de Luanda, que conta já, no último ano, 2016, com 113 vítimas, das quais 24 foram crianças menores de cinco anos”, assinalou o representante da OMS.

O representante da OMS em Angola apelou na ocasião à participação massiva da população nos postos de vacinação animal, pelo facto de “as vacinas representarem um custo muito elevado” para a população.

“Uma família pode gastar 250 dólares para combater o surto, ao passo que a vacina para um animal custa apenas um dólar. Daí que é muito mais barato promover as campanhas de vacinação animal para fazer a prevenção da raiva nos cães”, alertou.

Promover campanhas de vacinação em massa para os animais, garantir que as pessoas mordidas por cães recebam tratamento imediato e a assegurar a participação das comunidades e das famílias dos doentes nas campanhas de prevenção são alguns dos mecanismos que constam do plano da OMS para eliminar a raiva nos seres humanos.

“Então, é necessário apoiar os esforços do Governo, que está a disponibilizar meios e vacinas para fazer face a esta alarmante situação, e encorajo a toda a população para se responsabilizar e levar todos os animais aos postos de vacinação”, acrescentou Agudelo.

Em 99% dos casos a raiva é transmitida através de mordeduras dos cães, doença que mata 59.000 pessoas por ano em todo mundo, sobretudo em África e na Ásia.

“O mais importante nessa luta é a vacinação dos animais”, concluiu o representante da OMS.

Mais de 2.000 pessoas morreram em Angola afectadas pela raiva, nos últimos dez anos, com a província de Luanda a liderar o número de óbitos, segundo dados da Comissão Técnica contra a Raiva.

Os dados revelam que entre 2007 e 2017 foram notificados 1.977 casos de mordeduras de cães vadios que resultaram em óbitos.

Em finais de Fevereiro, a Comissão Técnica contra a Raiva reuniu para fazer o balanço da implementação das actividades preconizadas no Plano Nacional de Contingência e Emergência Contra a Raiva, aprovado em Conselho de Ministros em 2007.

Nesse encontro, foi admitida a baixa cobertura de vacina, devido a factores de logística, insuficiência de recursos financeiros, humanos, equipamentos e materiais específicos para o efeito, aliado ao fraco sistema de recolha de animais vadios, na sua maioria cães.

Para o controlo da epidemia, a comissão técnica realça a importância das campanhas de sensibilização, educação e comunicação para o combate e a eliminação da raiva no mundo até 2030, meta estabelecida pela Organização Mundial de Saúde Animal.

… e por falar em cães

No Facebook do Folha 8 foi publicado em tempos o seguinte texto: “Razão tinha Kundi Paihama quando, no dia 12 de Janeiro de 2008, “botou faladura” num comício na sede do Município da Matala e disse: “Durmo bem, como bem e o que restar no meu prato dou aos meus cães e não aos pobres”. Os cães ficaram agradecidos e retribuem: “O nosso dono é muito muito bem mandado. Obediente, brincalhão, carinhoso, esperto – só lhe faltava ladrar. Por enquanto”.

Muitos leitores mostraram interesse em recordar um pouco mais sobre esta história, verídica, do actual governador do Cunene. É isso que fazemos agora, até porque alimentar a memória é um acto nobre embora, reconhecemos, possa significar um caso de rebelião ou um atentado contra a segurança do Estado.

E por que é que a comida que sobrava a Kundi Paihama não vai para os pobres?, perguntam vocês, nós também, tal como os milhões (ou serão só meia dúzia?) que todos os dias passam fome. Não vai porque não há pobres em Angola. E se não há pobres, mas há cães… é preciso alimentá-los bem.

E se todos fizessem como Kundi Paihama, não haveria cães com raiva. Continuaria a haver, é claro, angolanos a morrer à fome. Mas entre morrer à fome e morrer contaminado com raiva…

“Eu semanalmente mando um avião para as minhas fazendas buscar duas cabeças de gado; uma para mim e filhos e outra para os cães”, disse Paihama.

Não admira, por isso, que todos os angolanos procurem, afinal, ter a mesma sorte que os cães de Kundi Paihama. Tiveram, contudo, pouca sorte. Os cães que lhes tocaram em sorte estão cheios de raiva.

É claro que, embora reconhecendo a legitimidade que os cães do governador do Cunene e do regime têm para reivindicar uma boa alimentação, não se pode deixar de dar um conselho aos milhões de angolanos que são gerados com fome, nascem com fome e morrem pouco depois com fome.

Não. Não se transformem em cães para ter um prato de comida. Reivindiquem o direito tão simples de comer como os cães de Kundi Paihama.

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