O Presidente angolano, João Lourenço, vai visitar oficialmente a China a 9 e 10 deste mês, quase 40 dias depois de ter participado, em Pequim, na terceira cimeira do Fórum de Cooperação China-África. Provavelmente o Governo está a pensar abrir uma “filial” em Pequim. É que o MPLA é dono de Angola e a China é dona do dono de Angola.
Fonte da Casa Civil de João Lourenço adiantou que o Presidente da República será acompanhado pelo ministro das Relações Exteriores, Manuel Augusto, pelo Governador do Banco Nacional de Angola (BNA), José de Lima Massano e – é claro! – pelo Presidente do MPLA e pelo Titular do Poder Executivo, indicando que só na terça-feira ficarão definidos os restantes pormenores.
É preciso mais, muito mais, fiado e nesta matéria a fábrica de kumbu está em Pequim e o processo de fabrico, depois de assinada a respectiva hipoteca (o MPLA conhece melhor o termo colonial “vale” – ordem de pagamento, feita pelo proprietário de fundos àquele que é depositário desses fundos) é ultra-rápido.
Em Pequim, acrescentou a fonte, o Presidente João Lourenço será recebido pelo homólogo chinês, Xi Jinping, com quem já esteve reunido a 4 de Setembro passado, à margem daquela cimeira. E se Donald Trump admite que se “apaixonou” por Kim Jong-un, é bem natural – para além de normal – o que o mesmo se passe com Lourenço e Xi.
No encontro de então, João Lourenço manifestou a Xi Jinping o desejo de ver aumentado o investimento directo de empresas chineses na produção de bens de amplo consumo. O líder chinês anuiu mas, naturalmente, quer tudo bem ratificado preto no branco (o que significa “deixar tudo documentado”) ou, pelo menos preto no amarelo.
O Presidente João Lourenço adiantou também que o investimento pode ser feito através do estabelecimento de parcerias “mutuamente vantajosas” com empresários angolanos, na partilha de tecnologia e de conhecimento científico e na formação de quadros angolanos.
Para assegurar o êxito dos programas bilaterais de cooperação, o chefe de Estado angolano defendeu o estabelecimento de “mecanismos práticos que possibilitem o acesso aos recursos financeiros necessários para o sucesso das medidas de políticas estabelecidas pelas nações africanas”.
João Lourenço considerou também “necessário” que as instituições bancárias africanas e da China desempenhem um papel importante, “com o objectivo de tornarem real a vontade política de ambos os lados” em proporcionar os recursos e desenvolver projectos que garantam um desenvolvimento que se revele “mutuamente vantajoso”.
Durante a visita de João Lourenço, porém, não foi possível concluírem-se as negociações para a definição de um quadro geral de cooperação financeira bilateral, que ficaram então adiadas para fins de Setembro e, agora, para a visita do Presidente angolano.
“É possível que este acordo (sobre a definição do quadro geral de cooperação financeira) seja assinado na China ainda este ano”, disse então o ministro das Relações Exteriores angolano, Manuel Augusto, salientando que Pequim está disposta a financiar projectos em África, mas uma das contrapartidas, tal como definiu Xi Jinping, é a transparência nos países que queiram concorrer a esse financiamento.
Em Maio que o Governo angolano estava a negociar mais de 16.500 milhões de euros em linhas de financiamento internacionais para projectos no país, a maior parte junto de instituições da China.
De acordo com informação do Governo angolano enviada na altura a investidores internacionais, Angola está actualmente a negociar “várias novas facilidades de crédito”, algumas das quais em fase avançada de negociação.
É o caso de uma linha de financiamento em negociação com os chineses do ICBC (Banco Industrial e Comercial da China), para projectos de infra-estrutura em Angola, avaliados em 11.700 milhões de dólares (9.830 milhões de euros).
Tendo ainda o ICBC como angariador, agente e credor original, o Governo angolano, lê-se no documento, está “em vias de celebrar um contrato de empréstimo” de 1.281,9 milhões de dólares (1.076 milhões de euros), para financiar até 85% do preço do contrato para a concepção, construção e fornecimento de equipamentos do Novo Aeroporto Internacional de Luanda, em construção por empresas chinesas nos arredores da capital.
Este empréstimo será por um período de 15 anos e inclui um período inicial de carência de 18 meses, durante o qual Angola não é obrigada a reembolsar o montante principal do empréstimo.
Através do banco estatal chinês que apoia as importações e exportações do país (CHEXIM Bank), Angola está a negociar um financiamento para a construção da marginal de Corimba, em Luanda, de 690,2 milhões de dólares (579 milhões de euros), para o sistema de transporte de electricidade da barragem de Lauchimo, por 760,4 milhões de dólares (638 milhões de euros), e para a construção da base da Academia Naval, em Kalunga, Porto Amboim, no valor de 1.100 milhões de dólares (923 milhões de euros).
Só entre 2013 e final de 2017, dados do Governo angolano indicam que a dívida total de Angola à China – bilateral e aos bancos comerciais chineses – passou de 4.700 milhões de dólares (3.940 milhões de euros) para 21.500 milhões de dólares (18.000 milhões de euros), equivalente a mais de 60% de toda a dívida contraída externamente pelo país.
Ainda sem estes acordos de financiamento fechados, o Governo angolano estima fechar 2018 com um endividamento público de 77.300 milhões de dólares (65.100 milhões de euros), equivalente a 70,8% do Produto Interno Bruto (PIB) do país para este ano, excluindo a dívida da petrolífera estatal Sonangol.
Há três anos (Agosto de 2015) já o fiscalista João Espanha considerava que o acordo monetário entre Luanda e Pequim tornava Angola “uma espécie de colónia económica da China”, tornando o país asiático no “parceiro oficial” e principal.
Em declarações a propósito do acordo monetário entre os dois países, anunciado nesse mês por Rosa Pacavira, então ministra do Comércio de Angola, João Espanha argumentou que “o acordo torna a China o parceiro comercial número um e oficial de Angola”, vertendo para o papel uma situação que já se verificava, na prática.
“A China começa assim a tornar-se um parceiro comercial incontornável”, até porque passa a ter uma enorme vantagem para os importadores angolanos, que é o facto de evitarem os custos de terem de converter kwanzas para uma moeda internacional como o dólar ou até o euro, acrescentou o fiscalista e sócio da sociedade de advogados Espanha & Associados.
“É uma medida de cedência aos interesses da China, torna Angola uma espécie de colónia económica da China, e torna evidente a dependência angolana da China, é uma consequência natural, é quase a formalização de uma situação de facto”, acrescenta o advogado especialista em Direito Fiscal.
Folha 8 com Lusa