Governo escancara portas
à entrada das petrolíferas

O Governo angolano vai agilizar a forma de fazer negócios entre operadoras petrolíferas e a Sonangol, reduzindo a burocracia e aumentando a autonomia das empresas investidoras no sector, conforme prevê a nova legislação, publicada esta semana. Entretanto, o Executivo já autorizou duas aquisições de participações por parte da petrolífera italiana ENI num bloco de produção de crude em Cabinda.

O decreto presidencial 86/18, de 2 de Abril, assinado pelo Presidente João Lourenço, que aprova as novas regras, simplificadas, do relacionamento entre petrolífera estatal, concessionária nacional angolana do sector, e as operadoras.

Desde logo, o documento reconhece que a legislação anterior “estabelece um período superior a um ano, desde o início até à conclusão do processo de atribuição da qualidade de associada” da Sonangol, mas que, por outro lado, existe a “necessidade de dinamizar o processo”, para decorrer “de forma mais célere, permitindo uma maior frequência na adjudicação de novas áreas”. Assim, no que toca aos concursos públicos para atribuição de blocos petrolíferas, deixa de existir uma fase de pré-qualificação das empresas candidatas, como acontecia anteriormente, permitindo agilizar estes processos.

Atendendo à “finalidade de salvaguardar o interesse público”, relativo às indústrias petrolíferas, através da simplificação e celeridade dos processos e, “concomitantemente, maior eficiência na produção petrolífera”, o preâmbulo desta nova legislação refere a “necessidade de modificação no que diz respeito aos prazos para tramitação dos processos, bem como o aumento dos limites para aprovação de contratos pela concessionária nacional em função do seu valor”.

A nova legislação introduz assim modificações na contratação de serviços e fornecimentos pelas operadoras, aumentando os valores dos contratos que podem realizar sem necessidade de concurso público ou de aprovação da Sonangol.

As operadoras vêm passar de 250 mil dólares para um milhão de dólares o valor de contratos em que não necessitam de qualquer aprovação ou concurso, subindo de 750 mil dólares para até cinco milhões de dólares os contratos com necessidade de concurso público, mas sem obrigatoriedade do aval da Sonangol.

Por último, só os maiores contratos, acima de cinco milhões de dólares (contra os anteriores mais de 750 mil dólares), necessitam de concurso público e aprovação da Sonangol, modificação que é vista pelo sector como uma adequação à realidade actual.

O Presidente João Lourenço pretende rever, durante o primeiro semestre deste ano, o modelo do sector petrolífero aprovado pelo anterior chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, lançando a Agência Nacional de Hidrocarbonetos e Biocombustíveis. A informação consta de um despacho presidencial de final de Dezembro, com o qual João Lourenço cria um grupo de trabalho interministerial, coordenado pelo ministro dos Recursos Minerais e Petróleos, Diamantino Azevedo, tendo o “objectivo de analisar e actualizar” o Modelo de Reajustamento da Organização do Sector dos Petróleos, aprovado em maio de 2016.

Com 120 dias para concluir o trabalho, o grupo integra ainda ministro das Finanças, Archer Mangueira, o secretário de Estado dos Petróleos, Paulino Jerónimo, e o presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Carlos Saturnino.

Rever e propor o enquadramento da organização encarregue da gestão da área dos hidrocarbonetos, reanalisar a posição institucional do departamento ministerial responsável pelo sector e reformar as propostas para a constituição da Agência Nacional de Hidrocarbonetos e Biocombustíveis (ANHB), são atribuições deste grupo de trabalho.

Em Novembro último, após a exoneração de Isabel dos Santos, o ministro dos Recursos Minerais e Petróleos, Diamantino Azevedo, tinha já anunciado a intenção de criação de uma agência nacional para os petróleos, para permitir que a Sonangol se concentre na sua actividade principal, de procurar, produzir, transformar e comercializar produtos petrolíferos.

No modelo definido em 2016 e que agora será revisto, a Sonangol, enquanto concessionária estatal angolana do petróleo, deveria passar a ter apenas a função de “gestão e monitorização dos contratos petrolíferos” e os direitos sobre as empresas suas participadas vão transitar para um órgão estatal.

A Sonangol funciona com cerca de 20 subsidiárias, mas o maior grupo empresarial angolano, com perto de 10.000 trabalhadores directos, tem ainda participações em várias empresas e bancos. Em Portugal, a Sonangol tem participações directas e indirectas no Millennium BCP e na Galp.

ENI “compra” dois blocos petrolífero em Cabinda

O Governo autorizou em Março duas aquisições de participações por parte da petrolífera italiana ENI num bloco de produção de crude em Cabinda, mas ambas com efeitos a 2015.

Em causa estão dois decretos executivos de 23 de Março, assinados pelo ministro dos Recursos Minerais e Petróleos, Diamantino Pedro Azevedo. O primeiro autoriza a venda à ENI, pela petrolífera estatal angolana Sonangol, de uma participação de 16% no Bloco Norte da Zona Terrestre de Cabinda, passando a petrolífera italiana, com uma participação total de 48%, a ser operadora.

Neste grupo empreiteiro, a ACREP – Exploração Petrolífera, empresa de direito angolano e que era participada pela portuguesa Sociedade Lusa de Negócios (SLN), que entretanto passou a Galilei, do grupo do ex-Banco Português de Negócios (BPN), detém uma percentagem de 10%.

Contudo, para chegar à posição de operadora, a ENI contou ainda com a aquisição, autorizada por outro decreto executivo assinado por Diamantino Pedro Azevedo, da mesma data e igualmente com efeitos retroactivos a 31 de Março de 2015, da participação da Teikoku (17%), no mesmo bloco.

Em ambos os decretos, não é avançada informação sobre valores envolvidos no negócio ou explicações sobre os efeitos retroactivos a três anos. Numa outra autorização, o ministério liderado por Diamantino Pedro Azevedo refere que a fase inicial de pesquisa naquele bloco terminou a 31 de Março de 2015, tendo sido aprovada na altura a sua prorrogação, mas que o grupo empreiteiro não chegou a continuar os trabalhos.

Dessa forma, esse mesmo decreto valida a prorrogação com inicio a 1 de Abril de 2018 e por três anos.

Um quarto decreto executivo, nos mesmos moldes, autorizou a petrolífera estatal a vender outros 5% da sua participação no mesmo bloco à Soco Cabinda, que passa assim a somar uma posição de 22% no grupo empreiteiro, contra os 20% da Sonangol, também com efeitos a 2015.

O negócio rubricado entre as administrações da ENI e da Sonangol foi apadrinhado pelo próprio primeiro-ministro italiano, Paolo Gentiloni, a 27 de Novembro, durante a visita a Luanda – a primeira de um chefe do Governo de país ocidental – e pelo Presidente angolano, João Lourenço.

Contudo, dependia da emissão destes decretos para a sua efectivação.

De acordo com a informação disponibilizada na altura pela ENI, trata-se de um bloco localizado numa “pequena bacia petrolífera” de Cabinda, cuja produção aquela petrolífera italiana pretende “alavancar”, através do conhecimento “adquirido em actividades numa área vizinha na República de Congo”.

“No caso de descobertas significativas, a produção será facilitada pela infra-estrutura existente”, explicou a petrolífera italiana. Em Angola, a ENI garante a produção diária de 155.000 barris de crude.

Folha 8 com Lusa

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