Executivo falha metas
no combate à Malária

A malária é a principal causa de morte em Angola e é igualmente a responsável pela maior taxa de absentismo escolar e profissional (IIM, 2011 e PNLCM, 2017). A doença representa cerca de 35% da demanda de cuidados curativos, 20% de internamentos hospitalares, 40% das mortes perinatais e 25% de mortalidade materna. Em 2016 foram registados no país 16 mil óbitos resultantes da malária (PNLCM, 2017), embora Rafael Dimbo, coordenador-adjunto do Programa Nacional de Controlo da Malária, considere como um “grande sucesso” a acção do Executivo no controle da pandemia. O Executivo alocou para o Programa de Combate à Malária 7.729.461.486.00, correspondente a 8,73% do pacote destinado ao Ministério da Saúde no Orçamento Geral do Estado para o ano de 2018.

Por Nvunda Tonet e Sedrick de Carvalho

O quadro epidemiológico de Angola é caracterizado por doenças transmissíveis e parasitárias, com destaque para as grandes endemias como a malária, o VIH/SIDA e a tuberculose, juntando-se as doenças tropicais negligenciadas, como tripanossomose humana africana. O norte do país continua a ser mais afectado devido as suas características geográficas, sendo as regiões mais endémicas as províncias de Cabinda, Zaire, Uíge, Cuanza Norte e Sul, Malange, e as Lundas Norte e Sul.

O médico Pedro de Almeida, especialista em Ginecologia-Obstetrícia e docente universitário, lamenta a dotação orçamental disponibilizado à saúde, e começa a sua crítica numa perspectiva comparativa com os demais países africanos, pois, frisa o técnico, o orçamento para a saúde em África ronda os 11 por cento do pacote geral.

Pedro de Almeida destaca que, “se o governo prevê gastar menos com a saúde, ao destinar um orçamento reduzido ao sector, significa que a maioria da despesa com as questões sanitárias será paga pela população em geral”, o que claramente acarreta o aumento do índice de mortalidade materno-infantil por malária visto que a população maioritariamente não tem condições financeiras para custear os serviços de saúde privados, em alternativa aos hospitais estatais que continuarão a não ter medicamentos e equipamentos médicos.

Apontando para o valor destinado ao Programa de Combate à Malária, o especialista salientou que, “apesar do número de casos e óbitos por malária em Angola ter sofrido uma ligeira redução em 2017, comparativamente ao ano de 2016, o orçamento destinado para o controlo desta doença deveria ser aumentado tendo em conta que os indicadores sociais revelam uma evolução negativa”. Acrescentou que “contribuem para esta visão menos positiva da situação a degradação do saneamento básico associada às dificuldades para o controlo vectorial (mosquito), assim como as dificuldades em aplicar as medidas de protecção e prevenção individual e colectiva”.

Entretanto, Pedro de Almeida realça o plano de implementação da Central de Compras de Medicamentos e Equipamentos de Angola (CECOMA), constante do programa orçamental do ministério da Saúde, quando aponta para uma possibilidade da “melhoria da qualidade de tratamentos à população afectada pela doença” malária, e enfatiza a obtenção de dados mais precisos que permitam quantificar os níveis de incidência da Malária em todo o território nacional.

“Com a boa gestão dos serviços de combate à malária, tendo em conta a população afectada e os gastos com medicamentos, equipamentos e os materiais utilizados para as medidas de prevenção eficaz, se poderá então elaborar um relatório com dados confiáveis que permitirão no futuro proceder à alocação de verbas para o controlo da doença de modo mais realista”, perspectiva.

O médico conclui o seu comentário em exclusivo ao F8 com uma dedução: “podemos deduzir que o Executivo angolano ao atribuir 8.73% do OGE do Ministério da Saúde, para o Programa Nacional de Controlo da Malária, esteja optimista com a implantação do CECOMA, que permitirá a utilização mais racional e realista dos recursos destinados a fazer face ao controlo da doença. Convém realçar que mais de 50 países do chamado terceiro mundo, obtiveram sucesso no combate e controlo da Malária com a aplicação criteriosa do programa CECOMA, com realce para o reino de Marrocos no norte de África que já eliminou a doença no seu território.”

Rafael Massanga Sakaita Savimbi, deputado pela bancada parlamentar da UNITA, é categórico em afirmar que o valor alocado ao Programa de Combate à Malária pelo Executivo reflecte a falta de identificação dos reais problemas da população por parte do partido governante que, dado ao afastamento da população, não consegue definir a ordem prioridades.

Massanga Sakaita chama atenção ao facto de os programas de prestação de serviços de saúde e saúde pública beneficiarem de 42,68 por cento do total previsto para o orçamento do sector.

“Num primeiro momento é importante que os proponentes desta proposta descodifiquem este item. Será que nesta prestação de serviços de saúde entra o combate à malária ou não? Se não, qual é esta saúde pública que ultrapassa o combate à principal causa de morte no nosso País”, questiona o deputado.

E conclui frisando a “falta de capacidade de ultrapassar os hábitos antigos e mudar a forma de projectar Angola, cuja prioridade tem de ser o bem-estar dos cidadãos”.

Para o activista Osvaldo Caholo, um dos ex-17 presos políticos, num artigo publicado no site Rádio Angola, “o orçamento pode revelar se o padrão de gastos e o desenho dos programas condizem com as promessas feitas durante a campanha eleitoral”. Alerta para a necessidade do cidadão ser o principal agente fiscalizador da implementação dos programas previstos no orçamento geral do estado pois, “por excelência, o Orçamento Geral do Estado é o ponto de partida para acompanhar os gastos dos recursos arrecadados pelo Estado”, e impulsiona “os jornalistas e os cidadãos no geral [a] fazer a cobertura das políticas sociais, seguir os dados e números (dinheiro) para desvendar e evitar esquemas de corrupção”.

Roubo dos valores do Fundo Global

O Fundo Global tornou público em 2016 a conclusão de um relatório em que denunciou que cerca de 4,3 milhões de dólares destinados ao programa de combate à malária em Angola foram desviados por responsáveis angolanos.

As verbas em causa foram desviadas, segundo o relatório, para as empresas Gestinfortec, NC&NN e Soccopress, propriedade de dois dos suspeitos, envolvendo “pagamentos fraudulentos” de materiais de comunicação, equipamentos técnicos e produtos de saúde.

A ONG exigiu directamente do Executivo angolano a recuperação de 3,6 milhões de dólares (3,1 milhões de euros), tendo recebido 2,9 milhões de dólares (2,5 milhões de euros) até 2016, por parte do ministério da Saúde.

Desafios da Malária em Angola

Os principais desafios da malária em Angola que descreveremos a seguir têm como base os dados do Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitário 2012-2025, aprovado pelo Executivo, e a Declaração de Abuja (2000) da qual Angola é subscritora.

– Redução da mortalidade infantil resultantes da doença. Em cada mil crianças que completam o primeiro ano de vida, 25 morrem entre o primeiro e o quinto aniversário (IIMS, 2016). Numa comparação com cinco países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) – Namíbia, Zâmbia, República Democrática do Congo, Lesoto e Moçambique -, o inquérito revela que Angola está atrás apenas da Namíbia.

– Pulverização intra e extra domiciliar direccionadas para os municípios tidos como de alto risco, distribuição de redes mosquiteiros e campanha de consciencialização da população sobre os métodos de prevenção à malária.

– Adopção de instrumentos legislativos no Sistema Nacional de Saúde para implementar as medidas de prevenção e controlo das emergências de saúde pública de importância nacional e internacional.

– Assegurar a formação contínua pós-graduada e a sustentabilidade de recursos humanos e de serviços de saúde de qualidade.

Actualmente, cerca de 36% da população angolana vive abaixo da linha de pobreza e com dificuldade de acesso aos serviços públicos básicos (água, saneamento, energia, saúde, educação e habitação).

Acordos

O governo de Angola aderiu a iniciativa Roll Back Malária/Fazer Recuar o Paludismo (RBM), lançada por algumas Agências das Nações Unidas, como a OMS, UNICEF, PNUD e Banco Mundial em 1998, e desde então foram definidas politicas e estratégias para estar em sintonia com as componentes técnicas da declaração de Amsterdão e das metas da Declaração de Abuja sobre o combate a malária e revitalização do sistema nacional de saúde.

É importante destacar que o governo cessante liderado por José Eduardo dos Santos tomou a Iniciativa Presidencial contra a Malária (IPM, 2014) em reforço ao Plano Estratégico do Programa Nacional de Controlo da Malária 2011-2015 do ministério da Saúde.

Questão de fundo: Quando é que o Executivo angolano pretende alcançar os objectivos assinados no Plano Roll Back, na Declaração de Abuja (2000) e Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitário em relação a Malária?

Referências:

Orçamento Geral do Estado 2018 (205-209), Declaração de Abuja (2000), Relatório de Inquérito de Indicadores da Malária em Angola (2011), Inquérito de Indicadores Múltiplos de Saúde (2015-2016), Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitário 2012-2025, Fundo Global (2016).

Programa de investimentos públicos para a saúde – OGE 2018

Cabinda
Construção e Apetrechamento 1ª Fase do Hospital Geral Cabinda
Cuito
Reabilitação e Apetrechamento Do Hospital Provincial do Bié/MINSA
Estrutura Central
Construção e Apetrechamento do Centro Nacional De Emergências Médica Construção e Apetrechamento da Casa Mortuária de Cabinda, Morgue Central da Província de Cabinda, Construção e Apetrechamento Hospital Centro de Cabinda, Centro de Hemodiálise do Hospital Provincial de Cabinda
Kilamba Kiaxi
Reabilitação do Hospital Sanatório de Luanda
Luanda
Construção e Apetrechamento do Instituto de Anatomia Forense de Luanda, Construção e Apetrechamento do Instituto Hematológico Pediátrico de Luanda, Construção e Apetrechamento 1ª Fase Hospital Geral Pediatria de Luanda.
Aquisição de Clínicas Móveis e Motorizadas.

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One Thought to “Executivo falha metas
no combate à Malária”

  1. Álvaro

    Realmente escandaloso o orçamento destinado para a saúde assim como para a educação. Será que o investimento nas forças armadas que é superior ao destinado para a educação e saúde juntos suprirá as necessidades vitais para um país em que uma boa parte do povo vive em grande pobreza? Ou os responsáveis por este vergonhoso orçamento pretendem algo não explicado? Tomara os governantes deste país recorressem não ao estrangeiro mas a assistência médica nacional!

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