O Jornal de Angola, detido pelo Estado angolano, volta hoje a criticar, em editorial, Isabel dos Santos, sobre o direito de resposta da empresária a um artigo do diário, recusando ser “caixa de ressonância” para fazer prevalecer “alguma iniquidade”.
“O ‘Jornal de Angola’ é um órgão de informação de uma empresa pública [Edições Novembro EP] e procura no novo ciclo político não ser caixa-de-ressonância de cidadãos ou grupos económicos que querem fazer prevalecer alguma iniquidade, num indesejável quotidiano de promiscuidade entre o público e o privado”, lê-se no editorial de hoje.
Intitulado “Ética, por favor”, o editorial do diário estatal volta hoje ao diferendo com Isabel dos Santos, em torno do artigo assinado pelo novo director do Jornal de Angola, Victor Silva, de 19 de Novembro, em que a gestão de Isabel dos Santos na Sonangol era criticada.
A empresária e filha do anterior chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, enviou um direito de resposta ao jornal, que não o publicou alegando exceder, em tamanho, o artigo que lhe deu origem e factos não visados no mesmo. Isabel dos Santos divulgou na quarta-feira, tal como o Folha 8 noticiou, o referido direito de resposta, na íntegra, e já hoje o Jornal de Angola publica a nova versão do mesmo.
“Sobre o extenso comunicado divulgado nas redes sociais muito se poderia apontar, mas não é muito importante para o ‘Jornal de Angola’ e o seu director andar a fazer chicana na praça pública, sobre um assunto que porventura terá algo de capcioso. O ‘Jornal de Angola’ assume-se com o objectivo de informar e se puder ajudar a um esforço conjunto para melhorar a democracia fazendo-o com verdade e liberdade é uma vitória de que no futuro nos orgulharemos”, lê-se no editorial de hoje.
Na versão inicial do direito de resposta, a empresária Isabel dos Santos afirma que a sua “competência não está em questão” e que não é “apropriado” relacionar ser filha do ex-chefe de Estado angolano e os resultados da liderança de 17 meses na Sonangol.
Isabel dos Santos foi nomeada Presidente do Conselho de administração da Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola (Sonangol) por José Eduardo dos Santos, em Junho de 2016, e exonerada este mês pelo novo chefe de Estado, João Lourenço.
“A sua afirmação [editorial de 19 de Novembro], de que o meu estatuto de ‘filha de um chefe de Estado’ teria sido uma desvantagem para garantir o financiamento necessário para a reestruturação da Sonangol, é contrariada por factos facilmente verificáveis. De destacar que trabalhei ao longo da minha carreira profissional (20 anos) com esse estatuto, sendo que o mesmo nunca me impediu de desenvolver relacionamentos bancários com as principais instituições financeiras internacionais”, acusa a empresária, no direito de resposta.
“A palavra nepotismo significa a promoção de uma pessoa incompetente para um determinado cargo pelo único facto de ser membro da sua família. Como a minha competência não está em questão, não será apropriado tentar estabelecer um vínculo entre as minhas relações familiares e os resultados do meu mandato”, critica ainda, no direito de resposta dirigido a Victor Silva, que assumiu a liderança da Edições Novembro este mês, indicado por João Lourenço, o novo Presidente angolano.
No editorial de hoje, o Jornal de Angola recorda o “esforço” de resgate de “valores de respeito, solidariedade e harmonia social” do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, ao mesmo tempo que aponta que “uma sociedade que se pretende construída na legalidade democrática deve fundamentar os seus valores, numa ética em que sejam salvaguardados princípios de convivência sã entre os seus cidadãos, independentemente da origem de classe ou estatuto”.
“Vivem-se estados de depressão fruto da situação económica do País, mas também se vivem tempos esperançosos, e que o novo governo eleito pelos cidadãos possa promover o bem-estar prometido há tanto tempo, que apenas alguns usufruem, nalguns casos de forma até ostensiva”, afirma ainda o editorial.
O texto do jornal estatal refere-se a Isabel dos Santos, como, “segundo a revista Forbes”, a ” maior fortuna de África”, pelo que tem “responsabilidades acrescidas”.
“Os privilégios de ostentação e de fortunas pessoais turbo-acumuladas não podem servir em circunstância alguma para as pessoas se colocarem em manifesta superioridade perante o cidadão comum, que sofre um quotidiano de miséria e que cada vez mais descrê das instituições”, lê-se numa outra passagem do editorial.
Folha 8 com Lusa