Governo aperta cerco
às mordomias da elite

De acordo com o Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2018, o Governo angolano quer suspender e retirar vários direitos e regalias a detentores de cargos públicos e antigos governantes. O OGE refere “suspensão e restrição de direitos e regalias” porque é preciso ter “atenção à premente necessidade de consolidação e estabilização orçamental”.

De acordo com o artigo 17 da proposta de lei do OGE para 2018, está prevista a suspensão da atribuição, em 2018, dos subsídios de renda de casa, de manutenção de residência e de reinstalação para todos os beneficiários, bem como da subvenção mensal vitalícia a beneficiários remunerados de forma cumulativa, “salvo se o beneficiário optar por receber exclusivamente a subvenção mensal vitalícia”.

A proposta de lei propõe ainda a suspensão da atribuição de veículos do Estado para apoio à residência aos titulares de cargos políticos, magistrados e outros beneficiários.

Além disso, a proposta do Governo prevê, durante o exercício económico de 2018, restringir o subsídio de instalação em 50% para todos os beneficiários, o subsídio de estímulo em 50%, cujo pagamento deverá ocorrer em parcela única, e a redução para dois no número de empregados domésticos para titulares de cargos políticos, magistrados e outros beneficiários.

Por manifesta incompetência política dos governos anteriores, todos do MPLA desde 1975, Angola vive uma profunda crise financeira, económica e cambial desde finais de 2014, decorrente da quebra para metade nas receitas com a venda de petróleo, que garante mais de 95% das exportações nacionais.

Na proposta orçamental para 2018 é também reduzida as classes dos bilhetes de viagem dos titulares de cargos políticos, magistrados, deputados e respectivos cônjuges, da 1.ª classe para a classe executiva e, dos titulares de cargos de direcção e chefia, da classe executiva para a classe económica.

“Durante o exercício económico de 2018, o Presidente da República deve aprovar um quadro legal sobre o sistema de atribuição gratuita de combustível a vários destinatários, devendo o mesmo obedecer aos princípios da racionalidade financeira e orçamental e da eficiência económica”, define ainda a mesma proposta de lei.

Na proposta de OGE, cuja votação final no Parlamento deverá acontecer até 15 de Fevereiro, o Governo estima despesas e receitas de 9,658 biliões de kwanzas (48,8 mil milhões de euros) e um crescimento económico de 4,9% do Produto Interno Bruto.

Trata-se do primeiro OGE que João Lourenço, empossado a 26 de Setembro como terceiro Presidente da República e líder do Governo, leva ao Parlamento, depois de 38 anos de liderança em Angola a cargo de José Eduardo dos Santos que, contudo, se mantém como presidente do MPLA.

Garantias do Estado

João Lourenço vai, entretanto, poder autorizar a concessão de garantias do Estado até 2.560 milhões de euros em 2018, segundo a mesma proposta do OGE, um aumento superior a 15% face a este ano.

A proposta de lei do OGE para 2018 define que o limite para a concessão de garantias pelo Estado é fixado em 500 mil milhões de kwanzas (2.564 milhões de euros).

“O Presidente da República, enquanto titular do poder executivo, tem competências para conceder garantias do Estado a operadores económicos nacionais, para projectos do âmbito do programa de diversificação da economia nacional”, define o artigo sexto da mesma lei.

No OGE de 2017 foi aprovado um limite para a concessão de garantias pelo Estado de 425 mil milhões de kwanzas (2.180 milhões de euros), enquanto em 2016 esse tecto foi fixado em 719 mil milhões de kwanzas (3.688 milhões de euros, à taxa de câmbio actual).

Recorde-se que, no final de 2013, o Presidente assinou uma garantia estatal a favor do crédito de mais de 3.000 milhões de euros concedido pelo Banco Espírito Santo (BES) português ao BES Angola. Esta foi depois cancelada, em Agosto de 2014, na sequência da intervenção do Banco Nacional de Angola na instituição, que passou a Banco Económico, com a petrolífera Sonangol como principal accionista.

O Estado angolano prevê endividar-se em 5,254 biliões de kwanzas (26,9 mil milhões de euros), no ano de 2018, o equivalente a 22% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado pelo Governo.

Este volume de endividamento corresponde a 1,100 biliões (milhões de milhões) de kwanzas (5,6 mil milhões de euros) de necessidades líquidas de financiamento, nomeadamente para cobrir o défice de 2,9% do PIB estimado para 2018, no valor de 697,4 mil milhões de kwanzas (3.560 milhões de euros), e para aquisição de activos financeiros, por 403,4 mil milhões de kwanzas (2.068 milhões de euros).

Acrescem 4,153 biliões de kwanzas (21,3 mil milhões de euros) que Angola necessitará para garantir amortizações de dívida, interna e externa, durante todo o ano de 2018.

De acordo com o documento, até Julho de 2017, o stock da dívida governamental – com excepção da contraída pelas empresas públicas – estava avaliada em 9,970 biliões de kwanzas (51,1 mil milhões de euros), correspondendo a 59,84% do PIB.

“A dívida do país mantém-se solúvel a prazo. Todavia, a política fiscal experimenta um contexto de ‘stress’ no curto prazo, demandando-se um processo comprometido e consistente de consolidação fiscal e das finanças públicas, incluindo um aprofundamento institucional em sede da cadeia de valor das finanças públicas, desde o ciclo orçamental à gestão de tesouraria”, lê-se no documento.

Na proposta de OGE o Governo estima despesas e receitas de 9,658 biliões de kwanzas (48,8 mil milhões de euros) e um crescimento económico de 4,9% do PIB.

Segurança e Defesa, Defesa e Segurança

O Governo prevê gastar em 2018 mais de 975 mil milhões de kwanzas (5.000 milhões de euros) em Defesa e Segurança, equivalente a 21,27 por cento de todas as despesas do Estado, ligeiramente abaixo do orçamentado para este ano.

Para 2017, o último OGE apresentado por José Eduardo dos Santos, enquanto Presidente da República e Titular do Poder Executivo, o valor inscrito na rubrica de Defesa, Segurança e Ordem Pública, que inclui militares, polícias, serviços prisionais, tribunais e bombeiros, foi de 1,012 biliões de kwanzas (5.190 milhões de euros), o equivalente a 20% de todas as despesas.

Nesta proposta de OGE, o Governo prevê gastar 11,30% das despesas públicas com a Educação, equivalente a 517,78 mil milhões de kwanzas (2.650 milhões de euros), 7,40% com a Saúde, na ordem dos 339,13 mil milhões de kwanzas (1.740 milhões de euros), e 14,83% com a Protecção Social, com cerca de 680 mil milhões de kwanzas (3.490 milhões de euros).

Desenganem-se os que pensam que o Orçamento Geral de Estado é um documento técnico feito por uns sábios economistas, que reflecte necessidades técnicas. Não é. É um documento político que traduz em números as opções políticas do poder executivo.

É, aliás, o documento político mais importante em cada ano. Nessa medida, o que traduz politicamente o OGE de Angola nos últimos anos é uma simples palavra: repressão.

A opção política do OGE de 2018, como a deste ano, é simples e está vertida nos respectivos números. A política do OGE de 2018 volta a ser a política da repressão.

A verdade é que, quando o povo sofre uma intensa crise económica, o Governo não se preocupa com os apoios sociais: preocupa-se com a repressão. Apenas assim é possível justificar que mais de um quinto (21,27%) do OGE se destinem à Defesa e Segurança.

Foto: O Executivo angolano recebeu 30 viaturas Mercedes-Benz, das quais 25 de luxo, especialmente adquiridas para a cerimónia de investidura do Presidente da República, João Lourenço.

Folha 8 com Lusa

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