Se for do MPLA, o crime (re)compensa… sempre!

O Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público angolano propôs ao Presidente da República, João Lourenço, a promoção de três actuais procuradores adjuntos para sucederem ao general João Maria de Sousa na liderança da Procuradoria-Geral da República.

A informação consta de uma deliberação daquele Conselho, propondo Hélder Fernando Pitta Gróz, vice-procurador-geral da República para a esfera militar e procurador militar das Forças Armadas Angolanas, e Luís Mota Liz e Pascoal Joaquim, ambos procuradores-gerais adjuntos para aquele lugar.

O Presidente João Lourenço deverá empossar nos próximos dias um novo procurador-geral da República, com o mandato do actual responsável, João Maria de Sousa, a expirar hoje.

Licenciado em Direito pela Universidade Militar de Moscovo, o general João Maria de Sousa, de 66 anos, foi nomeado a 3 de Dezembro de 2007 e empossado procurador-geral da República de Angola pelo então chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, dois dias depois.

Enquanto presidente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público, João Maria de Sousa convocou para 24 de Novembro uma reunião plenária daquele órgão, desencadeando então o processo que levará o chefe de Estado a nomear o próximo procurador-geral da República.

O PGR da corrupção e contra a lei

Recorde-se que, como sucursal do MPLA, a Procuradoria-Geral da República, através do seu chefe, general João Maria Moreira de Sousa, deu razão ao candidato do patrão, o MPLA, João Lourenço, da participação da UNITA que o acusava de oferecer diversos bens (viaturas, bicicletas, tractores e charruas e arcas e geleiras) e géneros alimentares durante a campanha eleitoral, que que à luz do artigo 43 da Lei Orgânica das Eleições Gerais (isto se a lei fosse para levar a sério) constitui corrupção eleitoral.

Em resposta, o PGR considerou que “a doação desses bens, não obstante ter sido efectuado em período de pré campanha e durante a campanha eleitoral, teve como finalidade suprir ou minimizar carências reais e efectivas daqueles cidadãos.”

“O candidato do MPLA ao fazer as referidas ofertas de forma pública, à luz do dia e, inclusive, com a cobertura dos órgãos de comunicação social, certamente assumiu a sua conduta como não proibida e não punida por lei, tanto mais que tal prática no nosso país e continente é rotineira e decorrente de usos e costumes que em actividades festivas ou em casos de visitas, se exige e se impõe a troca de oferendas”, disse o PGR do MPLA.

No seu ponto de vista, “se por um lado, não há quaisquer dúvidas de que o candidato do MPLA ofereceu bens materiais tanto a cidadãos comuns quanto a representantes de instituições religiosas, de caridade e autoridades tradicionais, por outro lado, contrariamente ao alegado pelo denunciante, não há provas de que tenha directa e especificamente ou indirectamente persuadido os beneficiários a votar na sua candidatura em troca dos bens que oferecia, ou que terá pretendido deles a obter a promessa de que votariam na sua candidatura.”

Para além de uma ridícula palhaçada, a argumentação do PGR apresenta-se como mais uma séria candidata ao anedotário nacional, se bem que sirva também como o maior atentado à inteligência dos angolanos.

Para João Maria de Sousa, “sendo inútil a abertura, investigação e instrução de um processo-crime, por não estarem reunidos os elementos constituídos do crime de corrupção eleitoral, indeferido o pedido, e, consequentemente, determino o seu arquivamento.”

PGR ajoelhou bem e rezou ainda melhor

Relembre-se ainda que a PGR do MPLA – não de Angola – considerou, cumprindo obviamente “ordens superiores”, a nomeação de Isabel dos Santos uma competência legal do Presidente da República, ao abrigo da Lei de Bases do Sector Empresarial Público.

A posição surgiu no despacho de resposta da PGR a uma queixa, formalizada a 16 de Junho de 2016 por Rafael Marques de Morais, invocando a inconstitucionalidade dos decretos presidenciais de reajustamento da organização do sector petrolífero e com alterações aos estatutos da concessionária pública Sonangol “sem prévia autorização da Assembleia Nacional”.

Com essa queixa, Rafael Marques de Morais pedia ainda a intervenção do Ministério Público para que solicitasse a “imediata” declaração da suspensão da eficácia da nomeação de Isabel dos Santos para PCA da Sonangol, feita pelo chefe de Estado e pai da empresária, José Eduardo dos Santos, também em Junho, por ser “um acto deles [decretos presidenciais] derivado”.

Contudo, a PGR refere, citando o artigo número 120, que nos termos da Constituição, “o Presidente da República é o titular do poder executivo e nessa qualidade deve dirigir os serviços e a actividade da administração directa do Estado, civil e militar, superintender a administração indirecta e exercer a tutela sobre a administração autónoma”.

A família Dos Santos continuava a gozar com a chipala de, pelo menos, 20 milhões de angolanos que vivem na pobreza. Mas que melhor exemplo de elevada moralidade, e ainda mais elevado valor ético, poderemos querer do que o que nos é dado quando o pai nomeia a filha para mandar na maior empresa pública do país?

João Maria de Sousa cumpre 40 anos ao serviço do Ministério Público angolano, nos foros Militar e Comum, e será agora jubilado. Ser sipaio do regime/MPLA dá sempre direito a um prémio. Num Estado de Direito daria certamente direito a ser julgado.

O estatuto orgânico da Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola define que o procurador – e vice-procuradores – “é nomeado e exonerado” pelo Presidente da República, “sob proposta do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público”.

“O procurador-geral da República toma posse perante o Presidente da República para um mandato de cinco anos, renovável uma vez”, define a lei.

O Presidente de Angola, João Lourenço, no cargo desde 26 de Setembro, admitiu recentemente a necessidade de “moralização” da sociedade, com um “combate sério” a práticas que “lesam o interesse público” para garantir que a impunidade “tenha os dias contados”. Se isso fosse para cumprir…

O chefe de Estado falava no Palácio Presidencial, em Luanda, na tomada de posse do novo Inspector-Geral da Administração do Estado, o comissário Sebastião Domingos Gunza, que foi buscar ao Serviço de Investigação Criminal (SIC).

“No quadro da necessidade de moralização da nossa sociedade, importa que levemos a cabo um combate sério contra certas práticas, levadas a cabo, quer por gestores, quer por funcionários públicos. Práticas que, em princípio, lesam o interesse público, o interesse do Estado, o interesse dos cidadãos que recorrem aos serviços públicos”, apontou João Lourenço.

“Esperamos que a tão falada impunidade nos serviços públicos tenha os dias contados. Não é num dia, naturalmente, que vamos pôr fim a essa mesma impunidade, mas contem com a ajuda de todos e acreditamos que, paulatinamente, vamos, passo a passo, caminhar para a redução e posteriormente a eliminação da chamada impunidade”, disse ainda João Lourenço

Desde que tomou posse, a 26 de Setembro, na sequência das eleições gerais angolanas de 23 de Agosto, João Lourenço exonerou várias administrações de empresas estatais, dos sectores de diamantes, minerais, petróleos, comunicação social, banca comercial pública e Banco Nacional de Angola, anteriormente nomeadas por José Eduardo dos Santos.

A exoneração de Isabel do Santos, filha do ex-chefe de Estado, do cargo de presidente do conselho de administração da petrolífera estatal Sonangol, foi a decisão mais mediática, seguida da polícia, chefias militares e Tribunal Constitucional.

Não consta, contudo, que nenhum dos exonerados venha a ser investigado para se saber o que, de facto e de jure, fez na liderança dessas empresas. O crime continua a (re)compensar. Vejam-se também os exemplos das outras sucursais do MPLA, a Comissão Nacional Eleitoral e o Tribunal Constitucional.

Folha 8 com Lusa

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