A fome e a sede dos escravos

Mais de 10% da população mundial não tem acesso a água potável. É um drama? É sim senhor. Então imaginemos o que acontece em Angola onde esse valor sobe para mais de 50%. Moçambique e Guiné Equatorial não estão melhor. No nosso caso é que dá viver num país com 20 milhões de pobres. O regime do MPLA, no poder desde a independência, em 1975, está de parabéns.

Aorganização WWC, na sigla em inglês, que junta mais de 300 entidades de 50 países, refere que mais de 923 milhões de pessoas não têm acesso a água potável, das quais 319 milhões na África subsaariana (32% da população da região), 554 milhões na Ásia (12,5%) e 50 milhões na América do Sul (8%), situação responsável pela morte de 4.500 crianças por dia.

E por falar em crianças (é só para lembrar), Angola é o país do mundo com o maior índice de mortalidade infantil.

“Entre estas regiões, a Papua Nova Guiné tem a menor disponibilidade, com apenas 40% da população a ter acesso a água potável”, seguindo-se “a Guiné Equatorial com 48%, Angola com 49%, Chade e Moçambique com 51%, a República Democrática do Congo e Madagáscar com 52% e Afeganistão com 55%”, refere um comunicado divulgado pelo WWC.

Aproveitando o Dia Mundial da Água, que se assinala na quarta-feira, o WWC alertou todos os governos para a urgência de resolver este problema e realçou que “o custo total da insegurança da água para a economia global é avaliado em 500 mil milhões de dólares”.

Mas, se for incluído o impacto ambiental, aquele valor pode aumentar para 1% do Produto Interno Bruto (PIB) global.

Além do custo económico, a falta de água potável está relacionada com diversas doenças e epidemias que causam 3,5 milhões de mortes por ano, mais do que aquelas causadas por acidentes de viação e pela SIDA, em conjunto, segundo as contas da organização.

Pode também contribuir para a fome, guerras e migrações “irregulares e descontroladas”, havendo uma “absoluta necessidade” de aumentar a segurança da água para ultrapassar os desafios colocados pelas alterações climáticas e pelas efeitos da actividade humana.

Reafirma a organização que o acesso das pessoas ao saneamento e a água potável “são prioridades fundamentais para os governos locais e regionais”, a fim de alcançar um dos objectivos do Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, e só pode ser alcançado “com um bom governo local, gestão sustentável dos recursos naturais e urbanização eficaz”.

Assim, “encoraja os governos e os cidadãos a aumentar a segurança hídrica nos seus países, assim como prestar auxílio às nações com maiores dificuldades, nomeadamente na África subsaariana e Ásia”.

Um dos objectivos da ONU é que todas as pessoas tenham acesso a água potável e saneamento até 2030. No caso de Angola, para que tal aconteça será necessário que o MPLA se mantenha no poder aí até 2100, não é senhor José Eduardo dos Santos?

Nas contas do WWC, é necessário um investimento anual de cerca de 650 mil milhões de dólares até 2030, para garantir a concretização das infra-estruturas necessárias para alcançar a segurança universal da água.

O Dia Mundial da Água deste ano é dedicado ao desperdício deste recurso e o presidente do WWC, Benedito Braga, citado no comunicado, resume a situação dizendo que “cerca de 90% das águas residuais do mundo são despejadas no ambiente sem tratamento, mais de 923 milhões de pessoas no mundo não tem acesso a água potável e 2,4 mil milhões de pessoas não têm saneamento adequado”.

“Todos os anos uma em cada cinco crianças com idade inferior a cinco anos morre prematuramente devido a doenças relacionadas com a água e quase 40% da população mundial já enfrenta problemas de escassez de água e pode aumentar para 66% em 2025” a que acresce cerca de 700 milhões de pessoas a viver em áreas urbanas sem instalações sanitárias seguras, acrescentou.

O Conselho Mundial da Água está a organizar o 8.º Fórum Mundial da Água, que vai realizar-se em Março de 2018, em Brasília, no Brasil, e terá cerca de 30 mil participantes.

Em Setembro do ano passado, o secretário de Estado das Águas de Angola, Luís Felipe da Silva, garantia que com o programa “Água para Todos”, 80% da população desfavorecida, que habita em zonas críticas, iria ser abastecida com água potável.

A garantia, em contexto eleitoral, foi do secretário de Estado das Águas que discursava na abertura do Fórum de Negócios Angola-Dinamarca 2016. Luís Felipe da Silva sublinhou que o crescimento e a expansão do sector das águas e a entrada de capital privado são eixos estratégicos de longo prazo com impacto no desenvolvimento do país, no horizonte 2025.

“Acreditamos que o potencial e a experiência do Reino da Dinamarca vão conduzir-nos a melhores soluções, face às nossas necessidades”, concluiu Luís Felipe da Silva.

Por sua vez a embaixadora da Dinamarca em Angola, Trine Rask Thygesen, afirmou que Angola entrou no novo milénio com taxas de crescimento impressionantes.

A diplomata, que também descobriu o “ovo de Colombo”, afirmou que a redução do preço do petróleo acentuou a necessidade de Angola diversificar a economia, desenvolver a capacidade produtiva e criar infra-estruturas para gerar um crescimento económico sustentável.

“A resposta do Executivo angolano tem sido, entre outras, o foco em fazer crescer a economia em recursos naturais e ambientais”, disse.

“Com este foco na água e na energia, o Fórum será um excelente catalisador para fortalecer os nossos laços políticos e económicos, forjando novas parcerias para o futuro”, ressaltou.

A dura e seca realidade

Mais de metade dos cerca de 5,5 milhões de agregados familiares de Angola, um país que é o maior produtor africano de petróleo e tem como Presidente da República o mesmo cidadão desde 1979, não têm acesso a água “apropriada” para beber e 31,6% têm nas lanternas a forma de iluminação.

O levantamento entende por água “apropriada para beber” a proveniente de fontes como torneiras ligadas à rede pública, chafarizes públicos, furos com bomba ou nascentes protegidas, incluindo-se neste grupo 43,6% dos agregados familiares.

A disparidade faz-se sentir entre o meio urbano e o rural, em que respectivamente 57,2% (1,9 milhões de famílias) e 22,4% (484 mil famílias) conseguem consumir água tida como segura.

Ainda assim, a água da rede pública com torneira em casa apenas serve 17% dos 5.544.834 de agregados familiares (num total de população superior a 25,7 milhões de habitantes).

Cabinda surge como a região com o melhor nível de acesso a água segura (73% das famílias), enquanto o Cunene, no Sul, apresenta o pior registo: 23,3% dos agregados familiares.

Com um forte défice de produção de electricidade, face às necessidades, o que leva a constantes constrangimentos no fornecimento, Angola encara ainda a inexistência de redes para abastecer as zonas mais rurais.

O acesso à rede de electricidade é apenas garantido a 1,7 milhões de casas (31,9%), quase exclusivamente em zonas urbanas, já que na área rural apenas 48.173 agregados familiares são servidos.

Ao nível da rede eléctrica nacional (essencialmente nos grandes centros), as lanternas são a segundo principal fonte de iluminação. Servem mais de 1,752 milhões de famílias (31,6%) em Angola. Seguem-se em alternativa os candeeiros (14,3%) e os geradores (9,3%).

Já no saneamento básico (presença em casa de sanitas, pias ou com instalações ligadas a fossas sépticas e latrinas) a 60% das famílias, novamente com uma forte disparada entre urbano e rural: respectivamente 81,8% (2,7 milhões de agregados) e 25,9% (559 mil).

Promessas metem água

Quarenta e um anos depois da independência, 15 anos depois de alcançada a paz, o Governo diz que quer duplicar o abastecimento de água a Luanda, província com mais de 6,5 milhões de habitantes, e levar a água potável a mais 1,5 milhões de pessoas que moram em áreas rurais até 2017.

Outra das metas anunciadas pelo executivo passa por levar o Programa Água para Todos (PAT), de abastecimento às populações rurais, a mais de cinco milhões de pessoas até final do 2017, num investimento global que ronda 1,5 mil milhões de euros.

Desde 2007, ao abrigo deste programa, foram construídos 3.035 pontos de água – que correspondem a um sistema em que a recolha de água é efectuada na origem, servindo de chafariz ou lavandaria -, e com mais 395 em execução em todo o país.

Acrescem ainda 923 pequenos sistemas de água – incluem captação superficial, tratamento e abastecimento a mais do que um chafariz – construídos desde 2007 e mais 279 em execução.

O Governo também anunciou que pretendia procurar reservatórios de água subterrâneos em zonas desérticas para minimizar os efeitos dos sucessivos ciclos de estiagem que têm afectado sobretudo o sul do país.

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