Esperar ou… reagir,
agir ou desesperar?

O Tribunal Constitucional angolano, levando em conta que as “ordens superiores” já começam a ter dois titulares (José Eduardo dos Santos e João Lourenço), deverá um dias destes analisar o processo contra a nomeação de Isabel dos Santos para a petrolífera Sonangol, um ano depois de a empresária ter sido indicada – exclusivamente por ser a única pessoa em todo o país com capacidade profissional para esse efeito – pelo pai, o Presidente da República.

Recorde-se que a escolha de Isabel dos Santos por parte do Presidente da República (José Eduardo dos Santos), levou em conta a impoluta opinião do Titular do Poder Executivo (José Eduardo dos Santos) e do Presidente do MPLA (José Eduardo dos Santos).

Recorde-se que um grupo de 12 advogados angolanos, ingenuamente convencidos de que o país é uma democracia e um Estado de Direito, avançou a 10 de Junho de 2016, oito dias após a nomeação feita por José Eduardo dos Santos, com uma providência cautelar para travar a decisão, alegando violação da lei da Probidade Pública, por se tratar de uma decisão tomada pelo chefe de Estado a favor da filha. Os causídicos não levaram em contra, o que é grave, que Isabel era a única pessoa em Angola com habilitações e capacidade para desempenhar o cargo…

O objectivo era impedir que Isabel dos Santos tomasse decisões sobre a empresa, mas a última decisão judicial pendente, do Tribunal Constitucional, poderá surgir já depois das eleições gerais de Agosto, às quais não concorre José Eduardo dos Santos, no poder desde 1979. Há, portanto, uma remota e muito débil possibilidade de o Tribunal assumir, de facto e de jure, as suas funções.

“Do ponto de vista prático, pode já não ter muito interesse, se tivermos em conta que até à decisão talvez José Eduardo dos Santos já não seja Presidente, mas do ponto de vista doutrinário é muito importante, porque vamos ter jurisprudência sobre a matéria”, enfatizou hoje à Lusa o advogado David Mendes, porta-voz deste grupo.

A decisão sobre o processo chegou a 22 de Dezembro, com o Tribunal Supremo a indeferir a acção, considerando legal a nomeação de Isabel dos Santos para Presidente do Conselho de Administração da petrolífera do regime, no âmbito da reestruturação que supostamente visava enfrentar uma grave crise financeira decorrente na quebra das receitas com a exportação de petróleo.

O mesmo grupo de advogados recorreu seis dias depois para o Tribunal Constitucional, que meio ano depois ainda analisa (isto é como quem diz) o processo: “Recebi na quarta-feira a notificação do Tribunal Constitucional para apresentação das alegações, temos um prazo de 15 dias e estamos a trabalhar nisso”, apontou o advogado.

No recurso à decisão que agora está pendente desde Dezembro no Tribunal Constitucional, estes advogados alegam “violação de normas constitucionais” na apreciação do Supremo, nomeadamente o “princípio da igualdade”, segundo o qual “ninguém pode ser privilegiado pela sua ascendência ou descendência”.

Ninguém? Isso seria válido se Angola fosse o que não é e que (quase) todos esperamos venha um dia a ser: uma democracia e um Estado de Direito.

“Um dos grandes problemas que temos no nosso sistema é a falta de jurisprudência. E esse é um caso que poderá trazer jurisprudência na matéria, já que vamos ter um outro Presidente [após as eleições gerais de 23 de Agosto], mas já saberemos quais são as balizas que se impõem”, sublinhou David Mendes.

“Continuamos confiantes e mantemos a nossa posição, de que a Isabel dos Santos foi favorecida por ser filha do Presidente, violando o princípio da igualdade. Não nos foram dados parâmetros para dizer que ela concorreu em igualdade de circunstâncias com todos os cidadãos”, critica o advogado.

O advogado refere que neste recurso volta a ser invocado o princípio da “probidade pública nos actos administrativos” previsto na Constituição, alegando um benefício com a nomeação da filha do chefe de Estado, exercendo José Eduardo dos Santos funções públicas de governação.

“Se tivermos em conta a fundamentação do Tribunal Supremo, não foram capazes, no nosso entender, de declarar que não existe de facto improbidade. E é uma questão constitucional, também”, apontou.

O princípio da celeridade processual foi igualmente invocado neste recurso para o Constitucional, tendo em conta os mais de seis meses que o Tribunal Supremo levou para decidir a providência cautelar, inviabilizando qualquer efeito prático sobre o pedido de suspensão da nomeação de Isabel dos Santos.

Os advogados alegavam na acção principal que, “ao ter permitido que sua filha fosse nomeada”, o Presidente terá cometido “uma improbidade pública” e que “devia ter-se abstido, como manda a lei”.

Sobre o assunto, Isabel dos Santos chegou a pronunciou-se, manifestando crença na Justiça e na existência da legalidade em Angola, manifestando-se disponível para prestar “todo e qualquer esclarecimento” em tribunal sobre a sua nomeação.

Folha 8 com Lusa

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