(Des)iludido com a política mas sempre na (nossa) luta

Falando à TV Zimbo, Kamalata Numa assegurou que continua a ser da UNITA e que não vai, apesar de desiludido, abandonar a vida política activa. Nem sequer é candidato a deputado. Vai estar activo, como sempre, continuando – também como sempre – a pensar pela própria cabeça.

“N este momento com a saída do senhor Presidente da República, José Eduardo dos Santos, eu achei que todos os angolanos deviam ver nisso uma oportunidade e achei que devia encetar uma saga diferente daquela que está a ser feita pelos meus colegas”, afirmou Numa

O antigo número três da UNITA realçou que, embora decepcionado, vai continuar a fazer uma luta em favor dos angolanos.

“Por isso mesmo, achei que não devia atrapalhar e estar fora da Assembleia Nacional, com a qual também estou completamente decepcionado, e continuar a fazer uma luta que, permita, de facto, reencontrarmo-nos numa ambiente muito mais saudável do que este que vivemos. Por isso não aceitei ir na lista do meu partido”, explicou Kamalata Numa.

Kamalata Numa lembrou que deu o máximo de si, toda a vida em prol do seu partido, indicando, por isso, que não se pode dizer nem pensar que vai abandonar a vida política activa.

“Um homem como eu, que fez toda a sua vida, desde os anos 74, nessas lutas, e apesar de ter sido militar de carreira, fui político toda a vida, fui Comissário Político das FALA durante muitos anos, e, também, na altura de transição da UNITA, depois do desaparecimento do nosso querido fundador do Partido, doutor Jonas Malheiro Savimbi. Fui Secretário para os Assuntos Políticos, na Comissão de Gestão, logo a segunda pessoa a seguir ao Lukamba Paulo Gato, depois fui Secretário-geral da UNITA durante um mandato. Portanto não se pode dizer que eu vou abandonar a vida política activa, nem pensar nisso”, enfatizou Numa.

“Portanto, eu tenho sessenta e poucos anos, e o que tenho de fazer é continuar a esperar os momentos mais propícios para continuar. Mas, no entanto, não estou parado, estou aqui a ensaiar com muitas pessoas da sociedade civil, outros de outros partidos políticos, ideias para vermos que Angola é que nós queremos”, disse Numa.

Em Abril de 2010, então como secretário-geral da UNITA, Abílio Kamalata Numa, avisou Portugal que não se devia concentrar apenas nas relações com o MPLA e com o governo angolano (são, desde sempre, uma e a mesma coisa) relegando para segundo plano o relacionamento com a UNITA.

Tal como hoje, esta legítima posição da UNITA revelava, contudo, grande desconhecimento da metodologia seguida pelo governo socialista português de então e de sempre. Portugal, como é público, entende que Angola é o MPLA e o MPLA é Angola. Tudo o resto é paisagem. Quanto o MPLA passar de bestial a besta dirão o contrário.

“Os interesses de Portugal não acabam com o MPLA nem com o Governo de José Eduardo dos Santos”, disse Kamalata Numa à Agência Lusa no final de reuniões que nessa altura manteve em Bruxelas com responsáveis do governo belga e deputados do Parlamento Europeu.

Kamalata Numa tinha e continua a ter razão. Esquece-se, contudo, que o que está em questão não são os interesses de Portugal e muito menos os dos portugueses. Os interesses do então governo de José Sócrates, com a natural conivência do então presidente da República, Cavaco Silva, não tinha nem têm a ver nem com os portugueses nem com os angolanos.

A única relação que interessa a Lisboa (seja qual o for o primeiro-ministro e o presidente da República) é a que resulta de quem está no poder, de quem manda no país. Importa, ainda, não esquecer que uma importante e estratégica parte da economia de Portugal está nas mãos das empresas do regime (do MPLA) e de figuras do clã presidencial.

Referindo-se à visita a Angola do então Presidente da República Portuguesa, prevista para se realizar nesse ano, o secretário-geral da UNITA considerou que Aníbal Cavaco Silva é “um dos melhores estadistas portugueses e saberá interpretar melhor os interesses” do seu país.

Kamalata Numa enganou-se. Cavaco Silva, para além de considerar que Angola se estende de Cabinda ao Cunene, um pouco à semelhança de António de Oliveira Salazar para quem Portugal começava no Minho e acabava em Timor, estava interessado em não hostilizar quem podia a todo a momento lançar uma Oferta Publica de Aquisição sobre Portugal.

“Portugal deve manter uma relação com Angola de futuro e nós fazemos parte desse futuro, e [os portugueses] não deviam olhar com negligência para aquilo que a UNITA poderá representar nos próximos tempos”, declarou Kamalata Numa.

Kamalata Numa, talvez em função do que se passava em Angola, confundiu os portugueses com os que governam Portugal. E até mesmo esses, os portugueses, estavam e estão mais preocupados em arranjar quem os ajude, admitindo mesmo que qualquer ajuda será bem-vinda, mesmo que enviada pelo MPLA.

Abílio Kamalata Numa que foi general das ex-Forças Armadas de Libertação de Angola (FALA), antigo braço armado da UNITA, afirmou que nos encontros que manteve em Bruxelas (2010) deu conta das suas preocupações sobre a situação em Angola, nomeadamente no que diz respeito à falta de liberdade de imprensa, de liberdades sociais e a situação de pobreza extrema da maior parte da população do país.

Veja-se que, sete anos depois, as preocupações de Numa continuam válidas, talvez ainda mais válidas hoje do que há sete anos.

Ou seja, em 2010 Kamalata Numa limitou-se a dizer o que todo o mundo sabia. Sabia mas fazia de conta que não sabia. E fazia de conta porque, entre outras razões, a fábrica de dólares do regime compra os silêncios e até mesmo a dignidade de muitos.

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