As bocas de aluguer do regime têm papagueado mais uma grande novidade que assegura a independência do processo eleitoral que vai acontecer em 2017.
Por Rui Verde (*)
Trata-se da contratação da Sinfic, uma empresa tecnológica portuguesa que irá apoiar tecnicamente e fornecer equipamentos ao processo do registo eleitoral, contra o pagamento de 275 milhões de euros. Segundo os mesmos papagaios, a credibilidade está assegurada, por se tratar de uma empresa portuguesa. Quer isto dizer que, quando criticam o regime angolano, os portugueses estão a meter-se onde não são chamados, mas quando suportam as suas manigâncias já são um exemplo de credibilidade. Uma farsa.
A Sinfic não traz qualquer credibilidade ou garantia de independência ao processo eleitoral angolano. Primeiro, porque não é portuguesa, é basicamente angolana. Segundo, porque já é “velha conhecida” destes processos, desde pelo menos 2008, tendo sido acusada várias vezes de colaborar na adulteração de resultados a favor do MPLA. Por exemplo, em 2013 a UNITA apresentou uma participação-crime contra os administradores da empresa, por variados alegados crimes ocorridos durante o processo eleitoral. O processo foi arquivado. Contudo, o problema é que é de novo chamada uma empresa de que a oposição suspeita. Era mais transparente e claro buscar-se uma empresa de que ninguém suspeitasse e que contasse com a aprovação prévia da Comissão Nacional Eleitoral.
A Sinfic tem de facto sede em Portugal, mas a sua actividade ocorre maioritariamente em Angola. Neste momento, é uma pequena empresa. Em 2015 teve um volume de negócios de 1,6 milhões de euros. Nos anos anteriores, o volume foi mais elevado, na ordem dos 7/8 milhões. Contudo, mal se percebe que a uma empresa com este volume de negócios se atribua um contrato de 275 milhões.
E a questão é que 60 a 70 por cento do seu volume de negócios é feito com Angola. Angola cresceu, a empresa cresceu. Angola desacelera, é o descalabro da empresa. Neste momento, a Sinfic atravessa um PER –Processo Especial de Recuperação, uma espécie de mecanismo para sobreviver a uma situação de falência. A própria empresa reconhece, no seu Relatório e Contas de 2015, que “os indicadores financeiros degradaram-se significativamente” e “Face à perda (…) de recursos humanos provocada por esta situação e ao facto de, numa empresa com activos intelectuais, os recursos humanos serem imprescindíveis à manutenção do valor inerente aos produtos desenvolvidos, negociámos a possibilidade de, num contexto de criação de novas empresas, recorrendo naturalmente a outros investidores que não a Sinfic, os ex-colaboradores pudessem alavancar o desenvolvimento das soluções tecnológicas que caracterizavam a missão e a alma da Sinfic”.
Portanto, qual é a justificação para contratar uma empresa diminuída e com graves problemas?
Acresce que não se pode dizer que uma empresa que vive essencialmente dos negócios com o governo de Angola seja uma empresa portuguesa. Tem a sede em Portugal, mas a sua vida, a sua estrutura, a sua saúde é definida em Angola. Além do mais, não é claro quem é o seu corpo accionista. Em muita imprensa, surge a insinuação de que existem capitais angolanos na empresa, designadamente de generais importantes para o regime.
Certamente, não existe uma base convincente de racionalidade técnica e económica para esta contratação.
Outro momento que definiu aquilo que está por vir foi a votação no VII Congresso do MPLA. Anunciou-se que o Congresso tinha sido um exemplo de transparência eleitoral através da votação electrónica. Contudo, Aristides Safeca, secretário de Estado para as Telecomunicações e membro da Comissão Eleitoral, encarregou-se de desmentir essa transparência. Quando questionado sobre a lentidão do processo — quatro horas de consultas electrónicas — Safeca declarou que a demora se deveu à forma lenta como os intelectuais tinham votado.
Muitos participantes no Congresso questionaram se a barra de código, afinal, continha, o nome daqueles que votaram a favor ou contra o presidente. Aliás, anteriormente, alguns militantes (sobretudo mulheres do interior) terão manifestado relutância em votar, com receio de serem identificadas. Joana Lina teve de vir a terreiro tranquilizá-las.
Por tudo isto se vê que entre as Sinfics e a insegurança tecnológica há um longo caminho a percorrer, até se alcançarem eleições verdadeiramente livres e justas.
(*) Maka Angola
Título e imagem: Folha 8