O porta-voz da UNITA, Alcides Sakala, em declarações à Lusa, disse hoje que a manifestação agendada para sábado, 26, e entretanto proibida com base no artigo único da “Constituição” da ditadura do MPLA (“quero, posso e mando”) em Luanda, contra a nomeação – pelo pai – de Isabel dos Santos para dirigir a Sonangol, é um direito dos cidadãos consagrado na Constituição, por isso o seu partido encoraja e apoia os seus organizadores.
Mas então? Encoraja e apoia mas fica em casa. Pois. “Nós analisamos esta questão e a nossa posição é de encorajamento, porque é um direito que cabe aos angolanos, consagrado constitucionalmente. Mas a UNITA não só apoia como também encoraja a sua organização, mas não vamos participar”, disse Alcides Sakala.
Se não fosse irracional a explicação até daria para rir. É um pouco ao estilo dos arautos do regime, tipo Luvualu de Carvalho, João Pinto ou Estêvão Alberto.
Por sua vez o vice-presidente da CASA-CE, Manuel Fernandes, disse que foi reflectida a questão, sublinhando que é legítimo os seus promotores poderem realizá-la”.
“Só temos um senão da nossa participação, na medida em que não fomos tidos no momento da concepção e também por outro lado o processo em causa foi despoletado por um grupo de advogados, que entende que está haver oportunismo de uma das partes promotora dessa manifestação, porquanto são eles que tomaram a iniciativa e entendem que não tinha que ser um outro órgão a promover a manifestação”, explicou Manuel Fernandes.
“Havendo essa dicotomia, do ponto de vista de consenso, entendemos ponderar a participação como instituição, como organização, mas é claro que os dirigentes e militantes que acharem que devem participar por si vão fazê-lo, só para ver que um dos vice-presidente é um dos promotores da marcha, mas nós não entendemos fazer parte como instituição CASA-CE”, disse Manuel Fernandes.
Isabel dos Santos foi nomeada em Junho, no âmbito da reestruturação da maior empresa pública de Angola e em causa está o facto de a empresária ter sido nomeada Presidente do Conselho da Administração da Sonangol, pelo pai, Titular do Poder Executivo e chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, violando de facto e de jure a Lei da Probidade Pública.
Se a isso se juntar o facto de a empresária deter posições relevantes noutras empresas que negoceiam com a Sonangol, não restarão dúvidas quanto à legalidade da nomeação.
Para que não restem dúvidas
Como reacção a esta manifestação cívica, para além da satisfação que a UNITA e a CASA-CE deram ao regime, personalidades do MPLA e membros do Executivo, têm atacado a iniciativa do grupo de cidadãos que fundamenta a reclamação no art.º 73.º da CRA (Constituição da República de Angola), entendendo ser um dever patriótico lutar pela legalidade.
Os ataques (como agora a proibição) raiam a ameaça pública, desde logo por colocarem ao seu serviço órgãos de imprensa do Estado (que na sua génese deveriam ser públicos, portanto, de todos os angolanos contra os promotores da manifestação cívica do dia 26 que agiram respaldados na Constituição, art.º 47.º (Direito de reunião e de manifestação), ao ser-lhes negado o direito ao contraditório, pilar básico de qualquer Estado que se queira de Direito.
A campanha, unilateral e falaciosa, está baseada em argumentos barrocos do ponto de vista jurídico, pois assenta em sofismas, em defesa do acto administrativo praticado pelo agente público, Titular do Poder Executivo, José Eduardo dos Santos, relativo à nomeação da agente privada, sua filha, Isabel dos Santos, para o cargo de presidente do Conselho de Administração da empresa pública de petróleos, Sonangol.
Os cidadãos, todos, absolutamente todos (inclusive os promotores destas ameaças), precisam de respostas sérias, responsáveis e democráticas e não de retórica acéfala por, desde logo, ser tão-somente bajuladora. Até este momento, na sua qualidade de parte processual demandada, o titular do Poder Executivo, ainda não se dignou pronunciar-se junto do Tribunal Supremo de Angola, em sede da Providência Cautelar, para anulação do acto administrativo através do qual nomeou, inconstitucional e ilegalmente, a sua filha Isabel dos Santos para o cargo de Presidente do Conselho de Administração da Sonangol.
Os arautos da propaganda, sempre chamados à liça para tentarem anular os factos com uma enxurrada de parcos argumentos, precisam esclarecer as razões que levaram o agente público, Titular do Poder Executivo, a andar em sentido contrário à eficácia do Decreto Presidencial n.º 109/16, de 26 de Maio, que aprovou o Modelo de Reajustamento da Organização do Sector dos Petróleos e o respectivo calendário de implementação, bem como do Decreto Presidencial n.º 110/16, de 26 de Maio – que aprova a alteração dos artigos 13.º, 14.º, 15.º 16.º, 19.º e 22.º, bem como o aditamento do artigo 19.º O-A, ao Estatuto Orgânico da SONANGOL – E.P. aprovado pelo Decreto n.º 42/10, de 4 de Maio –, designadamente no seu art.º 14.º, “o Decreto Presidencial que nomear os membros do Conselho de Administração deve designar o Presidente do Conselho de Administração e o Presidente da Comissão Executiva”, em nenhum dos articulados e atalhos das leis atrás citadas, permite a nomeação de um agente privado, para cargo em empresa pública do Estado.
E a providência cautelar?
Esta é uma das questões de fundo, que continuam a carecer de respostas. E quando elas não chegam, nenhum dos poderes públicos de um Estado Democrático de Direito pode considerar-se imune a críticas e protestos pacíficos de cidadãos por causa de actos ou omissões que tenha praticado ou deixado de praticar.
Os juízes estão obrigados a respeitar os prazos processuais legalmente ditados. Nem os juízes, nem os advogados, nem os magistrados do Ministério Público devem, consciente ou inadvertidamente, desrespeitar ou apoiar o desrespeito pelos prazos legalmente estabelecidos.
A Providência Cautelar destina-se a remover o “periculum in mora” e a garantir o efeito útil da decisão judicial definitiva, visando assegurar os resultados práticos da acção, para serem evitados prejuízos graves, havendo fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito.
É contra a denegação de justiça no caso da Providência Cautelar que há muito deveria ter sido decidida, e contra as graves omissões da Procuradoria-Geral da República de Angola, que os promotores da manifestação cívica do dia 26 decidiram realizá-la por nada indicar que o Tribunal Supremo e a Procuradoria-Geral da República, ponham fim à violação da lei, uma prática reiterada destes órgãos do sistema judiciário angolano, quando em causa está o Titular do Poder Executivo ou alto dirigente do MPLA!
Tão anacrónico “modus operandi” poderá, eventualmente, ser entendível à luz da constatação de que o Presidente da República é quem os nomeia. Por sinal é a mesma pessoa há 37 anos. Há, manifestamente, falta de habituação às regras basilares da democracia.
Os angolanos têm a liberdade, note-se bem, têm o direito de liberdade, de se reunirem na Praça da Independência no dia 26 de Novembro das 15 às 20 horas para manifestarem o seu protesto contra práticas e omissões dos órgãos do sistema judiciário angolano em geral e, em particular, contra a denegação de justiça do Tribunal Supremo de Angola e a omissão da Procuradoria-Geral da República de Angola no que diz respeito ao acto administrativo de nomeação de Isabel dos Santos para o cargo de Presidente do Conselho de Administração da Sonangol, no quadro da Providência Cautelar interposta junto desse tribunal.
Há doutrina e jurisprudência abundante sobre o significado jurídico do princípio da igualdade. Pois, no caso, o Titular do Poder Executivo recorreu ao princípio de Orwell: “todos somos iguais, mas uns são mais iguais do que outros”, contrário ao princípio democrático básico e lapidar vertido, curiosamente, no art.º 23.º da CRA: “todos são iguais perante a Constituição e a Lei”.
Por tudo isso e, respeitando a hermenêutica jurídica, os promotores da manifestação cívica negam-se a fazer uma miscelânea entre a ideologia e a norma jurídica, esperando, desta forma, que os juízes do Tribunal Supremo decidam com base no que é condição “sine qua non”: lei e consciência jurídica. Mas nunca sob as orientações do senhor Presidente da República, como certa vez, talvez por deslize ou cansaço mental, se ou ouviu do Venerando Juiz Presidente do Tribunal Supremo, depois de ter tomado posse, afirmando alto e bom som, nos órgãos de comunicação social, que – corrobore-se – cumpriria escrupulosamente as orientações do senhor Presidente da República.
Curioso, pois esperava-se que fosse escrupuloso, na interpretação da Constituição e das leis.