Falta-nos um Mandela

As comemorações do dia da independência nacional, 11 de Novembro, continuarão privatizadas pelo MPLA, que se arvora ser o único representante dos angolanos, desde 1975.

Por William Tonet

O percurso desta gestão teve aspectos positivos, poucos, mas honra seja feita, muitos negativos, ao longo destes 41 anos, onde nem mesmo Agostinho Neto, apresentado como fundador da nação do MPLA, teve a latitude mental de, em função das especificidades dos vários povos, que habitam o território, elaborar um “projecto – país”, capaz de reunir as várias sensibilidades culturais, tradicionais e linguísticas que nos distinguem, colocando-as na constituição e na sociedade.

Infelizmente, privilegiou-se a discriminação, o tribalismo, o racismo, a visão ditatorial de regime, mesmo depois de 1991. A lógica da batota, na lei da batata é uma cultura política da qual o MPLA não se consegue descolar, pela ganância de perpetuação no poder. Essa obtusidade política é a grande responsável pelas contradições que se foram e vão avolumando, na sociedade face a política de exclusão, de idolatria a um só partido e líder político.

O país precisa urgentemente de um líder, um homem visionário, capaz de enxergar para além do seu umbigo, devolvendo aos autóctones a esperança de um país melhor, mais justo, democrático e de liberdades.

Um líder capaz de fazer cumprir a constituição e a lei, sem batotas, à estatura de Nelson Mandela.

Hoje, na celebração dos 41 anos de independência, uma grande maioria de cidadãos, não acredita em José Eduardo dos Santos, não só pelo facto de nunca ter sido nominalmente eleito, como e, também, por nunca, em 37 anos ininterruptos de poder, ter pernoitado duas noites, numa província, para falar com as suas gentes, sentir a força das suas lágrimas, enfrentar a realidade, fora dos relatórios floreados, que o enganam a perceber o cheiro do torrão da Angola profunda.

Houvesse verdadeiro e comprometido patriotismo, o líder do MPLA emprestaria, neste 11 de Novembro de 2016, face à conturbada situação político-económico e social, uma nova forma de estar na política, conciliando-se com os outros líderes dos partidos políticos, rubricando um “pacto de regime”.

Um “pacto de regime” capaz de esbater diferenças, encurtar desavenças, enterrar recalcamentos passados, inaugurando a “terapia da audição política”, onde o contrário reconhece estar a ser respeitado e ouvido, pelo outro, como igual…

O “pacto de regime” não pode ser encarado, como uma plataforma de distribuição de benesses financeiras ou lugares, no aparelho governativo, mas como bolsa de discussão, sobre a geografia das grandes fissuras, tatuadas no corpo das gentes e das terras, carentes de água e esperança, para voltarem a florir.

Os angolanos de todas as latitudes têm de poder acreditar, numa certa ética, por parte da tribo governante, valorativa da força do voto e da sua eficácia, sempre que se elevar o sentimento de alternância pacífica de poder. O contrário, descrença, nas instituições, fará emergir os graves e latentes problemas com que se debatem as populações e regiões da Angola profunda.

Aos 41 anos de independência, milhões de cidadãos angolanos sentem-se excluídos, discriminados, pobres institucionais e sem esperança no futuro. É como se institucionalizasse o retrocesso, quando a roda já foi inventada, mas, ainda assim, o regime teima em não superar o passado, pelo contrário vai fazendo pior.

Hoje, para nossa desgraça colectiva a independência tornou-se um lugar-comum, uma data banal, sem relevância na vida da maioria dos autóctones, face à privatização a que foi votada pelo MPLA, que se considera o único movimento libertador, com heróis, enquanto os demais movimentos são tratados de “fantoches”, quando desavergonhadamente, não conseguiu, sequer manter os colonatos de café, no Piri, Dembos, que dista pouco mais de 150 Km, do centro do poder político: Luanda.

A corrupção, o enriquecimento ilícito, a partidarização dos órgãos públicos, das Forças Armadas, da Polícia Nacional, da Segurança de Estado, constituem a grande “ravina” deste regime, que poderá ser engolido ou pela implosão interna, no seio do MPLA, seria o fenómeno, ainda assim, mais positivo, ou pela explosão social, imprevisível, quando carente de uma liderança pragmática.

Ora, sem interlocutor válido, os pilares do regime serão mais facilmente abalados, com fortes probabilidades de divisões nas forças castrenses, e nem mesmo a UGP (Unidade da Guarda Presidencial), conseguirá travar os ventos da história, 41 anos depois de ter sido mal parida a independência nacional.

Os cidadãos, face à caótica situação que o país atravessa, 41 anos depois da proclamação da independência, com níveis de pobreza extrema, desemprego, mortalidade infantil, em alta, precisam de maior ousadia, da parte dos principais actores políticos, para fazerem algo diferente, ousado, novo irreverente, que os distingam da prática daqueles que estão no poder e sejam capazes de aliciar os cidadãos, carentes de um verdadeiro líder, capaz de devolver a esperança na democracia.

Um sinal de maturidade e abertura de José Eduardo dos Santos e do MPLA seria o de ultrapassar os caprichos umbilicais, neste aniversário, convidando, por exemplo, para presidir o acto central das comemorações da independência, Ngola Kabangu, um dos subscritores dos Acordos de Alvor, em homenagem a Holden Roberto, o proponente da data de 11 de Novembro.

Finalmente, não acredito na elevação e humildade do poder, numa altura que os sinais mais evidentes, são da contínua aposta na fraude eleitoral, como garantia para a manutenção do poder.

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