Ditadura preside ao Conselho de Segurança da ONU

Angola assume, a partir de hoje (1 de Março), a Presidência rotativa do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nada mal para um regime cujo Presidente, nunca nominalmente eleito, está no poder desde 1979.

Por Orlando Castro

Façamos uma reflexão. Viver em paz é algo que não agrada ao MPLA. Com o fim da guerra, em 2002, acabou o sagrado bode expiatório que o regime tinha para fazer o que quisesse sem dar explicações e, também, sem estar sujeito ao escrutínio dos angolanos. E isso foi um enorme, enormíssimo, transtorno para as negociatas dos homens e mulheres do Presidente. E também para o próprio Presidente.

Por alguma razão, 14 anos depois da paz, Angola gasta mais na defesa do que a África do Sul e Nigéria em conjunto. Ou será por isso que o país pertence ao Conselho de Segurança da ONU?

Entalada na garganta funda do regime está o facto de o seu adversário militar de décadas, a UNITA, não querer voltar aos tiros, mesmo quando o MPLA, este MPLA, inventa situações de guerra. Dava muito jeito que os homens do Galo Negro se fartassem da vilanagem e resolvessem dizer, como defendia Jonas Savimbi, que mais vale morrer do que ser escravo.
“Para a UNITA, a guerra nunca mais. É isso que nós queremos garantir aos angolanos, porquanto devem sentir-se à vontade, fazendo os seus planos de vida”, sustenta o Galo Negro, destacando os ganhos da paz em todo o país.

Ou seja, a UNITA faz politicamente o jogo do regime de modo a que a este faltem argumentos para, 14 anos depois do calar das armas, ressuscitar o fantasma da guerra. A estratégia está, contudo, a irritar o MPLA que quer escapar da teia de corrupção e má governação e, para isso, só conhece uma estratégia: culpar a Oposição e acenar ao mundo com o terrorismo e o contíguo regresso à guerra.

Ciente da cilada que todos os dias lhe é montada, a Oposição política defende, serena e quase servilmente, a tese de que é necessário implementar mais acções tendentes a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, rumo ao desenvolvimento integral do país.

“Apesar de se ter feito muito, nos últimos 13 anos, pensamos que o Executivo deve fazer um bocadinho mais, para dar a estabilidade e segurança às populações, mormente no que toca ao emprego, alimentação e habitação”, diz a UNITA num elogio sarcástico que irrita solenemente o regime.

De uma forma geral, a Oposição sabe que o regime não pode ser derrotado pela crítica. Vai daí, tenta assassina-lo pelo elogio.

Bem vistas as coisas, o MPLA, ou seja, o regime, continua a provocar deliberada e conscientemente a UNITA, o único partido que conseguiu responder à razão da força do regime com a mesma moeda. Para o MPLA vale tudo. Até mesmo dizer que no país existem apenas angolanos de primeira, os do MPLA, e os outros, uma subespécie que teima em resistir.

Agressões, prisões, violações e assassinatos fazem parte de uma estratégia que visa dar ao governo razões para calar e amedrontar toda a sociedade angolana.

O regime aproveita o facto de ser membro do Conselho de Segurança da ONU para, de forma impune e não sujeita a escrutínio, aniquilar todos os que possam pôr em causa a efectiva política de partido único, de ditadura, que está no seu ADN.

Como é que altera este estado de coisas? Excluindo a remota e ténue possibilidade de o regime ser alterado por dentro, como à boca-pequena advogam alguns prestigiados militantes do MPLA, só mesmo um levantamento popular, necessariamente violento no seu enquadramento político, pode levar à alteração do regime, se bem que a conjuntura internacional não seja favorável a essa reacção.

E não é favorável porque, assim se diz nos bastidores dos principais areópagos políticos internacionais, José Eduardo dos Santos continua a ter o estatuto de ditador bom. E enquanto assim for…

De facto, nada melhor do que o fantasma guerra interna e do terrorismo regional para o MPLA fazer, com a cobertura implícita da comunidade internacional, todas as purgas que ache convenientes e cortar pela raiz todas as veleidades dos que que querem que Angola seja um verdadeiro Estado de Direito Democrático.

A oposição, seja ela política ou social, está no meio de um complicado fogo cruzado. Mesmo nada fazendo é sempre culpada de tudo fazer.

Os angolanos estão assim, como era esperado, entre a espada e a… espada. Se nada fizerem continuarão a ser enxovalhados, se reagirem vão ser acusada de estar a fomentar a rebelião, de acções terroristas, ou até mesmo de estarem a preparar uma nova guerra.

Quando o ministro Georges Chikoti afirma nos areópagos internacionais que, em África, por exemplo, nos últimos anos está-se a viver situações de conflito em certas regiões que começaram a pôr em causa a própria noção clássica do Estado, quando se olha aos casos da Líbia, do Egipto, Mali, Nigéria e Somália, está a defender a necessidade de a comunidade internacional olhar para Angola como um porto seguro, um paradigma de estabilidade.

Georges Chikoti afirma que Angola considera a paz e a segurança premissas fundamentais para que qualquer nação possa realizar plenamente o seu potencial, em termos de desenvolvimento, democracia e promoção dos direitos humanos, acrescentando que a política externa angolana defende relações de boa vizinhança, baseadas em princípios de respeito da soberania, da igualdade, da integridade territorial dos Estados dentro de uma cooperação reciprocamente vantajosos.

O ministro salienta por regras os objectivos do Programa Nacional de Desenvolvimento para 2013-2017, o estabelecimento e aprofundamento da cooperação com os demais países, tendo como prioridade os países limítrofes e as regiões Central e Austral de África, mostrando assim a imprescindibilidade de a comunidade internacional contar com Angola.

Dessa forma, o regime trabalhou para a inserção de Angola em organizações e instituições internacionais. Ao contrário do que diz o ministro Georges Chikoti, esses objectivos não se coadunam com os interesses do Povo angolano, mas servem na perfeição para tapar os olhos aos observadores internacionais”.

A tese do regime, genericamente e do ponto de vista formal correcta, corresponde às regras há muito defendidas, para proveito próprio, pelo Presidente José Eduardo dos Santos que, mau grado o tempo que está no poder e o facto de nunca ter sido nominalmente eleito, entende ter legitimidade para – como fez no dia 1 de Junho de 2012 – dizer ao mundo que “não pode ser tolerado o ressurgimento dos golpes de estado em África”.

Se pelo voto (quando o há) tudo continua na mesma porque a máquina do poder tritura a oposição e adultera as votações a seu belo prazer, se o povo continua sem comida, casa, saúde, escola, liberdade etc. que forma terá para mudar as coisas?

Nenhuma. Desde logo porque nesta altura existem ditadores bons e maus, sendo que só os maus devem ser derrubados.

De acordo com o Presidente da República, “África necessita de exemplos concretos que confirmem que o Continente pretende virar firmemente uma página do passado de uma história em comum, marcada pela existência de governos autoritários ou autocráticos, para dar lugar a sociedades e instituições democráticas”. Até parece gozo. Eduardo dos Santos gosta mesmo de gozar com a nossa chipala e de nos passar sucessivos atestados de matumbez.

É caricato ver Eduardo dos Santos criticar os governos autoritários ou autocráticos, dizendo defender sociedades e instituições democráticas, ao mesmo tempo que gasta milhões na lavagem da sua imagem e no propalado combate à corrupção e ao tráfico de influências, na suposta defesa da liberdade de Imprensa e de expressão e do bom funcionamento do sistema de justiça, como condição essencial para o aprofundamento da democracia.

Quanto à liberdade, seja ela qual for, estamos falados mas continuaremos a falar enquanto não nos mandarem para a cadeia alimentar dos jacarés. Hilbert Ganga, Ricardo de Mello, Mfulupinga, João Ngalangombe, Kamulinde e Cassule são alguns dos exemplos de que, afinal, a tese e a prática do regime continua a ser a mesma.

Ouvir o chefe de Estado dizer que “não são promessas demagógicas porque são fundamentadas por um estudo elaborado por técnicos competentes sobre a realidade nacional, que teve em conta as necessidades do povo e os recursos da nação”, quase nos leva a acreditar que as mangueiras dão loengos.

Como se não bastasse obrigar o Povo a pensar com a barriga… vazia, Eduardo dos Santos teima em demonstrar que os angolanos são matumbos e que, a troco de um saco de fuba ou do fantasma da guerra, irá mantê-los amordaçados e escravizados para sempre.

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