A campanha de reeleição, em 2006, do ex-Presidente Luiz Inácio da Silva, velho, querido e incondicional apoiante do MPLA, teria recebido a quantia de 50 milhões de reais (11,2 milhões de euros) da petrolífera estatal angolana Sonangol, segundo o jornal brasileiro Valor Económico.
A negociação foi denunciada pelo ex-director Internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, antes de ele próprio aceitar um acordo de delação premiada com a Procuradoria Geral da República (PGR), responsável pela investigação dos casos de corrupção envolvendo a petrolífera estatal brasileira Petrobras.
A propina teria sido paga após a conclusão de uma negociação sobre a compra de 300 milhões de dólares em blocos de petróleo em África, no ano de 2005.
Segundo o jornal brasileiro, Nestor Cerveró disse aos investigadores que soube do pagamento por intermédio de Manuel Domingos Vicente, que na época presidia ao Conselho de Administração da Sonangol, e que hoje é vice-Presidente de Angola.
“Manuel Vicente foi explícito em afirmar que desses 300 milhões de dólares pagos pela Petrobras à Sonangol […] retornaram ao Brasil como propina para financiamento da campanha presidencial do PT valores entre 40 e 50 milhões de reais”, escreve o jornal Valor Económico, citando parte das declarações de Nestor Cerveró.
O ex-funcionário da Petrobras alegou que a negociação da propina foi conduzida por membros dos governos brasileiro e angolano, sendo o representante brasileiro o ex-ministro da Fazenda, António Palocci.
Questionado sobre o assunto, António Palocci negou ter qualquer envolvimento no caso.
O jornal brasileiro pediu uma reacção à Sonangol, ao governo de Angola e ao vice-presidente Manuel Vicente, mas não conseguiu estabelecer qualquer contacto.
Corrupção é meio caminho andado
Recorde-se que o ex-director de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, citou no final de 2014 durante os depoimentos à Polícia Federal o nome de 28 políticos, incluindo um ministro, senadores e deputados, que estariam envolvidos no esquema de corrupção da petrolífera brasileira.
De acordo com o diário Estado de São Paulo, que teve acesso à lista, entre os envolvidos estariam António Palocci, ex-ministro dos governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, a ex-ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, o ministro de Minas e Energia, Edson Lobão, e o presidente do Senado, Renan Calheiros.
O ex-director é um dos acusados no esquema e tem colaborado com a justiça através do programa de colaboração firmado com o Ministério Público brasileiro.
O esquema foi desmantelado em Março de 2014 durante uma operação da Polícia Federal que investigava uma máfia de envio ilegal de dinheiro para o exterior.
Ao chegar ao principal executor desses envios, o cambista não legalizado Alberto Yousseff, a polícia brasileira identificou uma lista com o nome de todos os seus principais “clientes”, que incluía desde políticos até altos executivos de grandes empresas, colocando a Petrobras no centro das investigações.
Entre os políticos citados por Paulo Roberto Costa apareceram ainda o candidato à Presidência da República pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), Eduardo Campos, morto em Agosto de 2014 num acidente de avião.
Segundo o depoimento do ex-director, ele próprio teria intermediado um repasse de 20 milhões de reais (6,26 milhões de euros) para o ‘caixa 2′ (saco azul) da campanha para a reeleição de Paulo Roberto Campos, então governador do estado do Pernambuco.
Ainda de acordo com a mesma publicação, o executivo contou que os políticos envolvidos recebiam frequentemente repasses de dinheiro, especialmente destinados a campanhas eleitorais.
Outros nomes citados na reportagem são: Henrique Alves, presidente da Câmara dos Deputados, Roseana Sarney, ex-governadora do Maranhão, Sérgio Cabral, ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Guerra, ex-presidente nacional do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), além de outros parlamentares. Os políticos negam qualquer envolvimento no caso.
Odebrecht, Lula, Dilma e (é claro!) Eduardo dos Santos
Um conjunto de e-mails apreendidos pela Polícia Federal brasileira mostram a influência de Marcelo Odebrecht e os negócios que conseguiu. Instituto Lula diz que foram acções de “patriotismo” a favor da economia brasileira.
E-mails apreendidos pela Polícia Federal brasileira na investigação à teia de corrupção em volta da Petrobras mostram as pressões da empresa Odebrecht junto da presidência, quando esta era ocupada por Lula da Silva e depois por Dilma Rousseff, no sentido de esta empresa obter vantagens em contratos e ver colocados em cargos determinadas pessoas. Segundo os jornais O Globo e o Estado de São Paulo, que publicaram o conteúdos dos e-mails, essa pressão teve efeito.
Nas mensagens, o presidente da maior empresa de construção do Brasil, Marcelo Odebrecht – que se encontra detido –, tenta influenciar directamente o que será dito pelos presidentes a chefes de Estado de outros países. Numa mensagem de 2009 para executivos da construtora, o então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, escreveu que Lula fez lobby pela empresa num dos encontros com líderes estrangeiros.
Em concreto, a Odebrecht quis evitar a escolha de um secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, que é considerado prejudicial à empresa. “Os documentos mostram, pela primeira vez, que o chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, era um dos elos entre a empreiteira e o Presidente [Lula da Silva], de acordo com a interpretação da Polícia Federal”, escreve o Globo. No Governo Rousseff é Giles Azevedo, chefe de gabinete da Presidente, e Anderson Dorneles, assistente pessoal de Dilma, quem passaram a receber as mensagens de Marcelo Odebrecht.
As mensagens de Marcelo para Lula eram enviadas por meio de Alexandrino Alencar (também preso), director da empresa e mais próximo do então Presidente. Algumas mensagens tinham como título “Ajuda de memória”, outras “Agenda Lula”.
Os documentos obtidos pela polícia mostram que dias antes do encontro, a 5 de Junho de 2012, entre Dilma Rousseff e o Presidente da República Dominicana, Danilo Medina, Marcelo Odebrecht enviou a Giles Azevedo e Anderson Dorneles uma nota com sugestões para a agenda da reunião.
O jornal brasileiro cita o e-mail que diz ser “importante” a Presidente brasileira “reforçar” dois pontos na conversa: “a confiança que tem na Organização Odebrecht em cumprir os compromissos assumidos” e “a disposição de, através do BNDES [Banco Nacional para o Desenvolvimento Económico e Social], continuar a apoiar as exportações de bens e serviços do Brasil, dando continuidade aos projectos de infra-estrutura prioritários para o país”.
Numa entrevista que concedeu a jornalistas brasileiros após o encontro, o Presidente da República Dominicana diz ter recebido luz verde do Governo brasileiro para obter financiamento para a construção de duas fábricas no país — o projecto foi feito com financiamento parcial do BNDES; entre os anos de 2003 e 2015 empresas brasileiras conseguiram contratos na República Dominicana, com dois mil milhões de dólares (1,78 mil milhões de euros) a serem “desembolsados a favor da Odebrecht”.
Em 2005, na véspera de uma visita de José Eduardo dos Santos, Marcelo Odebrecht pediu a Lula da Silva que reconhecesse o papel do Presidente de Angola como “pacificador e líder regional”, e fizesse referência às acções realizadas por empresas brasileiras em Angola, com destaque para a Odebrecht. “Dr. Alex, aqui está o documento. O dr. Marcelo pede-lhe a gentileza de encaminhar ao seminarista”, escreveu Darci Luz, secretária de Marcelo, a Alexandrino Alencar. “Seminarista” surge sempre como nome de código para o intermediário das mensagens, que neste caso seria o chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho.
No dia seguinte, o Presidente brasileiro disse publicamente que Eduardo dos Santos “soube liderar Angola na conquista da paz” e elogiou a sua “perseverança e visão de futuro” – também mencionou o projecto da central hidroeléctrica de Capanda, referido no e-mail de Marcelo Odebrecht como um exemplo da cooperação entre os dois países.
Em 2007, Lula da Silva visitou Angola e, depois da análise dos e-mails, a Polícia Federal, citada pelo jornal Estado de São Paulo, conclui: “Aparentemente, os executivos da Odebecht mantêm contactos com autoridades da embaixada a fim de colocar na agenda, no encontro, assuntos de interesse da construtora”.
Há também e-mails que mostram Marcelo Odebrecht a participar activamente nas discussões sobre contratos da Petrobras.
A Lava Jato é uma investigação a uma gigantesca rede de corrupção que envolve a empresa estatal petrolífera, Petrobras, e o pagamento de subornos por parte de empresas para a obtenção de contratos. Envolve políticos do Partido dos Trabalhadores (no poder), mas também de outros. A investigação já levou à prisão de dezenas de responsáveis políticos – entre eles o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari – , de administradores de empresas e de empresários: além de Odebrecht (entretanto envolvida também num caso de corrupção em torno da construção dos estádios do Mundial 2014 e condenada no Brasil por uso de trabalho escravo em Angola) está também detido o dono da construtora Andrade Gutierrez.
Folha 8 com Lusa e jornal Público (Ana Gomes Ferreira)
Seria pedir demais, se em Angola fosse levada de forma rigorosa e imparcial, uma investigação deste género?
Nesta altura, com um Presidente da República que nunca foi nominalmente eleito e está no poder há 36 anos, só são permitidas investigações para dizer que José Eduardo dos Santos é… “Deus”.