Representantes de cerca de 600 empresas chinesas são esperados a partir de segunda-feira, em Luanda, para o fórum de investimento Angola/China, que pretende reforçar a cooperação económica entre os dois países, identificando novas oportunidades de negócio.
Fonte da organização deste fórum, a cargo da Unidade Técnica para o Investimento Privado (UTIP) da Casa Civil do Presidente da República de Angola, informou que áreas como agricultura, pescas, energia e águas, construção e minas estão na agenda das potencialidades angolanas a apresentar aos empresários chineses.
O fórum vai decorrer durante dois dias e prevê, na terça-feira, a assinatura de acordos de intenção para propostas de investimento chinês em Angola, indicou a organização.
O Governo angolano encarregou o ministro e Chefe da Casa Civil do Presidente da República, Manuel da Cruz Neto, de liderar uma comissão, com mais oito ministros, para preparar este fórum.
O evento está a ser colocado em plano de destaque nas relações entre os dois países e obrigou igualmente a um reforço de segurança pelas autoridades angolanas, tendo em conta o elevado número de empresários chineses presentes em Luanda.
Actualmente, a China compra praticamente metade do petróleo produzido em Angola, liderando os destinos das exportações angolanas, e tem vindo a consolidar a posição como principal fornecedor do país, ultrapassando desde 2015 as empresas portuguesas.
Além disso, é também o maior financiador do país, com linhas de crédito para obras em Angola, realizadas por empresas chinesas. A última destas linhas foi concedida em 2015, no valor de 5,2 mil milhões de dólares.
O Governo destaca que a China “constitui um parceiro importante” de Angola e que “as excelentes relações entre os dois Estados têm reforçado cada vez mais o âmbito da cooperação, particularmente no domínio económico”.
O fórum de Investimento Angola-China visa “reforçar o desenvolvimento de sinergias para realização de parcerias empresariais e investimentos entre empresários dos dois estados”, refere o Governo angolano.
Camaradas chineses, o MPLA está convosco
Angola (mais propriamente o regime) foi o país africano que mais beneficiou de empréstimos concedidos pela China, ultrapassando os 12 mil milhões de dólares, desde 2000, segundo a unidade de investigação sedeada nos EUA, ChinaAid.
O principal receptor das linhas de crédito abertas por Pequim foi o sector transporte e armazenagem, que absorveu 20% do montante global, detalha aquela pesquisa. Logo a seguir, surge a produção e abastecimento de energia, que recebeu 18% do crédito chinês.
Governo e sociedade civil, comunicações e abastecimento de água e saneamento, que, no conjunto, acederam a 667 milhões de dólares, surgem no fim da lista.
Depois de a guerra civil em Angola ter acabado, em 2002, a China tornou-se um dos principais actores da reconstrução do país, nomeadamente das suas estradas, caminhos-de-ferro e outras infra-estruturas.
Em troca, o país asiático “obteve condições favoráveis para a exploração de minérios”, lê-se na pesquisa conduzida pela jornalista de investigação espanhola Eva Constantaras.
A China é hoje o maior importador do petróleo angolano, mas, devido à queda do preço daquela matéria-prima, o valor das exportações angolanas para o mercado chinês diminuiu cerca de 50%, em 2015, para 15,98 mil milhões de dólares.
Entre as nações africanas mais beneficiadas pelos empréstimos chineses surgem ainda o Sudão, Gana e Etiópia.
“A maioria dos principais receptores são países ricos em recursos naturais – incluindo petróleo, diamantes e ouro – e muita da ajuda chinesa serve para tornar essa riqueza acessível para exportar”, aponta o estudo.
País mais populoso do mundo, com cerca de 1.375 milhões de habitantes, a China registou nas últimas três décadas um ritmo médio de crescimento económico de 10% ao ano, transformando-se no maior consumidor de quase todo o tipo de matérias-primas.
Desde 2009, o “gigante” asiático tornou-se o principal parceiro comercial do continente africano.
A China Aid revela ainda que muito do dinheiro chinês é investido nas cidades de origem dos chefes de Estado dos respectivos países, ou em regiões habitadas pelo grupo étnico do líder político.
Ainda assim, rejeita que Pequim tenha uma estratégia focada em tirar partido do clientelismo político no continente, atribuindo aquela tendência à competição por influência entre diferentes agentes do Governo chinês.
E o rei até gosta e incentiva
Em Maio deste ano, o Governo de sua majestade o rei José Eduardo dos Santos autorizou o Banco da China a abrir uma sucursal em Angola, para desenvolver actividades financeiras e bancárias.
A autorização consta de um decreto assinado por José Eduardo dos Santos, de 13 Maio, que adianta que a instituição detida pelo Estado chinês vai operar no país com a designação Banco da China – sucursal em Angola.
A decisão sobre a abertura da sucursal angolana do Banco da China surge numa altura de fortes constrangimentos no país devido à crise da cotação do petróleo, nomeadamente no acesso a divisas, colocando em causa transferências para o estrangeiro ou a importação de matéria-prima.
O governador do Banco Nacional de Angola (BNA), Walter Filipe, reconheceu que a banca do país está a ser colocada “à margem” do sistema financeiro mundial, numa aparente alusão à falta de acesso dos bancos angolanos ao circuito internacional de divisas, por dúvidas dos reguladores internacionais sobre credibilidade das instituições angolanas.
Para Walter Filipe, é necessário colocar “ética e moral” na banca angolana, devendo esta ser colocada ao “serviço do bem comum”.
“Devemos fazê-lo implementando em Angola as normas prudenciais e as boas práticas nacionais e internacionais, e todas as normas de combate ao branqueamento de capitais e de financiamento ao terrorismo, porque estamos a ficar numa situação em que está a ser colocado o sistema financeiro angolano à margem do sistema financeiro mundial. E isto é grave para a prosperidade das nossas famílias”, apontou.
Criada em 1912, o Banco da China funcionou até 1949 como banco central chinês. Após várias transformações, ainda nas mãos do Estado mas já como banco comercial, tem vindo a concentrar atenções no apoio às empresas e comunidades chinesas fora do país, com destaque para as economias emergentes.
No dia 12 de Outubro de 2015 foi noticiado que os bancos centrais de Angola e da China estavam a acertar os pormenores de um acordo que para permitir o uso das moedas nacionais de ambos os países, nas trocas comerciais bilaterais.
O acordo, cujo anúncio da sua negociação foi feito em Agosto de 2015, pela então ministra do Comércio de Angola, Rosa Pacavira, irá permitir que os agentes económicos de ambos os países possam usar a moeda chinesa em Angola e a angolana na China, facilitando as trocas comerciais.
O objectivo passa por garantir que as transacções entre a China e Angola se faça sem recurso a uma terceira moeda.
A ministra Rosa Pacavira anunciou na altura que o kwanza angolano ia valer na China e o renminbi (moeda chinesa ou yuan) em Angola.
Recorde-se que a Economist Intelligence Unit (EIU) considera que o aprofundamento das relações económicas entre Angola e China é mutuamente positiva, mas é dificultada pelos altos custos de fazer negócios no reino de sua majestade o rei de Angola e pelo abrandamento chinês.
“Ambos os países gostam de falar muito da sua relação mutuamente vantajosa, e ambos certamente têm algo a ganhar se avançarem para além do tradicional modelo de crédito estatal, mas estas boas intenções devem primeiro superar as dificuldades e os altos custos de fazer negócios em Angola, e podem ser abrandadas pelo próprio abrandamento económico da China”, escreve a EIU.
Para a unidade de análise económica da revista britânica The Economist, Angola está a tentar diversificar as suas fontes de financiamento: depois de ter apostado num conjunto de empréstimos bilaterais por parte de bancos comerciais ocidentais, Luanda emitiu 1,5 mil milhões de dólares em títulos de dívida soberana no final do ano passado, já depois da visita do Presidente de Angola à China, na qual terá garantido um financiamento de 6 mil milhões de dólares de crédito chinês.
“Angola está a aprofundar a sua relação económica com a China, esperando ir além do tradicional modelo estatal de linhas de crédito pagas em petróleo, para uma abordagem mais diversificada e liderada pelo sector privado”, escrevem os analistas da EIU numa nota enviada aos investidores.
“O investimento privado estrangeiro é urgentemente necessário em Angola, a lutar contra os preços baixos do petróleo, a sua maior exportação e fonte de receitas”, escreve a EIU, acrescentando que “as empresas chinesas têm a capacidade de fornecer dinheiro e ‘know-how’ para ajudar o país a desenvolver sectores não petrolíferos, como a agricultura e a manufacturação, e criar os tão necessários empregos”.
As diferenças culturais, no entanto, “precisam de ser geridas para evitar que os novos atores e a concorrência aumentem as tensões sociais”, acrescentam os analistas.
Apesar de o sistema de pagar em petróleo os empréstimos chineses que são usados na reconstrução do país ter resultado bem para Angola, o modelo está a tornar-se mais difícil para o país.
“Com os preços do petróleo fortemente pressionados, o volume de crude que Angola tem de enviar para a China para cumprir as obrigações financeiras cresceu consideravelmente”, escreve a EIU, concluindo que “isto significa que Angola tem menos crude para vender noutros locais, aumentando as dificuldades de receita do Governo e provocando críticas renovadas da oposição sobre os contornos das linhas de crédito chinesas”.
Folha 8 com Lusa