Os chineses, nós e os gregos

A humanidade deve à Grécia antiga o sistema político a que chamamos Democracia, (do grego demokratia). Hoje, os mesmos gregos podem ainda oferecer-nos outro exemplo digno de registo.

Por Lukamba Gato

A luta do actual primeiro-ministro daquele país contra as políticas de austeridade impostas pelos seus credores europeus e não só, evidencia o respeito aos seus concidadãos e as promessas feitas durante a campanha para as eleições que o tornaram chefe de governo grego.

Alexis Tsipras está com a corda ao pescoço, porém sabe que não pode hipotecar a vida dos seus compatriotas, assim como a da futura geração. A isso chama-se patriotismo. Embora eu considere que Tsipras tenha pouco espaço de manobra para fugir à imposição dos seus credores europeus e do Fundo Monetário Internacional, porém, fica registada a sua luta titânica com vista a manter-se no quadro das suas promessas eleitorais e a sua própria dignidade.

Aliás, face às dificuldades nas negociações com os credores, Tsipras consultou directamente o povo grego através de um referendum para saber da vontade dos cidadãos em aceitar ou não o fardo que há-de vir como contrapartida do empréstimo que irá buscar dos credores europeus e de outros.

Como se pode caracterizar essa atitude? Simplesmente: Respeito! Respeito pelo povo soberano e pelo país.

Fomos buscar esse exemplo para exercitarmos e compreender o que se passa actualmente com o assunto que tem marcado a nossa agenda política nacional nas últimas semanas: o famoso ‘’empréstimo chinês’’.

A sociedade angolana está mergulhada na inquietação porque não sabe ao certo qual é a contrapartida que o executivo angolano vai oferecer aos chineses para pagar esse empréstimo. Na ausência de uma informação em tempo útil e transparente, os cidadãos tentam adivinhar por todos os caminhos as contrapartidas ou o sacrifício a que será submetido para pagar o dinheiro que Angola foi buscar desta vez à China.

O Executivo está remetido ao silêncio absoluto. Porque razão o Governo quer guardar os termos do contratos se não prejudicam o futuro do país? Há alguma coisa a temer?

Seja qual for a contrapartida, o Executivo é legal e moralmente obrigado a informar aos cidadãos. Em democracia, o exercício da prestação de contas é regra sagrada. Os governantes, a todos os níveis, têm de prestar informação aos cidadãos sobre o que fazem ou deixam de fazer. Desde o administrador ao chefe do Governo. Em democracia, quem exerce o poder, recebe um mandato, ao qual deve prestar contas.

Esse empréstimo do governo chinês engaja todo o povo, de Cabinda ao Cunene. Por essa razão, o Executivo está obrigado a esclarecer os termos do acordo, sem tabus, por se tratar de uma dívida pública. Primeiro para evitar que o credor seja encarado pelos cidadãos como inimigo ou usurpador dos interesses nacionais. Segundo para que os cidadãos possam avaliar a utilidade desse empréstimo. É o mínimo que o Executivo tem de fazer.

Se se trata de uma operação transparente, por quê razão não se explica aos cidadãos os meandros do negócios? Que receios existem? A Constituição estabelece no artigo 136 a obrigação do Executivo ser autorizado pela Assembleia Nacional. É uma consagração que respeita o princípio da democracia representativa.

O legislador entende que não se pode endividar quem não consente. É necessário demonstrarmos a disposição para respeitar a legislação do país, e mais do que isso quem nos outorga o poder. Não apenas na véspera ou durante a campanha eleitoral, mas sobretudo no decurso do mandato. A democracia não se resume em termos a uma Constituição, eleições e poderes executivo, judicial e legislativo. A democracia é um estado de espírito, a acção permanente na implementação dos princípios que emanam da Constituição.

Se o Executivo faz o contrário, não pode falar em nome do povo. E se não fala em seu nome, quem lhe conferiu poder para gerir a coisa pública? É preciso respeitarmos o cidadão!

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