O director do Instituto Nacional do Café defendeu hoje – qual navegador que descobriu a pedra filosofal – a aposta de Angola no modelo agro-exportador, nomeadamente do café, que considera o único neste momento com hipótese de competir rapidamente no mercado internacional, tal como aconteceu no passado.
A inda hoje o embaixador da missão permanente de observação da União Africana junto da ONU, angolano Téte António, disse que “todos os dirigentes africanos estão cientes de que é preciso diversificar as economias”, explicando que o atraso se deve aos resquícios do colonialismo, pelo que “não podemos negar que o legado colonial ainda tem um grande peso nos nossos países”. Estaria a referir-se ao que o colonizador fez em prol do café angolano?
O director do Instituto Nacional do Café, João Ferreira, falava à imprensa, à margem da reunião de peritos, que antecede, na terça-feira, a 11ª Assembleia-geral da Rede de Pesquisa de Café Africana, que deverá reunir em Luanda cerca de 500 pessoas, de 25 países.
Segundo o responsável, numa altura que Angola realiza esforços para diversificar a sua economia, face à crise petrolífera, o Governo tem que pensar no modelo agro-exportador para ganhar “alguma divisa na produção agrícola”, sendo que no passado já foi um dos maiores produtores mundiais de café.
“Não me parece que as outras culturas consigam impor-se no mercado internacional, até porque a competitividade de países tem custos de produção muito mais inferiores”, disse João Ferreira.
O responsável referiu que Angola tem hoje uma “fraquíssima” produção de café, de cerca de 12 mil toneladas por hectare, e regista igualmente níveis baixos de industrialização.
Na reunião de hoje, segundo João Ferreira, foram analisados alguns projectos e programas, do ponto de vista técnico e científico, com o objectivo de fazer a médio prazo o continente africano dar respostas aos desafios da economia global.
De acordo com o responsável, um dos desafios é munir o continente africano de tecnologia de ponta, para se passar da “cultura do café intensiva em mão de obra para uma cultura intensiva em capitais”.
“África precisa mecanizar a cultura do café, é preciso utilizar alguns agro-químicos, é preciso revermos o nosso sector do café, para torná-lo mais competitivo. O que estamos a discutir do ponto de vista da investigação é um pouco isto: que projectos fazer, que tipo de tecnologias abordar, que tipos de laboratórios termos, se vamos para o tipo de reprodução do café, por sistema de produção generativa vegetativa, que tipos de variedades conservar”, explicou.
Angola detém actualmente a presidência da Assembleia-geral da organização inter-africana do café. Um total de 25 países africanos produtores de café integra a organização.
África representa hoje cerca de 5% da produção mundial de café, tendo uma baixa competitividade, fracas produções por hectare, que variam entre as 300 e os 500 quilogramas por hectare, enquanto os outros países apresentam produções de cerca 3.000 quilogramas por hectare.
Não chega fazer o diagnóstico
Já no passo dia 27 de Julho, a ex-secretária da Organização Inter-Africana do Café (OIAC), Josefa Sacko, disse em Luanda que com uma boa transformação do café solúvel Angola terá mercado para exportar a sua produção principalmente, para os países da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral ( SADC).
Angola tem vantagem comparativa em termos económicos em relação aos países da região. Só na nossa região podemos fazer uma indústria transformadora como a que é feita em outros sectores , disse na altura Josefa Sacko em entrevista à Angop.
Segundo referiu, Angola neste momento está a ditar a sua própria sorte, pois está diante de um mercado com 160 milhões de habitantes (África do Sul e RDC com 80 milhões de habitantes cada), sem contar com os restantes membros da SADC. Angola pode aproveitar este momento para implementar um bom programa e reactivar o sector.
Por outro lado, disse, Angola tem também boas relações com a China e pode aproveitar este mercado para vender o café solúvel que é muito prático para ser confeccionado.
A título de exemplo, fez referência ao Vietname que há cerca de 20 anos não produzia café e que depois do conflito armado que o país viveu, o Banco Mundial financiou a produção e hoje é o segundo produtor mundial.
Ao referir-se aos caminhos-de-ferro reabilitados no país e aos espaços que se pretende abrir a nível regional, apontou a produção do café como uma das grandes culturas que deverá originar um negócio entre Angola e os restantes países, a exemplo do negócio activo praticado na África Ocidental entre a Nigéria e o Senegal.
Quanto à produção do café especial em Angola (chamado café nicho), referiu que este tipo de café existe normalmente em certas economias com um grande volume de produção.
Este tipo de café que Angola já teve quando a sua produção era considerável (café Ginga), tem um prémio, mercado e é cotado no mercado internacional. É um café comprado ou pelos EUA ou pelo Japão, enquanto os outros tipos de café podem atingir todos os mercados.
Entretanto, a especialista é de opinião que, para um país como Angola com potencial enorme e terras de grandes dimensões, produzir este tipo de café traria um pouco de desequilíbrio em relação aos outros produtores podendo até mesmo criar problemas sociais.
Por este facto, sublinhou, a saída para Angola neste momento seria primeiro a organização do sector e a produção.
“O grande problema do café especial é que o mesmo passa pela certificação e no continente africano existem grandes debates em relação a quem deve pagar esta certificação que é muito cara”, sublinhou.
Entretanto, frisou, “se Angola quer apostar num mercado nicho deve primeiro organizar o mercado nacional e quando chegar no mínimo em 50 mil toneladas pode dizer que já é um país médio e então ver onde se produz e onde pode fazer o café de especialidade”.
A nível do mercado mundial do café, em Julho o grão estava bem cotado no mercado internacional. O “arábica” estava a ser comercializado a 4 dólares o quilo, enquanto o “robusta”, dependendo da sua qualidade, custava entre 2, 5 a três dólares o quilo.
Em termos de procura, na campanha 2014/2015 a projecção de consumo estava estimada em 145 milhões de sacos enquanto a produção estava à volta de 123 milhões de sacos. O que indica que havia um défice de 2 a 4 milhões de sacos que poderá aumentar para 20 milhões até 2020.
Por isso, sublinhou, “se Angola lançar as bases em Novembro para a reabilitação da nossa cafeicultura, já que o ciclo vegetativo do café é de três anos e o seu rendimento começa em cinco anos, estaremos em condições para abastecer algum mercado, sublinhou Josefa Sacko.
Recorde-se que, em Novembro do ano passado, o Governo aprovou a privatização e venda de 100% do capital da empresa pública de produção de café Liangol à Angonabeiro, unidade do grupo português Nabeiro que trabalha em Angola há 15 anos.
Aquele grupo português já tinha sido convidado pelo Executivo angolano a colaborar na reactivação da antiga fábrica de café Liangol, em Luanda, uma unidade produtiva agora com a marca Ginga. Esta será retirada à estatal Empresa de Liofilização e Moagem de Café (Limoca), conforme estabelece o mesmo decreto, e vendida à Angonabeiro.
Angola já foi o quarto maior produtor mundial de café, com 200 mil toneladas anuais, antes de 1975. Essa produção está hoje reduzida a menos de 10%, fruto do abandono do cultivo durante a guerra civil e das más opções económicas do governo.