Luanda volta este fim-de-semana a ter mais encanto, mesmo sabendo-se que o Governo vai reeditar a sua velha máxima, herdada do colonialismo, do peixe podre, fuba podre, panos ruins e – como habitualmente – porrada de criar bicho contra todos os que se vão atrever a sair à rua na defesa da democracia e de um Estado de Direito.
Por Orlando Castro
Previsivelmente estarão nas ruas quatro manifestações populares. Não serão bem “populares” porque, segundo o regime, populares mesmo só são as que reflectem a subserviência perante as imposições e arbitrariedades do “querido líder”.
O denominado Movimento Revolucionário Angolano e a CASA-CE marcaram manifestações, ambos convencidos de que o nosso país é uma democracia. Por sua vez, o Governo respondeu com uma marcha de professores também para este sábado. Em marcha permanente o Governo tem todas as forças de segurança, não vão os jovens fazer um golpe de Estado.
Entre a certeza de que a razão da força vai neutralizar a força da razão, os manifestante sabem que vão levar forte e feio, que alguns podem chocar contra balas perdidas no ar desde o tempo da guerra contra a UNITA, ou até tropeçarem em algum cassetete e caírem na boca de algum jacaré faminto.
Enquanto isso, ou não fosse membro do Conselho de Segurança da ONU, o regime prepara-se para – com redobrada legitimidade – testar mais uma vez as suas forças de repressão, perdão, de segurança, tendo em vista neutralizar todos aqueles que andam armados com mísseis, e outros armamentos pesados, escondidos nos telemóveis.
A UNITA, assumindo o seu papel de bobo da corte, já se demarcou dos protestos, acabando por meter o rabo entre as pernas perante as ameaças do secretário provincial do MPLA, Bento Bento, que a acusou de estar por detrás dos jovens para inviabilizar a realização do congresso do MPLA no mês de Dezembro.
Ainda assim os jovens do Movimento Revolucionário Angolano dizem estar prontos para, este sábado, chegarem até à Cidade Alta. É uma missão impossível. Aliás, o regime já colocou os jacarés do Bengo em prevenção.
Raúl Mandela, que tem sido alvo de perseguição por indivíduos não identificados, provavelmente guardiões da democracia, diz que desta vez vão provar a Eduardo dos Santos que não são apenas 300 jovens frustrados, como o Presidente disse numa “entrevista” à SIC Noticias.
“O cidadão José Eduardo dos Santos fica na Cidade Alta e vamos mostrar-lhe que não somos apenas 300 jovens como ele tinha dito, os frustrados festa vez estarão lá para dizer fora Zé Dú”, garante Mandela, acrescentando: “Desde que começamos não temos mais medo do que venha a acontecer, sabemos que muitos vão ser presos e não temos medo”.
Por seu lado, a juventude da CASA-CE, a JPA, diz ter recebido garantias da Polícia Nacional para a realização da sua marcha no domingo pelas 15 horas da Showprit ao Cemitério da Santana, como diz Rafael Aguiar, secretário da Juventude Patriótica de Angola.
Para o jurista Albano Pedro, as exigências dos jovens são constitucionais e não podem ser impedidos de se manifestarem. Isto, dizemos nós, se Angola fosse um Estado de Direito. “O que os jovens estão a pedir é a demissão de José Eduardo dos Santos e não há nada inconstitucional, por isso os jovens podem se manifestarem”, considerou o jurista, também ele esquecendo que acima da Constituição está a Lei Eduardo dos Santos.
Recorde-se que os jovens do denominado Movimento Revolucionário Angolano convocaram há mais de um mês duas manifestações para os dias 22 e 23 com o objectivo de exigir a demissão de José Eduardo dos Santos, um Presidente nunca nominalmente eleito e que está no poder há mais de 35 anos.
Depois, a juventude da CASA-CE convocou uma marcha para homenagear o seu patrono Hilbert Ganga, morto pela tropa da Guarda Presidencial no ano passado.
Contrariamente ao referido no texto, como português e apesar de certos mal entendidos, julgo que José Eduardo dos Santos tem sido um bom presidente, tendo em conta o período de grave instabilidade que Angola atravessou. A paz ainda é muito recente, de modo que todas as cautelas deverão ser reforçadas. Seria uma tragédia voltar para trás. Para além do mais, os partidos da oposição não são o que dizem, tal como acontece em Portugal. A democracia é um processo evolutivo, de avanços e recuos, pelo que a sua construção é morosa e exige paciência. Sei que há abusos e imputações de factos a “generais”, nomeadamente pela apropriação de bens de Angola. Paciência o tempo de prestar contas virá, de forma pacífica. Angola não pode dar-se ao luxo de provocar instabilidade. Serão os angolanos as principais vitimas.
Obrigado pela sua opinião que, obviamente, respeitamos. Por alguma razão, ao contrário do Presidente José Eduardo dos Santos, nós sabemos que a nossa liberdade acaba onde começa a dos outros. Pena é que a dos outros, sobretudo a dos que se servem em vez de servir, não termine onde começa a nossa.